ESGRA: Como alcançar a boa governança num novo regime de responsabilidade alargada do produtor (RAP) para o setor têxtil (Parte III de III)

[blockquote style=”2″]Uma estratégia europeia para a circularidade dos têxteis[/blockquote]

Atualmente, encontra-se em curso um conjunto de iniciativas levadas a cabo pela Comissão Europeia com o objetivo de reunir contributos para a definição da Estratégia Europeia em Matéria de Têxteis sustentáveis. No âmbito destas iniciativas foram recentemente divulgadas Recomendações para a Estratégia da UE para Têxteis Sustentáveis de Organizações da Sociedade Civil Ambiental (EEB – European Environmental Bureau, junho de 2021).

Neste contexto, a CE está presentemente a considerar implementar a RAP como uma medida regulamentar para “promover têxteis sustentáveis e o tratamento de resíduos têxteis de acordo com a hierarquia de resíduos”. Todos os Estados-Membros da UE deverão cumprir um novo requisito de criação de sistemas de recolha seletiva de têxteis, até 2025. Prevê-se que a RAP possa desempenhar um papel vital na angariação de recursos financeiros de que as autoridades públicas necessitarão para financiar a gestão e o tratamento do fluxo destes resíduos.

O controlo que produtores e retalhistas possam vir a exercer sobre o tratamento dos resíduos é um fator a que os responsáveis políticos devem prestar muita atenção, dependendo da forma como é projetado um regime de RAP para os têxteis. Por exemplo, colocar aos retalhistas requisitos de devolução obrigatória pode dar-lhes o controlo sobre a entrada de materiais sem a supervisão de outros atores. Por outro lado, é importante garantir que qualquer esquema de devolução não resulte num incentivo aos consumidores para deitarem fora roupas que ainda poderiam usar e utilizarem os vouchers recebidos na compra de novos tecidos.

As decisões sobre a utilização das verbas arrecadadas pelas taxas de RAP para os têxteis devem ser decididas por um órgão colegial composto pelas organizações que vão implementar as obrigações da RAP, pelos operadores de resíduos, privados ou públicos, pelas autoridades locais, por organizações da sociedade civil (de cariz ambiental, social e de defesa do consumidor), operadores de reutilização e preparação para reutilização, e empresas da área social.

Para evitar conflitos de interesse, em caso algum produtores e organizações que implementam o regime de RAP devem ser tidos como os únicos responsáveis pela utilização da taxa e pelo projeto do regime de RAP. Os esquemas de RAP devem ter também um alto nível de transparência e devem também incluir metas estabelecidas pelos legisladores, bem como taxas penalizadoras para as empresas que não cumprirem as metas.

A RAP pode representar um perigo para a preparação para a reutilização e para o setor da reutilização se resultar em monopólios de retalhistas e produtores com controlo sobre a recolha e tratamento de resíduos têxteis. Existe o risco de que tudo vá para a reciclagem, para evitar que os produtos usados concorram com os novos ou para otimizar a recolha.

Para evitar a possibilidade de corrupção do sistema, os regimes de RAP devem ser obrigados a salvaguardar e garantir o potencial de reutilização dos produtos em toda a sua cadeia logística, garantindo sistemas adequados de recolha, transporte e armazenamento. Os regimes de RAP que gerem pontos de recolha / recuperação de resíduos, direta ou indiretamente, devem conceder acesso ao fluxo de resíduos têxteis a centros certificados de reutilização que possam classificar e selecionar itens potencialmente reutilizáveis. Os regimes de RAP devem também incluir nos seus editais de recolha e tratamento disposições obrigatórias para apoiar atividades sociais de reutilização de têxteis. É também importante garantir a existência de medidas adequadas de controlo e auditoria para acreditar a conformidade com os regimes de RAP.

[blockquote style=”2″]Metas de prevenção de resíduos têxteis[/blockquote]

Os regimes de RAP devem ser projetados de tal forma que os fabricantes sejam realmente encorajados a reduzir a produção de resíduos em primeiro lugar. Não se pode dar azo a que investimentos em infraestruturas de reciclagem conduzam a modelos de RAP em que se torna mais eficiente produzir resíduos do que evitá-los. Como tal, a Comissão Europeia deve ponderar a possibilidade de apoiar os regimes de RAP com objetivos de prevenção de resíduos e de reutilização e renovação de produtos.

Devem também ser consideradas metas para aumentar significativamente os esforços de reciclagem segura e livre de poluição, garantindo ao mesmo tempo que as mesmas restrições para substituição de produtos químicos perigosos se apliquem a têxteis virgens e reciclados. Todas estas metas devem ser ao longo do tempo gradualmente aumentadas.

Em nenhuma circunstância os resíduos têxteis, quando incinerados como parte de combustível derivado de resíduos (CDR), devem ser considerados como energia renovável. Os regimes de RAP devem desincentivar a utilização do fluxo de resíduos têxteis para CDR.