“A extração e o consumo continuam a crescer a um ritmo que já é superior ao do próprio PIB”, alerta Inês dos Santos Costa

O Grupo Casais promoveu esta quarta-feira um seminário digital sobre “Alterações Climáticas e Sustentabilidade Ambiental”. O evento foi realizado em parceria com o jornal Diário Imobiliário, cabendo a Fernanda Pedro, diretora da revista imobiliária, a moderação do mesmo. 

Inês dos Santos Costa, secretária de Estado do Ambiente, quis centrar a sua intervenção na relação do indivíduo entre o consumo de materiais e as atividades económicas: “Estamos no início do ano e é um bom momento para se fazer essa relação”. A responsável lembrou que, atualmente, a “atividade económica global” usa mais recursos daquilo que o planeta consegue fornecer: “Os níveis atuais de consumo global significam que precisaremos de três planetas até meados deste século”. E aquele “slogan” de que “só existe um planeta” e que se ouve “repetidamente” não passa, de facto, de um “diálogo”, atenta. Perante este cenário, a “inovação” e a “tecnologia” são apontadas por muitos como a “resolução” de todos os problemas, quer ao nível dos “impactos das alterações climáticas”, quer ao nível das “emissões de gases com efeitos de estufa” ou da “sustentabilidade dos materiais”, refere, dando conta, contudo, que “estamos numa fase de grande aceleração de tecnologia e inovação” e pouco se mudou. 

Num cenário como aquele que se verificou em 2019, que deu “boas indicações” no que toca à possibilidade de se “criar riqueza” reduzindo as emissões, Inês dos Santos Costa constata que o “mesmo não se pode dizer” sobre o “consumo de materiais” e a “degradação dos serviços” prestados pelos ecossistemas: “A extração e o consumo continuam a crescer a um ritmo que já é superior ao ritmo do próprio PIB” (Produto Interno Bruto). Tal significa que são produzidos “90 mil milhões de toneladas de materiais” todos os anos, quando a ciência diz que o limite dessa “extração” e desse “consumo” ronda os “50 mil milhões de toneladas” por ano. 

[blockquote style=”2″]Temos uma taxa de circularidade de 1,8%[/blockquote]

A secretária de Estado do Ambiente lembrou que a “solução” para a “neutralidade carbónica” não se resume a “fechar centrais a carvão”, a “transitar para uma mobilidade elétrica” ou, simplesmente, a “trocar as lâmpadas da nossa casa”, isto quando a “extração” e o “processamento de metais” representam “mais de metade das emissões”. Depois está a questão da “taxa de circularidade” de Portugal que é das mais baixas da União Europeia: “Temos uma taxa de 1,8% contra uma média europeia de 11,2%”. Face a estas evidências, é “claro que ainda há muito a fazer” no que aos materiais diz respeito: “Não bastará pegar nas pontas do sistema e unir. Não bastará falar de reciclagem. Não bastará falar de eficiência”, atenta. 

Relativamente à construção, a secretária de Estado do Ambiente reconhece que o setor é ainda uma “pedra basilar” no PIB nacional, mas, ainda assim, “não podemos continuar a fazer depender essa contribuição de uma extração e produção que são insustentáveis”. E a “descarbonização do setor” não se fará só pela “eficiência energética” ou pela “eficiência hídrica”, afirma, acrescentando que, terá de se fazer pelo “design” que “preserva” e “recupera”, reabilitando e reutilizando projetos para um “menor consumo possível” e para uma “maior utilidade possível”. Em suma, urge p“Criar mais valor no banco de materiais que já temos sem extrair mais materiais, sem produzir mais resíduos, reduzindo emissões”, precisa.

Sobre os edifícios, a responsável considera que “devem” e “têm” de ser adaptados às “condições climáticas da região” onde se encontram: “Estamos numa região em que as ondas de calor são cada vez mais frequentes”, alerta. E, embora a “pobreza energética” seja um tema de grande importância, a secretária de Estado do Ambiente dá conta de que o “risco para a saúde pública” associado às ondas de calor será “tendencialmente maior” com o “agravamento” dos impactos das “alterações climáticas”. 

Em jeito de conclusão, Inês dos Santos Costa quis reforçar a importância da próxima década, dando conta de que, ao contrário dos “colapsos financeiros do passado”, a resposta já não pode pela lógica do “abram um buraco e enchem-no de betão”. Desta forma, há a necessidade de se continuar a apostar numa “abordagem multidisciplinar ao setor”, reconhecendo que a “gestão de materiais não se faz só no cimento ou no aço”, mas também na “cerâmica”, no “vidro”, na “madeira” ou no “têxtil”. E se se desenhou um “modelo económico linear”, isso significa que também pode ser “redesenhado”, remata.