Níveis de ruído, em Lisboa, superam amplamente os limites legalmente estabelecidos, alerta ZERO

No âmbito da ação “dÉCIbEIS A MAIS, O INFERNO NOS CÉUS”, a Associação ZERO realizou em Camarate, no concelho de Loures, a mais extensa campanha de medições de ruído aeroportuário desde 2019, ocorrida entre os passados dias 14 e 19 de julho. Numa área densamente habitada, contando com a colaboração da Junta de Freguesia local e de moradores de um dos edifícios sobrevoados, e recorrendo a equipamento de medição homologado e certificado operado pela empresa NoiseLab, a ZERO constatou que os níveis de ruído superam amplamente os limites legalmente estabelecidos – isto é, após um período de acalmia motivado pela pandemia.

Os valores diários recolhidos pela ZERO revelam que “todos os dias foram superados os limites legais tanto para a média ponderada de 24h, o denominado Lden, cujo limite legal para zonas mistas (como é o caso em termos de classificação legal) é de 65 dBA, como para o período noturno, cujo limite legal para as mesmas zonas é de 55 dBA”. Nesta monitorização, a Associação chama a atenção para a escala de decibel que é logarítmica e a intensidade sonora duplica a cada 3 dBA: “Ou seja, estamos perante níveis de intensidade de ruído que são várias vezes superiores ao que a lei determina”.

Regime de restrição de voos noturnos continua a ser uma farsa

A ZERO monitorizou nos últimos dias o número de movimentos aéreos (aterragens e descolagens) ocorridos durante a noite no aeroporto, para aferir o cumprimento da Portaria 303-A/2004 de 22 de março. De acordo com legislação do ruído publicada em 2000, não deveria ocorrer qualquer movimento aéreo no aeroporto de Lisboa entre as 0 e as 6 horas, mas a referida Portaria de 2004, motivada na altura pela realização do Euro 2004, estabelece a possibilidade de voos nesse período mediante restrições, quer no tocante às aeronaves que podem operar em função das suas emissões sonoras, quer no número de voos ocorridos. Na semana iniciada a 11 de julho, a ZERO registou um total de “140 movimentos nesse horário”, o que corresponde a uma “flagrante violação da legislação, que estabelece um limite de 91 voos semanais”. Ou seja, “foram registados 49 voos acima do permitido (o mesmo tipo de violação ocorre se considerarmos outros períodos de sete dias neste mês de julho)”, reclama a Associação, alertando para o facto e “não ser só o limite que não está a ser cumprido”, como “está a ser largamente excedido em mais de 50%. Já no período entre as 23 e as 7 horas, a ZERO tem registado sistematicamente cerca de 70 movimentos por noite “Estamos, portanto, perante um atropelo gigante e inadmissível a um direito fundamental dos cidadãos, o direito ao descanso, com todas as consequências daí decorrentes em termos de distúrbios de sono e patologias associadas”, lê-se no comunicado.

Plano de Ação de ruído continua no papel

O corrente Plano de Ação do Ruído para o Aeroporto Humberto Delgado, elaborado apela ANA Aeroportos e aprovado pela Agência Portuguesa do Ambiente ao abrigo da legislação, foi disponibilizado apenas em 2021, mas diz respeito ao período 2018-2023. A ZERO faz ainda notar que este plano se baseia na “operação de 2016, com 182.148 movimentos anuais, sendo que em 2019 a operação já tinha crescido para 222.984 movimentos, i.e., 22,4% face a 2016, sendo que, nos últimos meses, a operação está praticamente ao nível dos meses homólogos de 2019, pré-pandemia”. Tal significa que “estamos perante um plano que já estava profundamente desatualizado quando entrou em vigor”, sustenta.

Neste plano, de acordo com a ZERO, prevê-se a “insonorização a partir de 2021 de vários edifícios de serviços”, incluindo públicos, nomeadamente hospitais e escolas, e de habitação, operação que ficaria a cargo da própria concessionária do aeroporto. Mas, no entender da Associação, “este plano é extremamente deficiente e ineficaz”, pois, para além da “obsolescência já apontada, prevê intervenções demasiado dilatadas no tempo e circunscritas geograficamente”, pautando-se por “critérios discricionários para as mesmas”, limitando-as às com “razoável custo associado”, não existindo critério objetivo e defensável para separar os edifícios intervencionados dos não intervencionados. A isto acresce que “não há qualquer indício” de que o plano esteja a ser executado: “não há obra executada, nem tão pouco foi disponibilizada a plataforma digital para os proprietários de imóveis afetados se candidatarem a financiamento no âmbito do Programa de Isolamento Acústico”, reitera a ZERO.

Face ao número crescente de queixas sobre o ruído provocado pelo tráfego aéreo, a ZERO passa a disponibilizar no seu site um formulário com vista a facilitar e agilizar o envio das reclamações para as entidades competentes.