Dimensão ambiental está interligada com a dimensão social e económica, dizem especialistas

A APEMETA (Associação Portuguesa de Empresas de Tecnologias Ambientais), promoveu, na passada terça-feira, 21 de setembro, um webinar subordinado ao tema “Ambiente em Portugal: Tendências – Cooperar e Coopetir para a Sustentabilidade”. No painel sobre “As Dimensões Social e Económica”, ficou claro que há uma ligação entre ambas as dimensões e a dimensão ambiental. Aliás, são vários os projetos e ações que, levados a cabo pelas empresas, comprovam essa mesma ligação. É caso para dizer que a “sustentabilidade” já faz parte da estratégia das empresas ou até das regiões.

Um desses exemplos é a Madeira, onde o turismo tem um impacto significativo e que, consequentemente, obriga a uma estratégia capaz de responder aos desafios do “overtourism” em prol da preservação e da sustentabilidade da região. Manuel Ara Oliveira, diretor da Direção Regional do Ambiente e Alterações Climáticas (DRAAC), explica que, sendo o turismo uma indústria muito “competitiva, volátil e flutuante”, exige, à partida, um sistema (estratégia) capaz de responder à pressão que é feita nos serviços, desde a “energia” aos “equipamentos”, passando pela “tecnologia” e “formação especializada”, até às atividades complementares, como a agricultura, a agropecuária ou ao desporto. Portanto, quando se fala em “30 mil camas” e “40 mil pessoas”, aquilo que está na balança é “proteger a natureza” e a “sustentabilidade dos recursos”, refere o responsável, destacando a vantagem de existir cada vez mais mercados – inglês, alemão, francês – mais exigentes com o desempenho ambiental do local que escolhem para passar férias. E nestas matérias, a região da Madeira está em linha com as métricas da economia circular, nomeadamente, com a aposta nas simbioses industriais, nas relações de confiança ou nos recursos endógenos. Uma aposta que se traduz em inúmeras vantagens associadas, com “menores gastos”, a “criação de emprego”, “menor dependência externa” e “maior resiliência”. Esta é uma aposta transversal a outros setores e área de serviços, afinca o responsável. 

[blockquote style=”2″]Há um interesse por parte das empresas em olhar para a sustentabilidade nas suas diferentes dimensões[/blockquote]

Passando agora para o nível de atuação das empresas, Afonso Borga, corporate social responsibility manager da GRACE, afirma que há uma visão 360 em relação ao ESG (Environmental, Social and Corporate governance): “Há um interesse por parte das empresas em olhar para a sustentabilidade nas suas diferentes dimensões. Se há alguns anos, quando se falava em sustentabilidade, olhavam mais para a perspetiva ambiental, na verdade, as empresas têm hoje uma visão mais transversal”. O mesmo acontece na comunicação, com uma aposta forte, por parte das empresas, na sensibilização e na educação: “Há de facto a preocupação da empresa na forma como comunica os produtos”. Esta, tal como indica o responsável, é uma consequência do consumidor atual ser cada vez mais exigente e informado.

Para explicar a ligação da área social à ambiental, Afonso Borga dá o exemplo dos incêndios em Portugal, tratando-se de um problema ambiental, mas com ligação direta à área social: “Temos várias empresas que querem construir projetos de apoio às comunidades. Estamos a falar da regeneração e reconstrução das comunidades onde essas as empresas têm atividade e influência”, destaca.  

[blockquote style=”2″]Defendemos aquilo que são os mecanismos e incentivos às boas práticas do cidadão[/blockquote]

Partindo para o setor dos resíduos e, continuando na lógica da sustentabilidade, o consumidor é uma parte fundamental no cumprimento das metas e na adesão das alterações que, constantemente, têm sido aplicadas. Exemplo dessas alterações são a introdução de novos fluxos, a solução “Pay As You Throw”, os sistemas de depósito, os biorresíduos, os resíduos têxteis ou até da diretiva plásticos. A questão é: “Pensando no consumidor (cidadão), como é que as empresas olham para estas alterações”. 

