O que dizem os especialistas sobre o futuro da mobilidade elétrica em Portugal?

“O Futuro da Mobilidade Elétrica em Portugal” esteve em debate na apresentação do novo posicionamento da MOBI.E. A sessão, que decorreu esta segunda-feira em formato online, teve como foco dar a conhecer quais os objetivos e ambições da MOBI.E para o futuro.

[blockquote style=”2″]Queremos postos de carregamentos a funcionar[/blockquote]

Para falar sobre a evolução da rede MOBI.E, Henrique Sánchez, presidente da UVE (Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos), evidenciou que, durante 2019 e 2020, a “rede pública de carregamento deu um salto substancial” mas, mesmo assim, o responsável considera que as “atuais circunstâncias” exigem que “andemos mais depressa”. Segundo o responsável, as “vendas dos automóveis ligeiros com motor a gasóleo ou gasolina estão há oito meses com “quedas sucessivas”, sendo que, no “global do ano”, a queda anda em torno dos 40%. Uma realidade contrária à dos veículos 100% elétricos ou os híbridos plug-in: “Estão há cinco meses consecutivos a subir na variação homologo mensal, estando 41% acima do igual período ao de 2019”. Posto isto, o responsável não tem dúvidas da “expansão da venda de veículos elétricos”, bem como da “expansão de rede pública de carregamentos elétricos” e, mesmo, da “rede privada”, que se tornará  num complemento à rede pública. Mas a pandemia da Covid-19 veio trazer uma certeza: “Veio mostrar-nos a necessária e absolutamente indispensável aceleração da transição energética” e da “eletrificação dos transportes”, quer do individual, quer do coletivo: “O caminho é este e temos de imprimir mais velocidade”.

Do ponto de vista dos utilizadores, o responsável é perentório: “Queremos postos de carregamentos a funcionar”. Relativamente à rede pública de carregamento,  Henrique Sánchez reconhece que a rede está a avançar e dá como exemplo os concursos que a MOBI.E lançou para as primeiras estações de carregamento, “os hubs e os carregadores ultra-rápidos”. No entanto, o responsável considera que é fundamental “políticas públicas. E a MOBI.E é um braço do Governo para conseguir levar esses incentivos a zonas do país que, neste momento, os operadores privados têm ainda algum receio em avançar”. Sobre o facto de haver uma “rede maior” face ao número de viaturas, Henrique Sánchez, acredita que a “apetência” das pessoas é cada vez mais significativa, havendo ainda receio em “não conseguirem carregar” ou “fazerem viagens pelo país” pelo que é fundamental “termos uma rede de carregamento eficiente e fiável” para que as pessoas dêem o tal passo.

Relativamente aos veículos híbridos plug-in, a UVE defende que, “gradualmente, devem ser retirados incentivos” devendo passar para os 100% elétricos. De qualquer forma, os veículos 100% elétricos continuam a ter “aumentos substanciais homólogos em relação ao período de 2019”, refere. E, embora o híbrido plug-in seja aproveitado pelas empresas para, do ponto de vista fiscal, terem “menos custos”, Henrique Sánchez afirma que “têm sido uma porta de entrada” para muitos utilizadores de veículos elétricos: “Não devemos diabolizar os híbridos plug-in”. 

Do ponto de vista do responsável, é fundamental que se mantenham políticas públicas ao nível dos incentivos para a aquisição e ao nível fiscal, para se “avançar com a rede pública” para regiões do país “pouco procuradas pelos operadores privados” ou para um “tipo de equipamento ultra-rápidos ou hubs de carregamento” que, neste momento, “não são atrativos para os operadores privados”.

[blockquote style=”2″]A regulação não é clara[/blockquote]

Do lado da operação, esteve Carlos Ferraz, responsável da área de negócio da mobilidade elétrica na PRIO, que destacou que a “rede em carregamento” em 2020 teve uma “queda acentuada” em relação a 2019: “A rede não está de todo saturada”. Do lado dos operadores, o responsável quis chamar a atenção para os investimentos: “Temos de olhar para isto de uma forma sustentada em termos de financiamento” até porque uma “rede enorme sem utilização acaba por perder qualidade”.

