Indústria cimenteira: A abordagem “5C” que vai permitir a neutralidade carbónica até 2050

“Transição climática, adaptação e mitigação” são as palavras que norteiam o futuro da indústria cimenteira em Portugal. Quem o disse foi Gonçalo Salazar de Leite, presidente da ATIC (Associação Técnica da Indústria de Cimento), na sessão de apresentação do “Roteiro da Indústria Cimenteira Nacional para a Neutralidade Carbónica 2050”, realizada esta segunda-feira, em formato digital. A conferência “Cimentar o Futuro”, promovida pela ATIC, serviu assim para dar a conhecer quais as prioridades desta indústria no rumo à neutralidade carbónica. 

“É um dia histórico”, declarou o presidente da ATIC, reiterando o “ efeito multiplicador na economia” que a indústria cimenteira representa para Portugal: “Fornecemos um material insubstituível. O betão é um material que permite construir edificado habitacional, infraestruturas, escolas ou hospitais”. E, ao contrário do que é dito, “não há materiais mais sustentáveis”, vinca, justificando que “há uma base científica forte” para sustentar tal argumento: “Sem o betão seria muito difícil ter a qualidade de vida que existe hoje. E o betão é tão sustentável como qualquer outro”, assegura.

O “Roteiro da Indústria Cimenteira Nacional para a Neutralidade Carbónica 2050” traduz o alinhamento da indústria cimenteira nacional com os compromissos e metas nacionais estabelecidos pelo Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC2050) bem como os assumidos por Portugal no contexto europeu e internacional, nomeadamente o Pacto Ecológico Europeu (European Green Deal), através da incorporação de soluções tecnológicas inovadoras e sustentáveis, tendo em vista a descarbonização da indústria.

A pergunta que se impõe é: “Como é que vamos lá chegar?” Gonçalo Salazar de Leite assegura que tal desígnio assentará em “transformar” toda a cadeia de valor. O  Roteiro da Indústria Cimenteira Nacional para a Neutralidade Carbónica 2050 apresenta assim uma abordagem centrada nos “5C” (Clínquer, Cimento, Betão (Concrete), Construção, e (Re) Carbonatação).  No que diz respeito ao clínquer (componente que faz o cimento) e onde se gere a maior parte das emissões, o presidente da ATIC diz que a solução centrar-se-á na “utilização” e na “valorização” dos “combustíveis alternativos” que “não podem ser reciclados” e, também, através da utilização de materiais descarbonizados: “Conseguimos reduzir de forma significativa as emissões de CO2”. No Betão (Concrete), os trabalhos já está em marcha: “Estamos a trabalhar com todos os parceiros (clientes, fornecedores e empresas de engenharia), Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) e com o Instituto Superior Técnico que nos traz um conjunto de soluções de futuro para descarbonizar o cimento e o betão”. Parte da solução está também a “Construção”, bem como a Carbonatação: “É um fator novo, em análise, que faz do betão um dos principais sumidouros de CO2 do país. Temos um betão que é 100% reciclável como um poderoso sumidouro de CO2 que pode absorver até 25% das emissões resultantes da produção de clínquer. Ao longo dos anos, de forma natural, o betão volta a absorver o CO2 e quando é reciclado e britado, o potencial da absorção de CO2 aumenta exponencialmente e isto é a Recarbonatação”, explica.

É com base numa “abordagem integrada” que a indústria cimenteira, “até 2030, vai reduzir as emissões de CO2 em 48%”, afirma o responsável, sublinhando  que, mesmo considerando a cadeia de valor só até ao cimento, será, ainda assim, “uma redução de 36%”. Em 2050, assim que “disponíveis a uma escala industrial”, tecnologias disruptivas como as “tecnologias de captura e utilização de carbono” ou as “tecnologias de hidrogénio”, esta indústria atingirá a neutralidade carbónica: “Isto é um compromisso de uma indústria que pretende ser parte da solução e não parte do problema”. Há duas certezas: “Estamos absolutamente comprometidos com este objetivo. Não conseguiremos cumprir sozinhos”, admite. Para tal, atenta o presidente da ATIC, “precisamos de decisões políticas e regulatórias, da formulação de política que concilie objetivos com meios e que não nos deixem pior do que os nossos concorrentes europeus”. Nestas matérias, o presidente da ATIC chamou a atenção para não se repetir os erros do passado: “Temos que explicar e não impor. E garantir que esta transição se faz de forma equilibrada, não deixando ninguém para trás e, pelo contrário, dando uma oportunidade a todos”. A isto, acresce ainda a importância dos investidores “suportem este esforço”, assegurando, mesmo em projetos de grande dimensão, “o retorno económico” e adequado: “Continuaremos a colaborar com outros setores industrias para conseguir sinergias e temos, em particular, prevista uma intensa colaboração com o setor da construção em Portugal”, remata.

Esta Abordagem “5C” foi apresentada no dia 4 de junho de 2020 em Bruxelas, junto das principais instituições europeias para corporizar a estratégia da indústria cimenteira europeia rumo à descarbonização.