Jamestown: “a sustentabilidade não só ajuda a reduzir as pressões ambientais, como também serve como um fator estabilizador e revitalizador para o setor imobiliário”

A Jamestown é uma empresa de investimento e gestão imobiliária com presença em vários países, incluindo Portugal, e que se tem preocupado em adaptar a sua atividade aos compromissos da sustentabilidade. Carrie Denning Jackson, Diretora de Inovação e Sustentabilidade, explica à Ambiente Magazine como isto se aplica.

 

Que desafios ambientais enfrenta atualmente o setor da construção?

O setor da construção enfrenta hoje múltiplos desafios ambientais. Continua a ser um dos principais emissores de gases com efeito de estufa que alimentam as alterações climáticas, sendo responsável por 34% das emissões globais de CO2, resultantes tanto do carbono operacional como do carbono incorporado. Consome também grandes quantidades de recursos como água, cimento e aço; gera grandes volumes de resíduos de demolição; e está sob pressão para adaptar os seus ativos às exigências da transição energética e das alterações climáticas, desde a eficiência energética até à resiliência contra fenómenos meteorológicos extremos.

Outro desafio reside na necessidade de o setor se alinhar com regulamentações cada vez mais rigorosas e responder às expectativas dos investidores e utilizadores, que estão a valorizar cada vez mais os edifícios sustentáveis.

Qual o impacto deste setor no ambiente?

Carrie Denning Jackson

O impacto é amplo e multidimensional. Para além das emissões de CO₂, o setor é responsável por mais de 30% do consumo global de energia e, até 2030, poderá representar até 15% do consumo global de água potável. Na União Europeia, os resíduos de construção e demolição representam mais de um terço de todos os resíduos gerados na região.

A isto acresce a pressão sobre os solos e ecossistemas, com a impermeabilização dos solos e a fragmentação dos habitats a contribuírem para a perda de biodiversidade.

Em conjunto, estes fatores destacam a necessidade urgente de soluções mais circulares e regenerativas.

O que se pode fazer para alterar este cenário no setor da construção?

A mentalidade do setor precisa de mudar. Isso significa priorizar a reutilização adaptativa e a reabilitação em vez de novas construções, sempre que possível, e investir em materiais circulares de baixo impacto, como a madeira estrutural, cimento de baixo carbono ou aço reciclado, promovendo assim uma economia mais circular.

Considerar os materiais desde a sua criação até ao fim da sua vida útil no aterro sanitário também envolve um foco crítico na saúde humana. É essencial garantir que materiais como tinta ou isolamento não representem riscos à saúde — seja para as comunidades próximas às fábricas onde são produzidos, para as pessoas que vivem nas casas onde são usados ou para os ecossistemas ao redor dos aterros sanitários onde acabam por se degradar. Adotar uma abordagem cuidadosa para todo o ciclo de vida dos materiais, dentro da estrutura da economia circular, é um princípio fundamental para nós, pois está relacionado ao bem-estar planetário e humano.

A transição energética também desempenha um papel central, particularmente por meio da eletrificação de edifícios, instalação de painéis solares e aquisição de energia 100% renovável. Paralelamente, é vital investir na eficiência operacional, por meio de sistemas inteligentes de monitorização de energia, água e resíduos, bem como promover certificações internacionalmente reconhecidas, como LEED, BREEAM ou ENERGY STAR.

Do ponto de vista das políticas públicas, é necessário integrar uma abordagem de ciclo de vida nos processos de licenciamento e certificação, além de criar incentivos fiscais para a reabilitação e penalizar práticas intensivas em carbono.

Por fim, é essencial conscientizar as partes interessadas de que a sustentabilidade não é apenas uma exigência regulatória, mas também um fator decisivo na criação de valor, competitividade e resiliência no setor imobiliário.

Como se aplica a sustentabilidade neste setor?

Na Jamestown, adotamos uma abordagem holística que vai muito além da eficiência energética. Por um lado, priorizamos a reutilização adaptativa de edifícios históricos e industriais, preservando o património existente e dando-lhes uma nova vida como centros de inovação, cultura e criatividade. Por outro lado, promovemos a integração de uso misto nos nossos ativos, aumentando a sua resiliência económica e social e criando ecossistemas urbanos vibrantes.

