Oceanário de Lisboa defende maior literacia do oceano na consulta pública da Educação para a Cidadania
Até amanhã, 5 de agosto, está o decorrer o processo de consulta pública da Educação para a Cidadania, e o Oceanário de Lisboa mandou o seu contributo defendendo que “incluir mais oceano na Educação para a Cidadania permitirá criar uma geração de portugueses mais qualificados e preparados para um mundo em transformação, em que o oceano assume uma importância estratégica para o país e para o mundo”. Rita Borges, Responsável pelos Programas Escolares do Oceanário de Lisboa, explica a posição à Ambiente Magazine.
Quais os principais contributos do Oceanário de Lisboa na consulta pública para a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania?
O Oceanário de Lisboa considera que incluir mais oceano na Educação para a Cidadania permitirá criar uma geração de portugueses mais qualificados e preparados para um mundo em transformação, em que o oceano assume uma importância estratégica para o país e para o mundo.
O oceano é um dos sistemas de suporte de vida da Terra, fundamental na regulação do clima, no combate às alterações climáticas, na produção de oxigénio e proporciona muitos outros benefícios e serviços à Humanidade.

O Oceanário de Lisboa, pela sua experiência de mais de 27 anos a liderar projetos de literacia do oceano, em Portugal e na Europa, pode hoje afirmar que a interdisciplinaridade dos temas do oceano permite “derrubar as paredes das disciplinas”, desenvolvendo competências expressas nas Aprendizagens Essenciais de quase todas as componentes de currículo e nos domínios da autonomia curricular.
Para nós, um ensino com maior foco no oceano, para além da aquisição de conhecimentos diferenciados sobre o mundo marinho, permite ainda desenvolver princípios, valores e competências, que permitam aos alunos ser cidadãos ativos e mobilizadores pela conservação do oceano, contribuindo para um futuro mais sustentável do planeta (ver o Perfil dos Alunos da Geração Azul).
Desta forma, o Oceanário de Lisboa identificou lacunas na atual proposta de Aprendizagens Essenciais e sugeriu a inclusão de temas ligados ao oceano, que valorizassem as aprendizagens e contribuíssem para alunos mais preparados para os desafios do futuro. Para além da proposta pedagógica, o Oceanário assumiu também um papel ativo na mobilização de parceiros educativos, instituições e sociedade civil, incentivando a participação na consulta pública e a consciencialização coletiva sobre a importância de integrar o oceano como pilar da Educação para a Cidadania, reforçando o seu valor estratégico para um futuro mais sustentável.
Quais os maiores desafios que enfrentam os oceanos atualmente?
Atualmente, falamos em apenas um oceano global, dividido em cinco bacias, que enfrenta diversas ameaças.
O oceano tem sido o nosso principal aliado contra as alterações climáticas, através da absorção de carbono e do calor em excesso na atmosfera e pelo seu papel central na regulação do clima ou do ciclo da água. No entanto, a crise climática global impacta fortemente o oceano. O aumento da temperatura da água do mar, com ondas de calor mais frequentes, e a acidificação do oceano estão a destruir ecossistemas marinhos, como os recifes de coral, a alterar a distribuição das espécies ou a provocar o aumento do nível médio da água do mar.
Mais ainda, a sobrepesca e a utilização de artes destrutivas; o lixo marinho e outras formas de poluição, como a orgânica que aumenta a eutrofização, que provoca a redução do oxigénio disponível para os organismos marinhos, contribuem para a crise global da perda de biodiversidade marinha.
Apesar de ser o mais importante recurso natural, o oceano é também um dos mais afetados pela ação humana. O crescimento da população humana, a pressão nas zonas costeiras, as alterações climáticas, a extinção massiva de algumas das mais emblemáticas espécies marinhas, a exploração desregrada dos recursos marinhos e a poluição são as principais ameaças à sustentabilidade do oceano e do planeta.
Porque é que é importante incentivar a literacia do oceano?
Face aos desafios e à importância do desenvolvimento socioeconómico do século XXI é da maior relevância promover a literacia ambiental, e a sustentabilidade é um princípio basilar para a sobrevivência da espécie humana.
Nesta que é a Década do oceano das Nações Unidas, Portugal destaca-se cada vez mais na agenda internacional do mar, como líder na proteção marinha, através da criação de novas Áreas Marinhas Protegidas e do cumprimento de metas da Agenda 2030.
Esta aposta torna-se ainda mais importante devido à importância estratégica do oceano para Portugal, não apenas pela sua dimensão, que faz de Portugal um gigante marítimo europeu, mas também pela riqueza dos seus recursos naturais, fundamentais para potenciar o desenvolvimento sustentável económico e promover a descarbonização do país e do planeta.
