“Estudo, conhecimento e sensibilização” é o que melhor define os últimos 40 anos do GEOTA

Foi no mês passado, dezembro de 2021, que o GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente) celebrou quatro décadas. Os 40 anos de uma das associações mais antigas a nível nacional foram assinalados com uma entrevista a João Dias Coelho, presidente do GEOTA, onde se falou sobre os feitos marcantes desta associação e da sua importância para Portugal no combate e mitigação às alterações climáticas.

Reconhecida como uma “referência de peso junto da sociedade e das entidades governamentais”, tanto nacionais como internacionais, o GEOTA, para João Dias Coelho, caracteriza-se pelo “estudo, conhecimento e sensibilização”, tendo, dessa forma, como principal missão “estudar o território e os impactes ambientais que nele ocorrem”, “ajudar a educar e sensibilizar a sociedade a ter hábitos ambientais mais sustentáveis” e, simultaneamente, “apoiar as entidades governamentais para que possam tomar as decisões mais acertadas em prol da responsabilidade ambiental e de criação de medidas que permitam proteger o país das várias ameaças ambientais”.

Os últimos 40 anos foram assim marcados pelo desenvolvimento de ações importantes, onde o presidente do GEOTA destaca, por exemplo, em 1981, “a preparação e a intervenção documentada no debate público sobre o Plano Energético Nacional, onde e com o forte empenhamento do Eng. Carlos Pimenta, nosso fundador por excelência, nos opusemos à opção ao Nuclear em Portugal e com uma análise custo-benefício, além das questões ambientais, onde fizemos a diferença”. Outro marco foi a luta constante pelo “encerramento da Central Nuclear de Almaraz, em Espanha, que prejudicava o Tejo Internacional”, bem como o “envolvimento na Defesa do Parque Nacional Peneda Gerês”. Acresce ainda o desenvolvimento de “diversos projetos de proteção e preservação do meio ambiente em Portugal”, sendo de destacar a “atuação em áreas como a limpeza e proteção da zona costeira, com o projeto Coastwatch que se aproxima da 31.ª campanha”, a “promoção dos rios livres, através da contribuição para o cancelamento da construção de seis barragens no país e criação de um estatuto legal de proteção dos troços de rios livres”, e ainda a “replantação de uma das maiores serras do país, a Serra de Monchique, com o projeto Renature Monchique que já replantou 137 mil árvores nesta área”, exemplifica.

Passados estes anos, poucas dúvidas restam sobre a importância de uma associação como o GEOTA para Portugal: “Acredito que o papel, não só do GEOTA, mas também de várias outras associações ambientalistas foi e é fundamental para um meio ambiente mais cuidado e sustentável”. E não só numa perspetiva de “educar, sensibilizar e formar a sociedade para hábitos mais sustentáveis”, mas também na forma como “sugerem e apoiam o Governo a tomar decisões que tenham em conta o seu impacto no ambiente e na sociedade”, destaca. Através do trabalho do GEOTA e dos vários projetos levados a cabo, o responsável acredita que o mesmo possibilitou o “contacto direto” entre a sociedade e o ambiente: “Com o projeto Coastwatch, por exemplo, é possível realizar caminhadas nas zonas costeiras portuguesas para observação e registo de dados ambientais com os materiais do projeto”. Também com a Reserva Natural Local Paul de Tornada, é possível “realizar visitas guiadas e conhecer a biodiversidade presente na reserva”, ficando o cidadão “familiarizado com a enorme riqueza de biodiversidade” que o país tem: “Estes, são apenas dois exemplos de como o GEOTA se aproxima da sociedade e apoia a criação de pessoas mais sensibilizadas para o ambiente”.

Avaliando os últimos 40 anos da associação, o presidente do GEOTA faz um balanço positivo: “Foram marcados por grandes momentos de debate ambiental e acredito que durante este período tem havido uma maior consciencialização para as causas ambientais”. Desta forma, João Dias Coelho constata que é possível observar uma sociedade cada vez mais consciente acerca dos cuidados que planeta necessita: “Muitas coisas que damos por garantidas nos dias de hoje, podem acabar num futuro próximo”. Apesar deste reconhecimento e despertar da sociedade, o presidente do GEOTA acredita, contudo, que ainda existem “grandes passos a serem dados” em prol do planeta.

