“A crise climática é um sintoma de uma crise económica e social”

“O atual modelo económico, tanto à esquerda como à direita, demonstra que é uma irrealidade à real proteção da biodiversidade tal como a gestão sensata dos recursos terrestres finitos”. Esta posição é defendida por Francisco Guerreiro, deputado no Parlamento Europeu pelo grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia, que em entrevista à Ambiente Magazine, afirma-se como “defensor de uma sociedade baseada na não-violência, na promoção da ciência e da cultura como agregador civilizacional e que crie um modelo económico e social baseado na gestão sensata dos recursos terrestres”.

Com base nestes princípios, o deputado lançou recentemente o documentário “RBI: Um Caminho de Liberdade” com o objetivo de demonstrar que o Rendimento Básico Incondicional (RBI) é algo que se encontra na ordem do dia e que vai marcar a agenda política, económica, social e ambiental dos próximos anos. Aliás, o objetivo deste documentário é, precisamente, “dar a conhecer o RBI, desmitificar vários mitos em torno do conceito e abrir o caminho para a implementação de uma experiência piloto de larga escala em Portugal”, refere.

Mas, que ligação existe entre o RBI e o ambiente? Tal como explica Francisco Guerreiro, primeiramente, é necessário partir dos dados científicos que demonstram que “qualquer modelo económico atual”, baseado no “consumo e no pleno emprego”, é “contrário à urgente diminuição das emissões de gases com efeito de estufa (GEE)” e à “imperativa proteção da biodiversidade”. Em simultâneo, também importa referir que, “percentualmente, quem mais polui é a classe mais abastada da sociedade”. Globalmente, “os 10% das pessoas mais ricas produzem 50% das emissões de GEE, sendo que os 50% mais pobres apenas contribuem para 10% das emissões”, precisa. Tão importante, segundo o deputado, é perceber que “a crise climática é um sintoma de uma crise económica e social”, pelo que “precisamos de melhor distribuir a riqueza gerada para garantir que mais pessoas têm bens e serviços mais ecológicos e que se contraia a pegada das classes mais ricas”. Uma sondagem da Marktest, citada por Francisco Guerreiro, aponta que “60% dos portugueses gastariam mais dinheiro em bens mais ecológicos se tivessem mais poder de compra”.

Reforçando a ideia de que o atual modelo é a prova de uma “irrealidade à real proteção da biodiversidade”, Francisco Guerreiro vai mais longe e constata que o mesmo demonstra que a “competição é um sintoma de um modelo antropocêntrico económico e social que acredita que somos externos aos princípios biodiversos dos atuais ecossistemas terrestres”. Mais: “Fez com que se criassem desigualdades sociais gritantes moldando a sociedade a acreditar num paradigma de consumo crescente e sem fim e de prisão perpétua em torno do trabalho pela obtenção de rendimento”, alerta. Com o “aumento da automatização e inteligência artificial”, do “acesso a bens e recursos”, tal como da “perceção que devemos gerir a nossa economia diminuindo as desigualdades sociais através de uma melhor distribuição da riqueza gerada”, o deputado considera que é fundamental “melhorar os Estados Sociais contemporâneos”. Tal implica que “medidas como o Rendimento Básico Incondicional sejam alavancas de uma transformação do paradigma social, cultural, fiscal e económico de nações e blocos geopolíticos”, defende.

Voltando ao documentário, o deputado quis dar ênfase, no episódio nove,  à “ecologia regenerativa” com o objetivo de transmitir a “urgência de se mudar o paradigma social e económico” e, ao mesmo tempo, mostrar que “o RBI poderá ser uma ferramenta importante de transição” para uma sociedade descarbonizada e mais equitativa: “Em boa verdade, é preciso romper com a ideia que apenas através do crescimento e da concentração de riqueza as pessoas e nações podem prosperar”. Aliás, sustenta, o que se vê é efetivamente o contrário: “Claramente em contraciclo com os limites terrestres, criámos um modelo social e económico suicida que escraviza a maior parte da Humanidade a produzir bens que não precisamos para satisfazer necessidades criadas pelo marketing e publicidade”.

Com este projeto, Francisco Guerreiro deseja, assim, dar a conhecer o “movimento social” tanto em Portugal como no mundo, abrindo “mais portas” ao debate.