#Opinião: “Qualidade do ar interior – um imperativo para a saúde”

O tempo que passamos dentro de edifícios é cada vez maior – uma consequência direta dos períodos de confinamento e da pandemia. Além disso, a nova realidade laboral, impulsionada pelas circunstâncias atuais, reduziu a utilização de uma maior diversidade de espaços interiores (estamos mais circunscritos às nossas casas que, em muitos casos, se tornaram de forma permanente locais de trabalho; almoçamos e jantamos menos fora; vamos a menos espetáculos, etc) e, por isso, as pessoas passaram a estar expostas, mais tempo, aos mesmos poluentes. Os materiais de construção são aqueles que, regra geral, estão mais associados a este risco, desde logo porque representam uma maior área emissora, levando a que tenham já sido objeto de regulação em muitos países europeus, embora não em Portugal. No entanto, já podemos encontrar no nosso país materiais de construção com rótulos que atestam a sua baixa emissão. O rótulo ecológico europeu decorrente de legislação francesa, é o mais conhecido. Também o mobiliário pode ser outra das principais fontes de compostos nocivos como o formaldeído e o fenol, presentes nas resinas aglomeradoras. Por isso, e partindo “apenas” destes fatores, poderia afirmar que o ar que se respira no interior dos edifícios é diferente do ar do ambiente exterior.

Estudos recentes realizados sobre a natureza e extensão da poluição do ar revelaram que a qualidade do ar interior é a parte mais significativa da exposição pública à poluição do ar. Em geral, em meios urbanos, esta exposição excede 90% (60% no local de residência, 30% no local de trabalho e 5% no tráfego urbano). Estas razões levaram ao aparecimento do Síndroma do Edifício Doente que, também em Portugal, afeta cada vez mais indivíduos e que ocorrem frequentemente em edifícios com sistema central de ventilação em que o tipo de sistema de humidificação resulta em fonte de contaminação por micróbios e fungos. Este síndrome apresenta várias vertentes como sejam a exposição dos indivíduos a níveis elevados de poeiras no ar e de compostos orgânicos voláteis libertados pelos materiais de construção e infiltrados a partir do exterior, além das doenças provocadas por vírus e bactérias resultantes de manutenção e limpeza deficiente dos sistemas de ar condicionado, que pode vir a resultar em consequências tão graves como sejam as infecções pulmonares e as pneumonias.

Assim, tal como para o ar exterior, têm vindo a ser estabelecidos valores-limite para as concentrações de diversos compostos considerados nocivos para os seres humanos expostos, para o ar interior e, em particular, para atmosferas de trabalho. Estes valores baseiam-se em critérios toxicológicos que tem vindo a evoluir à medida que o conhecimento sobre a toxicidade das substâncias vai sendo mais fundamentada, o que origina que os valores-limite sejam revistos periodicamente.

Importa referir algumas conclusões que comprovam este factos: um relatório da iniciativa Buildings 2030 afirma que a exposição ao ar interior de baixa qualidade levou a níveis decrescentes de produtividade no local de trabalho e ao aumento do absentismo devido a doenças, além de períodos de atenção reduzidos nas salas de aula. Também a Organização Mundial da Saúde publicou números que revelam que 3,8 milhões de pessoas morrem a cada ano prematuramente devido a doenças atribuíveis à poluição do ar doméstico. Um relatório do World Green Building Council, intitulado “Fazer o correto pelo planeta e pelas pessoas”, publicado em abril de 2018, observa: “Os trabalhadores preferem e trabalham melhor em locais com muita luz natural, ar de boa qualidade e acesso a áreas verdes”.

Também a eficiência energética ganhou peso na definição de um edifício e, por sua vez, associou o isolamento e a hermeticidade como um conceito de perdas térmicas, embora a combinação de ambos, sem uma boa ventilação, possa causar um problema grave na qualidade do ar interior.

Em suma, diria que é de importância primordial se não vital, efetuar-se uma regular monitorização dos parâmetros que definem a boa qualidade do ar interior, ou seja, da concentração dos poluentes atmosféricos, por forma a definir condições adequadas de ventilação e renovação do ar interior e, assim garantir a existência de meios salubres para os seus ocupantes.