Azoto e fósforo nos solos podem ser fontes de poluição das águas subterrâneas, diz ZERO

As quantidades de azoto e fósforo incorporadas nos solos nacionais são quase o dobro do que é extraído pelas culturas. A ZERO usa a análise do Instituto Nacional de Estatística (INE), efetuada entre 1995 e 2019 e partilhada no relatório Estatísticas Agrícolas 2020, para referir que o excedente destes nutrientes poderá continuar a ser uma fonte de contaminação difusa para o solo e para as massas de água superficiais e subterrâneas. Por outro lado, a especialização dos sistemas agrícolas através de um modelo do tipo industrial, tem levado à intensificação pecuária e à dependência de fertilizantes de síntese, desligando as produções animal e vegetal do ciclo de nutrientes e gerando dependência de matérias-primas não renováveis, como é o caso do fósforo mineral, lê-se num comunicado partilhado pela associação ambientalista.

Embora em 2019 Portugal tenha registado o menor consumo de fertilizantes minerais (azoto e fósforo) da União Europeia (UE), verifica-se um “aumento do consumo aparente de mais 2,7% nesse mesmo ano”, de acordo com a análise do INE. No entanto, para a ZERO, esta apreciação mascara, de certa forma, os consumos de fósforo, visto que estes são significativamente inferiores aos de azoto (Eurostat 2018), e também o facto de Portugal ser um dos que revela menos eficiência no uso de fósforo – o 3.º maior valor de balanço deste mineral na UE em 2017 (Eurostat).

Desagregando os dados para o período de 2008-2018 (Eurostat), verifica-se um consumo nacional relativamente estável para o azoto. Em contraste, “o consumo de fósforo apresenta um padrão crescente durante o mesmo período (+16%), registando uma subida constante entre 2011 e 2017, com um ligeiro decréscimo em 2018”, refere o mesmo comunicado.

No período 1995-2019, de acordo com o INE, a quantidade de azoto incorporado no solo é quase o dobro do que é removido pelas culturas, com uma tendência de aumento deste excedente desde 2008 (+2,9% por ano). Para o fósforo, durante o mesmo período, a situação é semelhante: “48% do fósforo aplicado é excedente, o equivalente a cerca de 6kg/ha”, lê-se na nota da ZERO.

Impactes ambientais e segurança alimentar em causa

A elevada mobilidade do azoto no solo possibilita o seu fácil arrastamento para meios hídricos, tanto superficiais como subterrâneos, causando poluição. Apesar da definição de programas de ação e a estipulação de Zonas Vulneráveis, no âmbito da Diretiva Nitratos (Diretiva 91/676/CEE, do Conselho, de 12 de dezembro de 1991), a poluição por nitratos tem-se mostrado um “problema persistente”, sobretudo para os aquíferos afetados. “A aplicação excessiva de fertilizantes azotados está também associada a emissões de amoníaco e óxido nitroso (um gás com efeito estufa 298 vezes superior ao CO2)”, atenta a associação.

Já o fósforo mineral, segundo a ZERO, constitui um problema mesmo antes da sua aplicação no solo, visto provir de um recurso não renovável, a rocha fosfática, cujo processamento gera poluentes: “85% das reservas disponíveis de rocha fosfática são hoje controladas por apenas cinco países, estimando-se que Marrocos controle cerca de 70%”. Já os países importadores, como Portugal, estão vulneráveis a quebras de abastecimento e a aumento de preços – algo observado em 2008 quando se verificou um aumento de 800% no preço de mercado da rocha fosfática, precisa o comunicado.

Agricultura nacional com dificuldades no fecho dos ciclos de nutrientes

Se por um lado a produção vegetal está cada vez mais dependente de fertilizantes de síntese – em 2019 aplicava-se estrume em apenas 5,1% da superfície agrícola utilizada –, por outro lado os Efluentes Pecuários (EP) gerados pela intensificação agropecuária (90% dos EP da suinicultura e 74% dos EP da bovinicultura provêm de sistemas intensivos) continuam a gerar “pressões elevadas” sobre as massas de água.

Enquanto isso, grande parte dos resíduos orgânicos domésticos acabam em aterro. Em 2017, a ZERO estimou que seriam desperdiçados cerca de 100 milhões de euros por ano em nutrientes que poderiam ser devolvidos aos sistemas agrícolas.

O baixo uso relativo de fertilizantes minerais e a valorização dos sistemas agrossilvopastoris colocam Portugal numa situação propícia à modernização sustentável da produção alimentar. No entanto, tal implica uma “política pública coerente e consistente” que procure a eliminação progressiva dos riscos do excesso de nutrientes e da dependência de fertilizantes minerais, remata a associação.