#EconomiaCircular: FHLUD é o Marketplace que quer criar impacto na redução do desperdício alimentar

A Economia Circular está, hoje, subjacente em muitas empresas. Produtos sustentáveis, amigos do ambiente e com um ciclo de vida longo são, cada vez mais, uma opção. Há também quem ponha em prática estes conceitos e desenvolva os seus próprios produtos. Com o objetivo de dar “voz” a projetos de cariz sustentável, a Ambiente Magazine irá, todas as semanas, apresentar algumas iniciativas aos nossos leitores e dar a conhecer o que se faz em Portugal nesta área. Esta semana, partilhamos o projeto “FHLUD”.

Trata-se de um Marketplace que começou a dar os primeiros passos em plena pandemia, mais precisamente, em outubro de 2020. E surgiu de uma motivação já antiga dos elementos do grupo e de uma necessidade pessoal que todos sentiam, cada vez mais, agravada pela situação pandémica: “Todos nós crescemos numa zona de produção agrícola, e uns anos mais tarde ao mover-nos para a cidade, detetámos a falta de produtos, como os da terra, e a maioria dos produtos que tínhamos acesso, eram bastante industrializados”, começa por contar Ivanoel Rodrigues, co-founder at FHLUD. Foi então que, após uma investigação que visava perceber o motivo pelo qual os produtores locais não apostam no meio urbano, o grupo detetou várias deficiências e “perdas de alimentos” na ponte entre o produtor e o consumidor. A partir daí, decidiram meter “mãos à obra” e lançar o FHLUD.

Com o Marketplace vai ser, assim, possível “comprar, vender e doar”, com a condição de promover sempre “o consumo local, a redução do desperdício alimentar e um aumento ao justo acesso à alimentação”. Mais do que um Marketplace, com um “serviço completo”, é objetivo deste projeto criar condições para que a ponte entre o produtor e o consumidor seja estabelecida com sucesso: “Trabalhamos para que o produtor não seja esmagado por condições e prazos de pagamento desumanos de outras alternativas de escoamento, e o consumidor tenha a garantia de frescura e qualidade de um produto que tem informação sobre a origem, valor nutricional, sugestões culinárias e outros”.

Ambientalmente, é foco do FHLUD criar impacto na redução do desperdício alimentar: “Este é sem dúvida o objetivo principal, porque para alimentar uma população urbana em crescimento não é só preciso produzir mais, é preciso rentabilizar melhor o que é produzido”. Além disso, a “abordagem única” na criação de condições para realização do “negócio digital “e todo o “suporte logístico” desde o produtor até ao consumidor permite uma “melhor otimização dos recursos”, bem como “uma redução da pegada ecológica em toda a cadeia de valor”, acrescenta. Já é conhecido que os objetivos para combater o aquecimento global e alterações climáticas são muitos e ambicioso: “E abordar a área que teve mais impacto na evolução humana nos últimos milénios é uma boa forma de começar, já que os recursos utilizados para a produção alimentar são imensos e o setor agroalimentar é dos mais que mais impacto tem no ambiente”, acredita.

[blockquote style=”2″]O mundo (agroalimentar) está em mudança, e nós queremos ser um veículo dessa mudança[/blockquote]

Ivanoel Rodrigues

Apesar de se tratar de um projeto recente e de ter surgido em plena pandemia, obrigando a um “reenquadramento” da ideia inicial, Ivanoel Rodrigues destaca que, nos últimos meses, o FHLUD tem adquirido parceiros e apoios muito relevantes, que têm permitido alavancar os esforços realizados, tanto em Portugal como na Europa: “Estamos numa fase inicial de aceleração. Temos connosco vários interessados tanto de consumidores como de produtores e temos planeado o lançamento, por fases, da plataforma para os consumidores, produtores, instituições e distribuidores nos próximos meses, até novembro”. Também, durante este período inicial, a equipa cresceu: “Em menos de um ano, passou dois cofundadores iniciais, para oito elementos e, em breve, serão onze”, refere. A pandemia também não foi um impedimento para o projeto deixar de dar frutos, tendo permitido “adotar metodologias de trabalho independentes do espaço de trabalho”, físico ou remoto: “Em algumas áreas não é possível adotar o teletrabalho, como as operações de receção, tratamento e despacho dos legumes e vegetais, mas todo o desenvolvimento de suporte ao negócio e o desenvolvimento da plataforma tem sido pautado por inovadoras formas de organização”, explica.

