FEVE: “O vidro reciclado é o recurso mais importante para a nova produção”

Aumentar a reciclabilidade do vidro é o grande objetivo da indústria e do Governo para os próximos anos. A plataforma Vidro+ surge, precisamente, com a visão de aumentar os níveis de reciclagem do vidro em 90%, até 2030, visto que, atualmente, se situa entre os 52 e os 56%. Mas, o vidro é mesmo o material que menos se recicla? Juntamos Tiago Moreira da Silva, coordenador da Plataforma Vidro+, e Adeline Farrelly, secretária-geral da FEVE (European Federation of Glass Containers), para nos falarem do real valor deste material e da importância de uma boa recolha para a economia circular.

Apesar de se considerar que é o material que menos se recicla, Tiago Moreira da Silva dá nota que, comparativamente com os outros materiais de embalagem, o vidro é o que, em Portugal, tem uma taxa de reciclagem baixa face à sua meta: “São coisas diferentes”. Citando os últimos resultados oficiais, referentes às taxas de reciclagem dos vários materiais em 2019, o responsável indica que o vidro se situa nos 56%, o papel e cartão nos 71%, o plástico nos 36%, o metal nos 46% e a madeira nos 91%: “As metas de reciclagem são diferentes para os diferentes materiais de embalagem e a taxa de reciclagem é calculada com base no apuramento das quantidades colocadas no mercado, de cada tipologia de material”.

A necessidade se criar a Vidro+ surge não só do compromisso do país no alcance de metas de reciclagem e das novas obrigações e responsabilidade, bem como do potencial que as embalagens de vidro têm: “São um exemplo de economia circular, com as suas qualidades ecológicas e a sua infinita reciclabilidade que permite poupar recursos naturais, reduzindo ainda o consumo energético e as emissões associadas ao seu processo produtivo”, refere. Acresce que, “todas as embalagens de vidro depois de usadas, podem dar origem a novas embalagens, num ciclo fechado e infinito, sem qualquer perda das suas características singulares, reduzindo também as emissões de CO2”, quando comparado com a produção a partir de matéria-prima virgem: “Tudo isso em linha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Ação Climática (ODS 13) e Consumo e Produção Sustentáveis (ODS 12).

[blockquote style=”1″]“O vidro é a embalagem do futuro”[/blockquote]

Muito em linha com a Vidro+ está a iniciativa #FutureMadeClear que se foca na sustentabilidade do vidro: “O vidro é a embalagem do futuro. Tem uma única camada, é o material mais inerte e a solução de embalagem que melhor protege o produto, bem como a saúde dos consumidores e o meio ambiente, com o menor número de produtos químicos nocivos. É reutilizável e infinitamente reciclável num loop fechado, um modelo ideal para a circularidade”, afirma Adeline Farrelly, lembrando que, a indústria tem investido fortemente nestes ativos para “melhorar o modelo de negócios do setor e torná-lo mais eficiente e sustentável”. Depois, o ano de 2022 é “especial” até porque a ONU o designou como o Ano Internacional do Vidro: “Para a ocasião publicamos o relatório “Future Made Clear”, que analisa as tendências de compra dos consumidores, que se prevê que molde o setor a nível europeu nos próximos anos”.