Já sobre os principais desafios para quem opera, Carlos Ferraz destaca, primeiramente a estabilização do próprio mercado: “O mercado não está estável e as políticas não estão totalmente claras”. Depois, acrescem, segundo o responsável, os “problemas regulatórios” face ao que é a mobilidade eléctrica em Portugal e no resto do mundo: “Há um modelo de negócios que ainda não está definido”, sendo necessária que haja uma “legislação” e “regulamentos” que definem como é que tudo funciona. Por outro lado, Carlos Ferraz  considera que os sistemas têm de ser “amadurecidos”, visto que “carecem de fiabilidade” naquilo que são “os dados que “chegam aos operadores” e que possibilitam que “avancemos com investimentos e novos modelo de negócios para desenvolver mais” a mobilidade elétrica. 

Outro ponto que merece ser clarificado é, precisamente, a regulação: “Não é clara e não permite que quem está do lado da operação consiga ter as regras definidas para perceber como se movimentar”, refere.

Na visão do responsável, é preciso definir se a “mobilidade elétrica” vai estar entregue à iniciativa pública ou privada: “Não podemos misturar as duas iniciativas porque vamos ter problemas e vai criar dificuldades a quem está no mercado”. 

[blockquote style=”2″]Não há razão nenhuma para que o mercado não funcione bem[/blockquote]

Já para falar sobre o futuro das redes na cidade de Lisboa, foi convidado o vereador da mobilidade da Câmara Municipal de Lisboa, Miguel Gaspar. Para o responsável, o Governo português tem um “pacote de incentivos muito interessante” para aquilo que é a mobilidade elétrica. E na cidade de Lisboa, também há um “esquema interessante” nessa matéria : “Um carro 100% elétrico não paga estacionamento na via pública”, refere. Além disso, o responsável quis destacar aquela que foi, ao longo deste ano, a “oferta das marcas” e o “salto que se deu”  naquilo que é “oferta de veículos elétricos para o consumidor”, considerando mesmo que “os incentivos a nível nacional deviam começar a deixar cair os plug-in e focaram-se nos que são 100% elétricos”. Miguel Gaspar defende, assim, uma “aposta clara” ou um “desvio gradual” nos incentivos para aquele tipo de veículos. 

Quanto às metas da descarbonização, o vereador considera que as empresas devem mobilizar-se nesse sentido: “A Câmara Municipal de Lisboa tomou uma deliberação que não compra nenhum veículo que não seja elétrico”. Neste momento, acrescenta, a “frota de ligeiros” da Câmara é, praticamente, toda com “veículos elétricos”, algo que se estende à Carris,que começa a “eletrificar a sua oferta”. Já quanto ao “compromisso verde”, Miguel Gaspar destaca que “mais de 200 entidades” se comprometeram a “fazer algo para reduzir o seu impacto” na cidade e a larga maioria comprometeu-se na “eletrificação da frota”. 

Relativamente às redes de carregamento, o responsável considera que nos pontos de carregamento em parques ou em garagens, existe um “trabalho de retrofiting” daquilo que são as garagens. Por outro lado, destaca a modernização dos parques de estacionamento, dando como exemplo o esforço que a EMEL está a fazer para a modernização dos seus parques. Destaque também para as parcerias que a Câmara Municipal de Lisboa tem, onde há “um grande investimento dos privados na adaptação dos parques à mobilidade elétrica”, acrescenta. 

Na via pública, Miguel Gaspar destaca que a Câmara de Lisboa vai abrir ao público em fevereiro três pontos de carregamento rápidos de elevada disponibilidade: “Vamos ter, pelo menos, 12 pontos de carregamento disponíveis em cada uma das três localizações”. O responsável refere que a Câmara avançou para esta proposta porque o mercado estava a falar: “Não vimos do lado da iniciativa privada o esforço adequado para dotar a cidade de uma rede de carregamento adequado”. Mesmo assim, refere, foram identificadas seis localizações onde este tipo de carregamento podem estar: “Só estamos a usar três; queremos lançar as outras possibilidades ao mercado”, diz. A Câmara Municipal de Lisboa é, assim, uma “firme defensora do modelo de mobilidade elétrica” e da MOBI.E: “Acreditamos que é um modelo mais aberto que pode fomentar a concorrência e trazer eficiência para o lado do consumidor”, afirma.

Posto isto, Miguel Gaspar considera que “não há razão nenhuma para que o mercado não funcione bem”,  considerando que existem todas as condições para que os “operadores económicos possam investir”.

*Foto: Associação UVE – Utilizadores de Veículos Elétricos / Facebook