Com os olhos postos no futuro, Ivanoel Rodrigues afirma que o desejo é “servir com qualidade tanto consumidores como produtores, apoiando as instituições e fornecendo melhores condições de trabalho aos entregadores contratualizados: este é o futuro imediato que queremos atingir”. Nos próximos dois anos, é ambição deste Marketplace estar, no mínimo, na zona metropolitana de Lisboa e do Porto: “Este desafio, quando realizado, permitirá replicar o modelo para outros países e assim começar a crescer gradualmente pela Europa. Queremos alcançar todas as instituições que apoiem os cidadãos carenciados na alimentação, pois só assim conseguimos, num continente desenvolvido como a Europa, atingir o objetivo de “Zero Fome”, pois ainda há muita gente sem o correto acesso à alimentação”. Aliás, se a pergunta fosse: “Como imaginam a FHLUD num futuro utópico?”, toda a equipa idealizava o FHLUD como sendo uma “marca de preferência para os consumidores terem acesso à alimentação, com toda a gestão nutricional ajustada a si, e os produtores poderem contar com o suporte necessário para o seu negócio”, não só para “escoar o produto”, mas sim para “obterem todo o tipo de apoio para a produção e negócio”, ou seja, uma “espécie de cooperativa do futuro”. Sendo o futuro “digital, conectado e interligado” é objetivo deste grupo estar na linha da frente a apoiar o setor agroalimentar: “O mundo (agroalimentar) está em mudança, e nós queremos ser um veículo dessa mudança”, precisa.

[blockquote style=”2″]Deitar o lixo fora é só transportá-lo para outro local[/blockquote]

Agora, falando de economia circular e sobre o caminho que Portugal tem feito nestas matérias, Ivanoel Rodrigues não tem dúvidas de que “há muito para fazer: apenas estamos na ponta do icebergue, tanto a nível nacional como internacional”. Para o responsável, a circularidade deve ser pensada desde a “criação de qualquer produto ou serviço” sendo que, infelizmente, em Portugal, “há muito para evoluir” nesse sentido: “No nosso país e noutros desenvolvidos esta temática tem sido muito importante, mas é necessária uma mudança global do paradigma mental de ´extrai, usa, mete fora´ para uma mentalidade de valorização de qualquer matéria”, atenta. Aliás, a própria expressão “Meter fora o lixo” é um sinal que, para Ivanoel Rodrigues, ainda se acredita que existe um “lugar mágico” onde se pode deitar tudo fora: “Infelizmente, deitar o lixo fora é só transportá-lo para outro local, neste planeta único”. Ainda assim, nesta jornada empreendedora que o grupo tem vivenciado, já é visível que a “maioria dos projetos que temos tido acesso já incluem a circularidade nas suas operações”, felicita o fundador, constando tratar-se de um sinal onde o “alerta” e a “educação” por uma “valorização dos recursos” e por um “sistema circular de produção e consumo” tem vindo a dar frutos: “Há esperança!”.

Sobre o papel dos líderes políticos nestas matérias, Ivanoel Rodrigues acredita que serão sempre atores cruciais para a promoção de uma agenda política mais ambiental e mais inclusiva: “Embora os líderes políticos possam e devam, através da sua influência e capacidade legislativa rumar a um país mais verde, mais ecológico e mais circular, estes só conseguem ser o catalisador da sociedade, esta sim, a maior responsável pela melhoria ou pioria da situação ambiental”. Por isso, “defender o ambiente, valorizar todas as matérias e educar as próximas gerações para que não cometam o erro de gerações anteriores é da responsabilidade de cada um de nós individualmente, sem exceção”, defende.

Quais as perspetivas para o futuro sobre estas matérias?

Gosto de ser realista, e assim acredito num futuro bifurcado, com melhorias em alguns aspetos e pioria noutros. Certamente iremos ver positiva mudança na utilização das matérias, com uma aposta em matérias com mais valor e que permitam uma reciclagem “ilimitada”, ao exemplo do alumínio. Também iremos ver uma diminuição na utilização de plástico de uso único, algo que é essencial para parar o crescente aumento de plástico em literalmente todo o planeta. O uso de energia verde será um tema com anos pela frente, já que o aumento do consumo energético e a digitalização terão de ser feitos com atenção nas suas fontes. Mas nem tudo são boas notícias. Deixaremos de ter matérias baratas demais para incentivar a reciclagem, mas isso trará a extração de novas matérias com maior valor. Deixaremos o plástico de uso único, mas a indústria papeleira terá de inovar rapidamente para que o papel não seja o próximo problema, tanto na produção como no descarte. Relativo às energias verdes, nem tudo o que é ouro o parece, e a renovação dos equipamentos produtores de energia será um problema grave entre 10 a 15 anos. Todas as ações têm consequências, e algumas delas só serão percebidas daqui a longos anos. Outra atenção que teremos de ter cuidado é o novo “greenwashing”. Muitas iniciativas consideradas “verdes” são apenas a continuação de práticas nocivas e tóxicas para o ambiente disfarçadas de produtos ecológicos. Aqui, tenho especial preocupação pela falta de capacidade do consumidor geral em detetar estes falsos produtos verdes, a iliteracia ambiental é ainda muito grande no nosso país e mundo. Temos um caminho pela frente muito longo e moroso. O mundo não vai mudar da noite para o dia de consumista para ecologista, apenas ao longo de muitos anos e de muita política pública de incentivos e educação das próximas gerações. O nosso modo de vida vai mudar graças à nossa necessidade de adaptação às alterações climáticas e esse será o melhor incentivo que podemos ter para uma mais rápida mudança. Política, educação e investimento no ambiente são os pilares para um mundo melhor, um mundo que é possível e certamente irá ser mais verde, mais inclusivo, mais ecológico.