Face à importância do mar para o nosso país, é essencial que exista uma mudança transformadora na relação entre a sociedade e o oceano e, para tal, é fundamental uma maior literacia do oceano. Esta maior compreensão da influência que o oceano tem na nossa vida e do nosso impacto no mundo marinho, só é conseguida com uma educação azul mais eficaz, sustentável e estruturante, apenas possível através da inclusão do oceano no currículo. Assim, Portugal deve assumir e liderar o processo de construir um currículo mais azul, que permita dotar os jovens portugueses de conhecimentos, competências, valores e atitudes para que possam desde cedo beneficiar das oportunidades criadas por áreas tão promissoras como o turismo marítimo e costeiro, as energias renováveis marinhas, os transportes e os portos, a sustentabilidade ambiental, a valoração dos serviços prestados pelos ecossistemas marinhos e costeiros, a investigação científica e os novos usos do mar (como a bioeconomia, a biotecnologia marinha a aquacultura ou o cultivo de algas para biocombustíveis). Um ensino mais azul que desenvolva o potencial dos jovens portugueses, para que sejam futuros decisores e agentes efetivos de mudança.
Qual o papel dos mais jovens no futuro do oceano?
Garantir um desenvolvimento sustentável é reconhecer o oceano como responsável pelo equilíbrio da vida na Terra e implica uma profunda transformação na maneira de pensar e agir. Por isso, é essencial formar crianças e jovens com conhecimentos, competências, valores e atitudes, que contribuem para um futuro em equilíbrio com a natureza. A educação é, pois, crucial para que os alunos se tornem agentes de mudança, tomem decisões informadas e conscientes e ajam de forma responsável pela integridade ambiental, pela viabilidade económica e por uma sociedade justa, em nome das gerações presentes e futuras. O futuro do planeta, em termos sociais e ambientais, depende da formação cidadã das crianças, para que no futuro sejam adultos com uma conduta cívica, com competências e valores não apenas para compreender o mundo que os rodeia, mas também para procurar soluções que contribuam para nos colocar na rota de um desenvolvimento sustentável e inclusivo.
O exercício de uma cidadania ambiental ativa, participativa e mobilizadora é fundamental e é um direito que os jovens têm. A sua ação deve começar a nível local, com consciência global, e deve haver oportunidades para que a sua voz seja ouvida pelos adultos e tida em consideração nos fóruns políticos, nacionais e internacionais, onde são tomadas decisões que afetam o seu futuro.
Que temáticas devem ser especificamente enquadradas na disciplina de cidadania?
A inclusão da literacia do oceano na educação para a cidadania é um instrumento-chave para se alcançarem os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e cumprir a Agenda 2030. Assim, os temas relacionados com o mar enquadram-se na Dimensão do Desenvolvimento Sustentável, promovendo uma maior consciência da importância que o oceano tem para a sustentabilidade ambiental, social e económica.
Mais ainda, o Oceanário de Lisboa considera essencial incluir o oceano, pelo seu carácter multidisciplinar, em todas as outras Dimensões da Educação para a Cidadania:
- nos Direitos Humanos, pois o direito a ecossistemas marinhos saudáveis deve ser transversal a todas as gerações;
- na Democracia e instituições políticas, pois é fundamental fomentar a participação ativa e informada sobre todos os tópicos relevantes para o futuro do planeta, como é o oceano, no debate democrático sobre a resolução de problemas ambientais, sociais e económicos;
- na Literacia financeira e empreendedorismo, pois é importante compreender o potencial do capital natural azul para desenvolver soluções inovadoras de bioeconomia, que valorizem a sustentabilidade ambiental e promovam o desenvolvimento económico e social.
- na Dimensão da Saúde, pois é importante reconhecer o papel do oceano para a saúde e o bem-estar humanos ou, por exemplo, compreender os efeitos negativos das alterações climáticas e da poluição marinha;
- |no Risco e segurança rodoviária, pois torna-se fundamental conhecer como os ecossistemas marinhos contribuem para a regulação de catástrofes naturais e para a mitigação de riscos causados pelas alterações climáticas.
- |no Pluralismo e diversidade cultural, pois o mundo marinho conecta toda a humanidade, permitindo a aquisição de competências que relacionem a identidade local e global, para uma cidadania aberta ao mundo.
- |através dos Média, é essencial promover a literacia do oceano, pela importância que hoje adquire na tomada de decisões informadas e conscientes e a formação de opiniões na participação cívica e democrática e na mobilização de jovens pelo ambiente.
O Oceanário de Lisboa defende que parcerias podem ser contributivas para encaixar estes temas na educação dos mais jovens?
As parcerias são fundamentais para a capacitação e mobilização dos jovens pelo ambiente, e pelo oceano em particular, e para a capacidade de o fazer a uma escala relevante. A Direção-Geral da Educação, o Governo Regional dos Açores, os diversos Municípios, as ONGs, os centros de investigação, as universidades, os centros de ciência, os escuteiros, os dirigentes e os coordenadores escolares, redes de escolas, centros de formação de professores e, principalmente os professores, são alguns dos nossos parceiros ativos na promoção da literacia do oceano, de forma formal ou não formal, com quem articulamos de forma sistemática na promoção de uma Geração cada vez mais azul.
O Oceanário de Lisboa acredita que através de parcerias conseguirmos construir uma nova geração, uma geração azul e, para um país como Portugal, esta possibilidade é uma tremenda oportunidade. Com a qual podemos qualificar e tornar melhores os nossos principais recursos: as pessoas e o mar.