#Opinião: “Enriquecimento Ambiental: a importância dos estímulos nos animais”

Por: Francisco Ramos, curador do Zoo Santo Inácio

Em estado selvagem, os animais deparam-se constantemente com diferentes desafios e estímulos, seja na busca por alimento, abrigo ou parceiro sexual, pelo facto de se encontrarem inseridos num ambiente em contínua mudança. Porém, quando estes habitam em zoológicos, a alimentação é fornecida segundo regimes controlados e previsíveis; existe proteção de muitas das potenciais interações competitivas; os parceiros sexuais são escolhidos; o ambiente é seguro e não muda de forma drástica. Estas condições controladas podem despoletar apatia no animal, inibição dos comportamentos naturais e aumento da expressão de comportamentos anormais, comprometendo o bem-estar animal. É, então, mais que certo que existe a necessidade de recorrer a uma ferramenta que promova o bem-estar animal, denominada genericamente de enriquecimento ambiental.

O enriquecimento ambiental é, nada mais nada menos, que um processo dinâmico usado para criar ambientes interativos e complexos, de acordo com a ecologia de cada espécie, para os animais sob cuidados humanos. As alterações no ambiente são feitas com o objetivo de estimular os comportamentos naturais da espécie, aumentar o reportório comportamental e fornecer a possibilidade de escolha e controlo sobre o ambiente. Assim, pela adição de estímulos, sejam estes físicos, sensoriais, cognitivos, alimentares ou sociais, realizada através das mais variadas técnicas de enriquecimento ambiental, pretende-se, diariamente, compensar a falta de estímulos que os animais experienciariam no seu habitat natural.

Consoante a ecologia da espécie e as necessidades individuais de cada espécime, o enriquecimento ambiental é definido apenas após a identificação dos comportamentos que se pretendem estimular ou, por outro lado, desencorajar. No Zoo Santo Inácio, existe uma lista de enriquecimentos para cada animal, que vai ao encontro do cumprimento do objetivo inicialmente delineado. A partir dessa lista, é elaborada uma planilha mensal de implementação de enriquecimentos para cada espécime. Para além disso, a aplicação de cada enriquecimento é documentada e avaliada, tendo em conta a interação do animal e o efeito que o enriquecimento causou no mesmo. Ao longo de todo o processo são feitos reajustes no plano e na aplicação dos enriquecimentos, devido aos resultados das avaliações realizadas pelos membros da Área Animal, à existência de casos clínicos ou possíveis outros eventos.

Um dos tipos de enriquecimento mais praticados no Zoo Santo Inácio é, precisamente, o alimentar. Considerando que, normalmente, os animais acabariam por despender menos tempo para obter o alimento e, muitas vezes, este é fornecido nos mesmos locais e pronto a ingerir, acaba-se por criar uma rotina e facilidade na obtenção do mesmo. Então, procuramos utilizar técnicas de enriquecimento alimentar que combatam essa tendência: desde a rotação dos pontos de alimentação praticado no habitat da Savana Africana, a alteração do horário de alimentação do porco-espinho do Cabo ou esconder alimentos pela instalação do tigre da Sibéria, ou até aumentar o grau de dificuldade na obtenção dos alimentos junto dos suricatas.

Todos estes exemplos de técnicas praticadas fazem com que os animais invistam mais tempo em atividades relacionadas com a alimentação, procurando, assim, que esta tarefa se aproxime o máximo possível com o nível de atividade dos animais em estado selvagem.

Sem sombra de dúvidas, o enriquecimento ambiental tem trazido mudanças notáveis junto de várias espécies do Zoo Santo Inácio, quer pelo aumento dos níveis de atividade nos linces euroasiáticos, ao maior uso do espaço do habitat dos wallabies de Bennett. Aliás, o enriquecimento ambiental é também positivo na medida em que, quando os animais se encontram mais ativos, chamam mais à atenção dos visitantes, gerando um maior interesse pelo conhecimento de uma espécie, como acontece no caso das cutias.

Os benefícios que o enriquecimento ambiental pode trazer, dando cada vez mais suporte à eficácia e necessidade do seu uso em animais sob cuidados humanos, indicam-nos que este é mesmo o caminho a seguir!