80% do óleo alimentar usado para produção de biocombustíveis na Europa é importado e levanta dúvidas de fraude

A análise dos dados mais recentes da Federação Europeia de Transportes e Ambiente, da qual a ZERO é membro, mostra um aumento nas importações de óleo alimentar usado (OAU) para produção de biocombustíveis. E numa altura em que as companhias aéreas promovem cada vez mais a utilização dos biocombustíveis, como uma solução para voos mais limpos, colocando pressão acrescida na produção de biocombustíveis, a importação de OAU é uma situação preocupante e que levanta muitas dúvidas sobre eventuais fraudes.

O consumo de óleo alimentar usado na Europa mais que duplicou entre 2015 e 2022. No entanto, com os fornecimentos locais de OAU limitados pela capacidade das autoridades locais para a recolha e pela quantidade de óleo alimentar usado que os europeus conseguem produzir, atualmente a Europa importa 80% do óleo alimentar usado para a produção de biocombustíveis para abastecer carros, camiões e aviões. A grande maioria é importada da Ásia, com a China a ter um papel muito relevante com 60% do OAU que chega à Europa.

Com a indústria global de aviação a pressionar para que o OAU usado seja um ingrediente-chave no combustível sustentável para a aviação (SAF), e com companhias aéreas a lançarem voos com 100% SAF, a procura tenderá a aumentar, exigindo a importação de volumes crescentes.

A elevada procura de OAU aumentou o risco de fraude, onde óleos virgens como o de palma são suspeitos de serem rotulados como “usados” para tirar partido do valor inflacionado dos combustíveis supostamente verdes. Vários países, incluindo a Alemanha e a Irlanda, estão a lançar as suas próprias investigações oficiais sobre os riscos de fraude. A Comissão Europeia também prometeu investigar o biodiesel indonésio alegadamente fraudulento que passa pela China e pelo Reino Unido para contornar impostos.

Os dados também mostram que, em 2022 e em comparação com o ano anterior, o biodiesel a partir de óleo de palma diminuiu em quase 30%, em grande medida devido ao abandono da sua utilização por parte de vários países, como França, Dinamarca e Países Baixos. Ao mesmo tempo, a Europa assistiu a uma significativa adesão aos derivados do óleo de palma, como os Palm Oil Mill Effluents (POME) e o Palm Fatty Acid Distillate (PFAD), resultando numa diminuição em cerca de metade na utilização de óleo de palma, tendo em consideração o período entre 2020 e 2022. Nalguns países são rotulados como “resíduos”, no entanto os PFAD são subprodutos do processo de refinação do óleo de palma, e como tal, estão associados a impactos ambientais significativos e a alterações indiretas no uso do solo, tal como acontece com o óleo de palma convencional, cuja utilização para produção de biocombustíveis deverá ser abandonada na União Europeia até 2030.

Da análise realizada pela ZERO, o mercado nacional de recolha de OAU somente garante cerca de 10% das necessidades da indústria de biocombustíveis, sendo os restantes importados de mais de 40 países, entre os quais constam Espanha, Malásia, Arábia Saudita e a distante China. Segundo o relatório do T&E, Portugal é o quinto importador de OAU para produção de biocombustíveis, dependendo em 70% da China.

É de referir que, ao longo dos últimos anos, tem-se assistido a uma forte aposta na importação de biodiesel, com um crescimento entre 2020 e 2021, de 5 508 m3 para os 133 158 m3, com um ligeiro decréscimo em 2022 para os 116 637 m3. O valor de importação corresponde a cerca de 30% de todo o biodiesel, incluindo o que é produzido e importado, grande parte do qual é produzido com recurso a efluente de palma e outros resíduos da indústria da palma como cachos de palma vazios, cujas dúvida quanto a eventuais fraudes não estão esclarecidas.