Autoestradas da energia em marcha lenta

O dilema sobre construir ou não novas interligações de eletricidade e gás entre a Península Ibérica e França ocupa há largos anos o debate europeu de política energética e pode ser visto, de um modo simplificado, como alugar uma carrinha para um passeio: a viagem será tanto mais barata para cada um deles quanto maior o número de participantes. Mas se um deles pode fazer a mesma viagem de moto, com um custo mais baixo, que incentivo tem para entrar no esquema, questiona o Expresso?

França, que hoje paga uma energia significativamente mais barata do que a de Portugal e Espanha, é o passageiro que não quer embarcar na aventura das interligações. Só os projetos de eletricidade e gás entre o mercado de eletricidade e gás entre o mercado espanhol e o francês estão avaliados em mais de 2 mil milhões de euros. Será esse o preço a pagar para pôr termo ao isolamento energético ibérico ditado pela barreira natural dos Pirenéus.

A fatura das interligações, argumentam os seus defensores (Comissão Europa incluída), será facilmente recuperada pelos benefícios do alargamento da malha elétrica: mais interligada, a Europa poderá produzir mais energia renovável onde o recurso é mais forte e permitir que todos os países beneficiem do acesso a essa eletricidade. Por outro lado, uma Europa mais ligada à Península Ibérica poderá aproveitar a abundante capacidade de importação de gás natural liquefeito (GNL) de Portugal e Espanha e assim diversificar as fontes de aprovisionamento deste combustível, minimizando a dependência do gás russo.

O dossier da “união energética”, defendido com unhas e dentes por Portugal e Espanha apoiado por Bruxelas, vem fazendo o seu caminho… como um camião em marcha lenta. As autoestradas da energia, tidas como veículo facilitador de uma Europa mais eficiente no uso da eletricidade e do gás, enfrentam ainda em França um foco de resistência substancial.

Portugal não abandonou os projetos de reforço das ligações a Espanha, mas eles só farão sentido se a França aceitar também investir em novas infraestruturas de conexão a Espanha. O secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, não quer, contudo, perder tempo. E entretanto virou a agulha para sil. Objetivo: avaliar a racionalidade económica de uma interligação elétrica entre o Algarve e Marrocos, que permitirá captar novo investimento em energia renovável (sobretudo solar) para Portugal, para a escoar para África.