O nosso programa de sustentabilidade – Jamestown Green – identifica oportunidades para integrar práticas responsáveis que impactam positivamente o ambiente, a qualidade de vida dos nossos inquilinos e visitantes e o desempenho financeiro dos ativos. Esta abordagem reflete-se na monitorização do consumo de energia, água e materiais; nas nossas escolhas de design e construção; na procura por certificações internacionais de referência, como LEED e Fitwel; e no alinhamento com protocolos globais de sustentabilidade.

Os objetivos são claros: minimizar as emissões de carbono, o uso de energia e água e a geração de resíduos, enquanto agregamos valor aos ativos, reduzindo as despesas operacionais e criando espaços saudáveis e vibrantes para as pessoas que os utilizam.

Jamestown, Lisboa

Quais as principais mudanças a fazer/adotar?

As principais mudanças envolvem dar maior importância ao carbono incorporado nos processos de avaliação, além do foco tradicional no carbono operacional; priorizar a reabilitação em vez da demolição; e investir em materiais circulares, de baixo impacto e saudáveis, que considerem todo o ciclo de vida de um produto, desde a criação até ao aterro.

Ao mesmo tempo, é necessário alinhar as políticas públicas e os incentivos fiscais para estimular a reutilização e a eficiência; enquanto se educa os investidores, promotores e ocupantes para que vejam a sustentabilidade como um verdadeiro motor da competitividade e da criação de valor no setor imobiliário.

 Que exemplos destas mudanças pode dar?

Temos vários exemplos que demonstram como é possível reduzir significativamente a pegada de carbono e, ao mesmo tempo, criar espaços inovadores e eficientes.

Na Alemanha, por exemplo, reabilitámos o edifício de escritórios Schanzenstrasse 24, em Colónia, originalmente construído em 1900, conseguindo uma redução de 43% nas emissões do ciclo de vida em comparação com uma nova construção. Em Amesterdão, na Holanda, a conversão do armazém Pilotenstraat em escritórios criativos reduziu as emissões totais em 21% ao longo de 50 anos.

Nos EUA, dois projetos destacam-se: o Levi’s Plaza, em São Francisco, que está a ser totalmente eletrificado com bombas de calor, energia solar e eletricidade 100% renovável; e o 619 Ponce, no Ponce City Market, em Atlanta, desenvolvido em madeira laminada cruzada (mass timber), com sistemas elétricos e que recentemente obteve a certificação LEED Gold.

Desde 2008, ano em que lançámos o nosso programa de sustentabilidade, integramos práticas responsáveis em todas as operações da Jamestown. Em 2020, atingimos a nossa meta de redução de 20% no consumo de energia e nas emissões de gases de efeito estufa antes do prazo e estabelecemos um novo compromisso de atingir emissões líquidas zero até 2050.

Paralelamente, adotámos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e aderimos à iniciativa Science Based Targets (SBTi), comprometendo-nos a reduzir as emissões de escopo 1 e 2 em 30% até 2030, enquanto medimos e reduzimos progressivamente as emissões de escopo 3

Aplicar estas mudanças pode ajudar a combater a crise habitacional? De que forma?

Sem dúvida. A reutilização adaptativa e a reabilitação reduzem os custos associados à construção nova, aceleram os prazos de desenvolvimento e dão nova vida a ativos subutilizados, aumentando a sua atratividade para investidores e utilizadores. Ao mesmo tempo, os edifícios sustentáveis preservam o valor a longo prazo, reduzem o risco de se tornarem obsoletos face a novos requisitos regulamentares e são mais resistentes às mudanças do mercado.

Desta forma, a sustentabilidade não só ajuda a reduzir as pressões ambientais, como também serve como um fator estabilizador e revitalizador para o setor imobiliário, criando ativos mais competitivos e preparados para o futuro.

Construção mais sustentável poderá impulsionar o investimento no setor imobiliário?

O mercado imobiliário já reconhece que os ativos sustentáveis têm maior valor, menor risco de obsolescência e maior procura tanto por parte dos inquilinos como dos investidores. Além disso, os critérios ESG tornaram-se decisivos nas decisões de investimento, reforçando a sustentabilidade como um fator de competitividade e diferenciação.

Para a Jamestown, a sustentabilidade não é apenas um compromisso ambiental, mas também, uma estratégia para criar valor económico e social.