Lisnave: Desafios para o futuro

Por: Claudia Spranger, responsável do Sector de Ambiente na Lisnave – Estaleiros Navais, SA

A LISNAVE é há 62 anos um nome de referência no panorama mundial, na área da Manutenção e Reparação Naval.

A nível nacional, tem um lugar na história industrial, política e social do País, sendo muitos os que, de alguma forma, estiveram ligados aos seus Estaleiros.  Desde 2000, que toda a actividade foi concentrada em Setúbal, no Estaleiro da Mitrena, uma instalação remodelada para enfrentar os desafios do futuro.

A LISNAVE mantém-se como um dos maiores estaleiros da Europa e continua a dar cartas na economia do mar. A actividade é desenvolvida numa ilha artificial com cerca de 1.500.000 m2, no Estuário do Sado, uma área classificada como Zona de Protecção Especial, no âmbito da Directiva Aves.O Sado é reconhecido pelas suas condições favoráveis à produção de ostras, havendo uma unidade bem próxima do Estaleiro. Pelo facto de a instalação se localizar a cerca de 15 km do centro da cidade de Setúbal, a unidade é autónoma no abastecimento de água e também no tratamento de efluentes, contribuindo assim para a protecção da zona onde se insere.

O Estaleiro tem 2 docas secas e uma plataforma, áreas do Estaleiro original, construído nos anos setenta do século passado e também um sistema inovador e 100 % Português, o Hydrolift, que acrescentou 3 Plataformas à capacidade de docagem inicial, na requalificação que ocorreu no princípio deste século. A unidade conta ainda com 6 cais de reparação e diversas oficinas.  Nesta instalação, são desenvolvidos os mais diversos trabalhos de Mecânica, Caldeiraria, Tubos, Electricidade, Tratamento de Superfície, Carpintaria, Ensaios Não Destrutivos e outros, em navios e outras estruturas flutuantes, de grande porte, constituindo um pólo importante de conhecimento e experiência.

A Empresa tem apostado na utilização de energias renováveis, nomeadamente para águas quentes sanitárias, com recurso a painéis solares e também produção de energia eléctrica através da instalação de um parque fotovoltaico, que assegura entre 6 e 8 % do consumo total da instalação.

A preocupação com o Ambiente dotou as oficinas e demais instalações, com equipamentos para recolha de resíduos, sendo que mais de 80 % são conduzidos para reciclagem. A título de exemplo e numa perspectiva de economia circular, a granalha, resíduo da indústria do cobre, e que é incorporada na actividade como abrasivo para remoção da tinta dos navios, é no final da sua utilização, encaminhada para a indústria cimenteira nacional.

São diversas as infraestruturas de protecção ambiental, como zonas para parqueamento temporário de resíduos, sistemas de tratamento de efluentes atmosféricos e estações de tratamento de águas residuais (ETAR). A nível de processo, após entrada em doca, e deslastragem do navio, todos as águas residuais contaminadas são enviadas para tratamento na ETAR industrial e todos os resíduos removidos são enviados para valorização ou tratamento em empresas licenciadas.

Desafios

São vários os desafios que a Empresa enfrenta: a fraca disponibilidade de mão de obra qualificada; a dificuldade de superar as crises relacionadas com o sector do transporte marítimo, que condicionam fortemente a actividade; bem como, o cumprimento dos requisitos legais Europeus numa instalação antiga enfrentando uma forte concorrência de estaleiros asiáticos e da Europa de Leste, com requisitos ambientais bastante menos exigentes que os da Comunidade Europeia, com preços mais reduzidos e instalações novas.

A empresa é certificada pela LRQA, de acordo com as normas ISO 9001 e 14001, na área da Qualidade e do Ambiente, respectivamente, e encontra-se em processo de certificação do seu Sistema de Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho, segundo a norma ISO 45001, prevendo alcançar esse objectivo, ainda no presente ano.

A Manutenção e Reparação Naval são por si só actividades de salvaguarda do ambiente, na medida em que promovem o bom estado de funcionamento dos navios, o que se reflecte na segurança e eficiência energética do transporte marítimo, contribuindo para a redução da pegada carbónica e dos acidentes e tragédias ambientais associadas.

De acordo com os dados disponíveis, o transporte marítimo é o que tem menores emissões de CO2 por tonelada transportada e por quilómetro percorrido (3 g), quando comparado com o transporte aéreo (560 g), Transporte pesado/camião (45 g) e Comboio (18 g).

Ainda assim, as políticas de protecção do ambiente, impostas ao transporte marítimo, têm estabelecido objectivos de redução de emissões, o que tem permitido ao Estaleiro implementar tecnologias cada vez mais eficientes nos navios que recorrem à LISNAVE, sendo disso exemplo os sistemas de tratamento de águas de lastro e de gases.

Ao nível dos requisitos relacionados com combustíveis navais alternativos, nem sempre é possível requalificar os navios de forma economicamente viável, o que leva a que muitos armadores optem pelo abate de alguns dos seus navios.

A Regulamentação Europeia, em matéria da reciclagem naval, impõe, para navios de bandeira de um estado membro, o desenvolvimento desta actividade em Estaleiros aprovados, abrindo um novo mercado para a Europa e nomeadamente para Portugal, sendo este um desafio que a LISNAVE pretende aceitar.

O Regulamento Europeu sobre a reciclagem naval irá entrar em processo de revisão, tendo sido lançada uma consulta pública, através de um questionário, que terminou a 7 de Setembro. Pretende-se que, com a revisão deste documento e emissão de directrizes e guias sobre o tema, que todo o conceito seja abordado sob a égide da economia circular, permitindo que materiais e equipamentos retirados de navios em processo de reciclagem possam ser utilizados noutros projectos e até noutras área de actividade (ex: construção civil).

Também a energia eólica offshore, com a construção de parques eólicos em alto mar, actividade na qual a LISNAVE já teve uma participação através do projecto Windfloat Atlantic, será uma aposta de futuro para a Empresa.

Este artigo foi incluído na edição 100 da Ambiente Magazine