Governo “pondera” retirar embalagens de vidro do futuro sistema, aprovado em Assembleia da República, alertam associações

A ZERO (Associação Sistema Terrestre Sustentável), a Sciaena e ANP|WWF sabem que o Governo está a “ponderar desrespeitar” a Lei n.º 69/2018 que determina a existência de um sistema de depósito com retorno para embalagens de bebidas descartáveis a partir de janeiro de 2022, definindo com toda a clareza que este sistema de depósito deverá incluir embalagens dos seguintes materiais: plástico, vidro, metais ferrosos e alumínio.

A “pressão que a indústria que coloca no mercado as garrafas de vidro descartáveis (marcas e distribuidores)” está a fazer como que Governo pondere retirar as embalagens de vidro deste sistema, lê-se no comunicado, que diz ainda que essa lei foi aprovada na Assembleia da República (AR) no final de 2018 por uma ampla maioria dos partidos políticos (PSD, PS, BE, CDS-PP, PAN votaram a favor e o PCP e PEV abstiveram-se).

A ZERO, a Sciaena e ANP|WWF consideram tal cenário inaceitável, e defendem o respeito pela legislação da AR. Em comunicado, associações reclamam:

  • Uma Lei da Assembleia da República tem de ser respeitada pelo Governo.
  • 70% dos sistemas de depósito existentes na Europa incluem o vidro. Assim, Portugal não tem custos de inovação, bastando-lhe aprender com os melhores exemplos europeus.
  • Há vários anos que Portugal não cumpre a meta de reciclagem para o vidro, sendo que os últimos dados disponíveis na página da Agência Portuguesa do Ambiente (relativos a 2018) indicam o valor de 51,3% de reciclagem, quando a meta para 2011 era de 60%.  Perante o aumento da exigência da meta para os próximos anos – 70% em 2025 e 75% em 2030 – é crítico que Portugal aumente a capacidade de recolha de embalagens de vidro em fim de vida .
  • Segundo dados da própria indústria portuguesa, são colocadas cerca de 600 milhões de embalagens de bebidas em vidro no mercado nacional todos os anos (cerca de 250 mil toneladas). Face aos valores de recolha seletiva existentes em Portugal, tal significa que cerca de 300 milhões destas embalagens são desperdiçadas todos os anos através da sua colocação em aterro, incineração ou abandono no ambiente.
  • O sistema de depósito permite alcançar metas de recolha de 90% das embalagens abrangidas, garantindo maior disponibilidade de material para reciclagem. Estes valores não são atingíveis através da recolha tradicional por ecopontos.
  • Um inquérito realizado no final de 2020 a uma amostra representativa da população portuguesa concluiu que 86% dos entrevistados querem um sistema de depósito com todas as embalagens – vidro, plástico, metal e alumínio.
  • O vidro é um material circular por excelência, mas a sua produção tem um enorme impacto ambiental – a reciclagem é muito mais benéfica e deve ser maximizada melhorando a recolha no final da utilização, o que só é possível fazer com eficácia com um sistema de depósito.
  • As embalagens de vidro são encontradas com muita frequência em limpezas de praia em Portugal. O abandono é um problema real em pequenos e grandes formatos, em particular no que diz respeito ao consumo de cerveja. O sistema de depósito é a forma mais eficaz de prevenir o abandono no ambiente, e permitirá a muitos municípios reduzir os custos que atualmente têm com a limpeza de praias e outros espaços públicos.
  • Portugal tem recorrentemente sentido dificuldade em cumprir as metas comunitárias de reciclagem, seja nos diferentes fluxos de resíduos (entre eles as embalagens de vidro), seja em relação ao total de resíduos urbanos. Assim, deve fazer uso de todas as estratégias que possam maximizar a recolha de embalagens para que no futuro os resultados sejam diferentes.
  • A indústria do vidro, os embaladores e as entidades responsáveis pelo sistema integrado de gestão de embalagens tiveram quase três décadas para conseguirem demonstrar a eficácia das suas estratégias na recolha de embalagens para reciclagem. Durante esse tempo falharam na concretização desse objetivo, pelo que não faz sentido que agora lhes seja dado mais tempo para supostamente alcançarem melhores resultados, quando não se conhecem situações onde através de sistemas de recolha sem depósito se tenha conseguido atingir os resultados que são atingíveis através de sistemas de depósito – acima de 90%.

As associações  já solicitaram audiências com todos os partidos políticos que estiveram envolvidos na aprovação da, no sentido de os alertar para esta situação e apelar a que intervenham no sentido de garantir o pleno cumprimento da decisão soberana tomada pela Assembleia da República. Também já solicitaram audiências com a Secretaria de Estado do Ambiente e a Secretaria de Estado do Comércio, Indústria e Defesa do Consumidor há cerca de uma semana, tendo recebido feedback sobre agendamento da primeira, refere o comunicado.