Opinião: “O futuro do setor terá de passar pela criação de condições para uma maior competitividade”

Por Eduardo Marques, Presidente da Direção da AEPSA

No setor das águas verifica-se, há vários anos, uma preocupante situação de estagnação em termos de eficiência e sustentabilidade económica. Com base nos relatórios de acompanhamento do PENSAAR 2020, confirma-se que os indicadores globais estão muito abaixo das metas estabelecidas. No entanto, o setor privado concessionado apresenta melhores indicadores e é o que mais tem contribuído para a sua melhoria. Concluiu-se, com base nos dados do regulador, que, em geral, o setor privado apresenta indicadores superiores de qualidade de serviço aos utilizadores.

Um dos principais problemas do setor é a sustentabilidade financeira. O serviço de abastecimento de água apresenta prejuízos anuais de mais de 90 milhões de euros. Num universo de 256 entidades só em 77, onde se incluem as concessões privadas, as receitas cobrem os custos do serviço. Verifica-se em muitas entidades públicas uma gravíssima situação de falta de sustentabilidade económica, apesar de subsidiarem fortemente a tarifa, à custa dos impostos e dos orçamentos municipais, agravando as finanças públicas e não cumprindo o princípio obrigatório do utilizador-pagador. É imprescindível promover mecanismos que garantam a sustentabilidade a prazo de todas das entidades, através de tarifas adequadas, que num regime de eficiência garantam a cobertura dos custos.

Relativamente ao setor privado concessionário, intensificam-se as preocupações, pois verifica-se uma conjetura setorial adversa, agravada por posições demagógicas que irracionalmente propiciam resgates de concessões. Veja-se a norma constante no OE de 2021, que define que os valores para resgates de concessão não são considerados no limite do endividamento municipal. Esta norma do OE, bem como outras recentes disposições da mesma linha conceptual, podem pôr em causa a continuidade do setor privado concessionário, que serve cerca de 20% da população portuguesa, emprega diretamente mais de 2.000 trabalhadores e que já investiu em infraestruturas essenciais mais de 1.200 M€. Contrariamente ao que se está a verificar, acredito que o futuro do setor terá de passar pela criação de condições para uma maior competitividade e com um maior envolvimento do setor privado, para promover níveis superiores de eficiência e inovação, tornando o setor mais atrativo para o financiamento de que vai precisar.

No domínio dos resíduos, têm sido múltiplas as iniciativas estruturantes do MAAC neste setor, como a revisão do Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro, (UNILEX) e a aprovação do Regime Geral de Gestão de Resíduos pelo Decreto-Lei n.º 102-D/2020. Estas alterações são profundas e abrangem a gestão de resíduos, quer urbanos, industriais, perigosos e não perigosos, elétricos e eletrónicos, a deposição em aterro e a taxa geral de resíduos.

O Governo tem vindo a aprovar de forma atomizada uma série de estratégias, como a dos biorresíduos, sem, contudo, ter aprovado de forma prévia o Plano Nacional de Gestão de Resíduos, o PERSU 2030, e o Plano Estratégico para os Resíduos Não Urbanos. Trata-se de uma verdadeira inversão processual. O Governo decidiu não iniciar as mudanças legislativas e regulatórias através de um processo de planeamento estratégico top-down, que é onde se inicia a definição das políticas públicas. Contrariamente, o Governo optou por ir aprovando medidas operacionais, sem esforço de alinhamento e de coerência entre políticas e planos, entre objetivos macro e ações, entre metas temporais e prazos de cumprimentos, entre a macro gestão de recursos disponíveis e alocação de financiamento a projetos avulsos.

O mercado precisa de estabilidade, os investidores são avessos a surpresas e o OE de 2021 apresenta alterações substantivas a nível dos poderes regulatórios da ERSAR. São determinantes a transparência, a estabilidade e a previsibilidade do quadro regulatório e legislativo para garantir segurança e confiança aos agentes do mercado. Esta alteração validada pelo OE é, infelizmente, o contrário do que deve o Estado fazer em matéria de políticas públicas.