[blockquote style=”2″]Se queremos cumprir metas de neutralidade carbónica até 2050, é, sem dúvida, preciso mais[/blockquote]

Olhando agora para a evolução das políticas em Portugal, João Dias Coelho lamenta a atuação pouco eficaz do país: “O ordenamento do território, por exemplo, é algo que nos preocupa por ter sofrido alterações nas áreas protegidas que ficaram agora sob tutela dos municípios. E ao serem os próprios municípios a tomar as decisões de forma autónoma, acreditamos que esta poderá ser uma medida perigosa, uma vez que centra o poder numa só entidade, sem controle e tutela externa sob as suas decisões”.

Já sobre a posição do GEOTA relativamente às metas e compromissos que Portugal assume no combate e na mitigação às alterações climáticas, o responsável considera que o país, à semelhança de outros europeus, tem a “problemática que nos parece levar constantemente à estaca zero”, no que toca a medidas e metas ambientais: “As medidas são implementadas com os Governos atuais e sempre que existe uma mudança de Governo, as medidas impostas anteriormente voltam a ser avaliadas, não tendo oportunidade de serem postas em prática”. Esta é uma realidade que, para o presidente do GEOTA, causa uma “inoportunidade” de ter “impactos reais no ambiente” e de “levar do princípio ao fim medidas que podem efetivamente influenciar de forma positiva o ambiente”.

Questionado sobre a capacidade de Portugal conseguir cumprir as metas e compromissos que se propões, João Dias Coelho acredita que todas as medidas são positivas, mas que há espaço para mais: “Se queremos cumprir metas de neutralidade carbónica até 2050, é, sem dúvida, preciso mais”. Na prática, cabe, primeiramente, ao Governo a tarefa de “delinear tais medidas e de as colocar em ação”. De seguida, cabe à sociedade um papel mais ativo na “preservação do ambiente e contribuir para o sucesso das medidas estipuladas”, sucinta. E algo que parece não estar a correr bem é precisamente a falta de “planear” e “pensar” antes de construir: “Uma avaliação ambiental estratégica, algo que o GEOTA tem vindo a insistir ao longo dos anos, é obrigatória e essencial antes de qualquer projeto”. Dois exemplos que demonstram a falta de estratégia são, por exemplo, o novo aeroporto do Montijo ou a abertura do concurso ao projeto da construção da Barragem do Pisão: “O Governo tem a tendência de se desviar deste estudo que mostra o verdadeiro impacto que a construção destas infraestruturas tem no ambiente”. Além disso, faltam ainda “medidas sérias para a gestão dos resíduos urbanos”, refere o presidente do GEOTA, defendendo a importância do Governo “promover sistemas que permitam aumentar a recolha de resíduos”, desviando os mesmos de acabarem em aterros, altamente prejudiciais para o ambiente: “Estes resíduos podem ser usados para a produção de energia, para originar novos produtos e são essenciais para a promoção de uma economia circular”.

Como notas finais, João Dias Coelho não deixou de fazer um balanço da COP26 (Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas), realizada entre 1 e 12 de novembro, em Glasgow, constatando que a mesma foi uma “espécie de desfile político” onde se desviaram do que realmente importava: “as medidas de proteção do ambiente”. A verdade é que já foram feitas 26 conferências e, para o presidente do GEOTA, o resultado, na prática, acaba a “viver de promessas uma vez que os países saem destes encontros com os olhos postos nas seguintes”, não chegando a implementar medidas concretas: “Acresce o não comparecimento da Rússia e da China, duas das maiores potências mundiais, onde ficou demonstrada uma despreocupação com as alterações climáticas, algo que consideramos ser realmente preocupante”.

Como perspetiva os próximos 40 anos?

“Conhecemos as tendências, as ameaças, os desafios e as ferramentas que temos para resolver todas estas problemáticas. Por isso, precisamos de mudar, urgentemente, a nossa mentalidade coletiva, aprender a colaborar melhor e a compreender a natureza. O futuro depende de nós, depende do que decidirmos fazer hoje. Ficar parado não pode, nem deve ser uma solução, e os próximos 40 anos vão depender de cidadãos ativos, educados e sustentavelmente responsáveis, bem como de entidades governamentais informadas e munidas de estudos que lhes permitam tomar decisões acertadas, não só a nível económico e social, como também ambiental”.