Para a responsável, não restam dúvidas do compromisso da indústria em tornar-se neutra em termos climáticos e totalmente circular: “Entre os desafios futuros, há a necessidade de descarbonizar a forma como o vidro é produzido, mas o caminho é claro para ser neutro em termos climáticos”. Nesta linha, é essencialmente um desafio de transição energética: “A indústria está a projetar novas formas de produção, com base em energia renovável e tecnologias híbridas para reduzir significativamente as emissões de carbono”. Outra forma de descarbonizar e tornar a produção mais eficiente e sustentável é “aumentar a quantidade de vidro reciclado no ciclo de produção”, refere Adeline Farrelly, constatando que, “aumentando o uso de vidro reciclado, a energia e matérias-primas novas podem ser economizadas, os resíduos evitados e as emissões de CO2 são reduzidas drasticamente”. A indústria está, portanto, a convocar as partes interessadas em toda a cadeia de valor de vidro para “fechar o loop” e impulsionar uma taxa de reciclagem de 90% de vidro até 2030 de forma a fazer a economia circular funcionar melhor: “O vidro é a embalagem que sempre foi mais amada pelas marcas e consumidores. Isso faz do vidro a escolha natural para diferenciar e valorizar um produto, para preservar a qualidade do conteúdo embalado, a saúde das pessoas e o meio ambiente”. Nesta ótica de compromisso, a responsável dá ainda nota que a indústria está a fazer parcerias com os clientes para introduzir a “Glass Hallmark” nas embalagens, para “simbolizar o compromisso assumido com a reciclagem de mais e melhor vidro”. E através de sua plataforma internacional Friends of Glass, a indústria de vidro está interagir diariamente com os consumidores: “Queremos ouvi-los e garantir que os ativos de embalagem de vidro continuem a ser apreciados”, sustenta.

Olhando à evolução do vidro tendo em conta a sua perceção, o relatório “Future Trends” explica como as marcas estão sob escrutínio dos consumidores e compradores para fazerem mais em termos de sustentabilidade: “As marcas precisam de dar mais visibilidade e demonstrar os desenvolvimentos na área da sustentabilidade. Comunicar claramente sobre compromissos ambientais é uma vitória clara para as marcas garantirem a lealdade dos consumidores”. Contudo, ser “notado pelos consumidores” é um grande desafio: “Cerca de 72% dos consumidores dizem que o design de embalagens de um produto influencia as suas decisões de compra. 2/3 das decisões de compra são tomadas na loja e 95% delas são realmente feitas em piloto automático, o que significa que o cérebro vai ignorar qualquer coisa que não faça sentido com o que o consumidor está à procura”. Sendo a “embalagem um ativo importante”, esta não pode ser uma preocupação posterior: “É o único veículo de comunicação que os consumidores não podem evitar”. No entender da responsável, o vidro transmite a “essência da marca” e “apela aos sentidos de todos os consumidores”, oferecendo, portanto, o “maior potencial” para uma marca se conectar emocionalmente com eles: “Desde o apelo visual das formas, cores e desenhos até às texturas que podemos sentir, ao som de abrir uma garrafa ou o pop de um frasco, ao sabor puro. Mas o vidro também corresponde às expectativas dos consumidores por uma embalagem saudável e sustentável e, portanto, ajuda as marcas a entregar credenciais de sustentabilidade”, afinca.

Questionada sobre os entraves à reciclagem do vidro, Adeline Farrelly não considera que não há barreira para a reciclagem, apenas barreiras à coleta: “O vidro é um material perfeito para a economia circular (…) e precisamos de garantir que seja recolhido separadamente (não misturado com outros materiais), que os cidadãos e utilizadores das embalagens de vidro (como hotéis, cafés e restaurantes) tenham acesso conveniente aos pontos de recolha e que sejam devidamente informados sobre os sistemas disponíveis e como classificar e descartar os seus resíduos, etc.”. E o papel da indústria de vidro deve ser, precisamente, de utilizar os níveis máximos de vidro reciclado na produção de novas embalagens: “A indústria precisa de se envolver com todas as partes interessadas ao longo da cadeia de valor e reuni-las para promover a troca de melhores práticas para garantir que mais e melhor qualidade de vidro reciclado esteja disponível para a economia circular”. Por isso, foi lançada a iniciativa Close the Glass Loop: “O vidro reciclado é o recurso mais importante para a nova produção”, assegura.

Qual é a posição da FEVE em relação à reciclagem de vidro?

“A reciclagem de vidro deve ser apoiada por um quadro legislativo europeu e nacional para garantir uma recolha separada incentivando os esquemas de EPR a a quantidade máxima de embalagens pós-consumo possível da maneira mais eficiente e eficaz. É importante que o investimento público seja direcionado para melhorar os esquemas de recolha de  embalagens de vidro, que os consumidores recebam todos os meios e recursos para depositar mais e melhor, para que possamos, então, integrá-lo mais facilmente num novo ciclo de produção e evitar desperdícios”.