No caso da Lipor, Paula Mendes fala em “oportunidade: é uma oportunidade de negócio, de evolução, do nosso modelo de gestão e daquilo que é a oferta para os nossos clientes”. Desta forma, a Lipor tem centrado a aposta em “investimentos fortes, na conceção de projetos, em campanhas de comunicação e educação”, seja ao nível nacional, seja ao nível local: “Ainda assim, estamos aquém das metas e outras metas e responsabilidade surgirão”. Por isso: “Somos muito adeptos e defendemos aquilo que são os mecanismos e incentivos às boas práticas do cidadão, ou seja, que promova não só a reciclagem dos resíduos, mas que recompense aquilo que são as boas práticas do cidadão”. Nesta lógica, a Lipor está a estudar vários “modelos de recompensa” que não se fixem apenas na reciclagem (separação), mas também, a trabalhar no sentido do “lifestyle” onde as pessoas têm consciência e práticas ambientalmente sustentáveis: “Por exemplo, numa simples ida às compras”. O objetivo é: “Conseguirmos ter várias soluções que permitam a redução da produção de resíduos. E quando não é possível reduzir e fazer tratamento local, então façamos a reciclagem, ou seja, ir para a incineradora aquilo que já não tiver qualquer tipo aproveitamento”. 

Em matérias de “novas tendências”, a Lipor desenvolveu um estudo, no qual se comprova que, o benefício em prol da valorização, é uma vantagem acrescida de: “61% dos inquiridos valoriza (os resíduos) por ter um benefício”. O estudo mostra ainda que o consumidor está a ficar cada vez mais esclarecido e, consequentemente, mais exigente: “Acho que não precisamos de aguardar (mais tempo) para termos mecanismos de recompensa: se não tivermos, claramente, que podemos ter os melhores projetos e tipologias de recolha, mas é importante que tudo isto seja fechado num ciclo”, sustenta. 

Voltando à lógica da sustentabilidade, mas numa perspetiva empresarial, Paula Mendes não tem dúvidas de que o setor (dos resíduos), os sistemas de gestão de resíduos e as empresas da área têm de olhar para o tema como uma oportunidade de negócios: “Não achar que a dimensão social é dar apoios ou patrocínios. É sim: criar impacto e gerar valor de forma partilhada”, defende. 

[blockquote style=”2″]Desmistificar a lógica de que há um negócio por trás dos resíduos[/blockquote]

Do lado do Electrão, Ana Matos destaca a preocupação que existe em olhar para dimensão social, alinhando a estratégia de acordo com esses pontos: “Estamos atentos às questões dos consumidores, seja no facto de não reciclarem mais e perceber as motivações, seja na transparência do sistemas, isto é, as pessoas perceberem o que acontece aos resíduos”. Nesta última, a responsável reforça a importância de esclarecer o consumidor e dar a conhecer o modelo  económico que está por trás dos sistemas de responsabilidade alargada do produtor: “É preciso desmistificar esta lógica de que há um negócio por trás dos resíduos e prestar uma informação mais transparentes e de forma mais abrangente”. 

Também, do lado dos equipamentos elétricos, é preciso informar e esclarecer o cidadão: “Montar um sistema de recolha tem custos e esses custos acabam por ter impacto quando as pessoas compram os seus equipamentos elétricos”. Para responder a isto, o Electrão está, de uma forma estruturada e sustentada, a criar um rede de proximidade: “É piloto de recolha porta a porta de equipamentos elétricos, ou seja, um sistema de proximidade que dê respostas às necessidades”. E nesta lógica, a associação está ainda atenta em perceber o que “promove ainda a inércia” e desmitificar nesse sentido: “A sensibilização é um passo para isso”, acredita, dando como exemplo, as campanhas de recolha cujas quantidades revertem a favor de uma causa social. Mais uma vez, a causa social está associada à causa ambiental: “As pessoas revêem-se nestas iniciativas”.

[blockquote style=”2″]A água tem um valor e não é só o que se paga na fatura[/blockquote]

Já sobre o lado “invisível” da água e a relação que o consumidor tem com o recurso, Carla Marques Alcobia, representante da EPAL, parece não concordar com a ideia de que o cidadão só se apercebe desse lado, aquando do momento de pagar a fatura: “As pessoas estão cada vez mais despertas: a água tem um valor e não é só o que se paga na fatura”. É esse o trabalho que a EPAL tem feito, nomeadamente, com as ações de sensibilização, desde o pré-escolar até às universidades, e as campanhas feitas à medida. 

Ainda assim, a responsável chama a atenção para o facto da sustentabilidade comportamental estar acima da sustentabilidade ambiental: “Temos que fazer o nosso percurso”. E na empresa a mensagem que querem passar é: “A água da torneira é a melhor escolha: a mais ambiental e a mais sustentável”, destaca.