Águas e Energias de Porto: “É irracional olhar para a rede pluvial e dizer que vamos mudar tudo”

Responsável pela gestão de todo o ciclo urbano da água e não só pelo abastecimento ou drenagem de águas residuais, a Águas e Energia do Porto é responsável também pela gestão das águas fluviais, rios e ribeiras, linhas de água e a valorização da frente marítima. Muito em breve, passa a gerir a água para reutilização e num futuro mais longínquo a reutilização de outros tipos de água. Este foi o ponto de partida para Ruben Fernandes, administrador executivo da Águas e Energias de Porto, abordar o tema “Gestão Integrada do Ciclo Urbano da Água”, num dos painéis promovidos esta terça-feira, 10 de janeiro, no Pavilhão da Água, no Porto, no âmbito dos 45 anos da APRHAssociação Portuguesa dos Recursos Hídricos.

Apesar do Porto ser dos concelhos que pratica as tarifas mais baixas em termos de água e águas residuais, Ruben Fernandes considera tratar-se de uma informação importante para os munícipes mas, ao mesmo tempo, é uma “mensagem que não nos interessa”, visto que a “água é recurso escasso que não está ser pago e valorizado pelas populações da forma como deveria ser”, apelando a uma “mudança de paradigma” que deve ser transversal ao país.

Para a Águas e Energia do Porto, o futuro do setor da água passa por “mudar o paradigma” na forma como as cidades são desenhadas e, em particular, promover um desenho sensível à água: “Não vale a pensa insistir em infraestruturas cinzentas e temos de pensar noutro tipo de soluções pois os problemas estão à vista”, alerta. Esta é uma mudança que, para o responsável, implica “não só trabalhar as águas de forma diferente”, como também “perceber que temos de convencer os nosso decisores que é preciso fazer as coisas de forma diferente”, inclusive “planear as cidades de forma diferente”.

Sobre Água Não Faturada, o administrador executivo da empresa destaca uma grande evolução que se faz sentir desde 2006, em que se registavam perdas superiores a 50%: “O Programa Estratégico de Gestão e Redução de Água Não Faturada permite-nos atuar quase em tempo real, através ferramentas preditivas que nos dizem onde vão acontecer determinadas rupturas”. No final de 2022, a empresa registou “perdas na ordem 13,8%”, tendo em conta que a cidade do Porto tem uma “rede de abastecimento de água centenária e muito envelhecida”.

“Empurramos o problema para jusante”

Em matéria de águas pluviais e com as “cheias na mira de toda a gente”, Ruben Fernandes chama a atenção para o facto de ser “impossível olhar para a rede pluvial e dizer que vamos mudar tudo e que vamos sobredimensioná-las para poderem acomodar estes picos de precipitação. É irracional!”. Por isso, “temos de pensar noutras abordagens para conseguir infiltrar a água e encaminhar a água para os locais certos e minimizar os impactos das alterações climáticas, adaptando melhor os territórios”. O responsável abordou também os impactos das sucessivas impermeabilizações que têm sido feitas no solo, dando como exemplo o Campo 24 de Agosto, que antes funcionava como bacia de retenção mas que, agora, tem uma estação de metro: “Serve a população e muito bem, mas a verdade é que empurramos o problema para jusante. E se somarmos a isto as intervenções que foram feitas em termos de qualificação de espaço público, se calhar, não atendeu àquilo que consideramos o desenho urbano sensível à água”.

Apesar dos problemas, o responsável não quis deixar de falar naquela que tem sido a atuação dos operacionais no terreno, como a implementação de guarda-rios: “São os primeiros a detetar os problemas e são os olhos da cidade: conseguimos agir e atuar de forma mais célere quando há uma descarga ou obstrução”, exemplifica. Ainda neste âmbito, destaca-se o projeto Plano de Valorização e Reabilitação de Linhas de Água, financiado pelos EEA Grants: “Já passamos a fase de diagnóstico e, agora, estamos fazer cenários climáticos”. Também, no âmbito deste projeto, foi promovido um bootcamp com vários atores de diferentes setores e de outras partes do país para se recolher um “plano de ação” com o objetivo de “adaptar o nosso território aos efeitos das alterações climáticas” olhando em particular para as linhas de água. Neste encontro, o responsável dá nota que os vários especialistas partilharam a visão de que as soluções não podem passar apenas pelas linhas de água: “É preciso uma visão holística dos problemas para termos soluções mais integradoras”.

Em jeito de conclusão, o Ruben Fernandes sublinhou ainda a importância que o digital assume, bem como o caminho que a Águas e Energia do Porto tem feito em matéria de telemetria, onde, nos dias de hoje, é possível assegurar-se uma “atuação mais ágil e uma comunicação mais eficiente” com o cliente. Tão importante é a educação ambiental, enquanto pilar fundamental para chegar às camada mais jovens, onde são promovidas várias ações no Pavilhão da Água e nas escolas: “Não é possível achar que vamos ter um futuro melhor sem trabalhar com as gerações futuras”, remata.

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