Por Bernardo Fernandez, fundador da Bling Energy
Neste Dia Mundial da Energia (29 de maio), é essencial reforçar que garantir um fornecimento energético seguro, acessível e sustentável passa por repensar o modelo atual. O recente apagão que afetou Portugal e Espanha veio lembrar-nos que o sistema elétrico não pode depender apenas de grandes investimentos nas redes ou da independência energética. É urgente olhar para soluções complementares, como a descentralização da produção, que permitem uma gestão mais equilibrada, resiliente e inteligente da energia. Neste dia, mais do que celebrar, devemos agir e planear um futuro energético mais robusto, eficiente e participativo.
Num contexto de domínio da energia elétrica na nossa sociedade, das casas aos transportes, da indústria à climatização, a exigência sobre o sistema elétrico é cada vez maior e o modelo que ainda hoje predomina, baseado em grandes centros produtores e longas linhas de transporte e distribuição, mostra-se cada vez mais insuficiente. A vulnerabilidade está na estrutura.
É precisamente por isso que o autoconsumo solar tem vindo a ganhar centralidade no debate sobre resiliência energética. A possibilidade de produzir energia no próprio local de consumo, seja numa habitação, num edifício público ou num armazém industrial, não é apenas um trunfo ambiental, é uma resposta económica e estratégica à insegurança do sistema.
Ao descentralizar a produção, alivia-se a pressão sobre a rede, reduzem-se as perdas e criam-se condições para um sistema mais participativo e adaptável. A combinação de produção solar localizada e sistemas de baterias pode trazer uma independência da rede de até 70% o que combinado com um sistema de backup interno permite a uma casa manter serviços mínimos de eletricidade mesmo num cenário de apagão geral. Estes mesmo sistemas de armazenamento podem também ser usados para dar resposta a volatilidades na rede permitindo reequilibrar o desequilíbrio do peso maior das renováveis centralizadas no mix energético português. Mais do que uma alternativa, a energia solar distribuída é uma necessidade.
Contudo, apesar do potencial evidente, apenas 9% das casas portuguesas têm soluções de autoconsumo solar e poucas têm soluções de armazenamento ao dia de hoje.
Persistem entraves como a falta de literacia energética e a hesitação política em manter o descentralizado na agenda. Um exemplo claro disso é a subida de IVA de 6% para 23% na compra de uma instalação solar previsto para junho deste ano bem como a falta de apoios às baterias residenciais. Também a nível de serviços à rede elétrica, os programas para fornecer capacidade e resposta através de baterias descentralizadas, sejam estas residenciais ou mesmo diretamente de veículos elétricos estacionados em casa, são ainda teoria em Portugal quando podem ser uma ferramenta importante para uma gestão eficiente da rede e dos recursos do país.
O futuro energético é feito de uma combinação de produção centralizada e descentralizada, possibilitada por sistemas híbridos, interligados e inteligentes.
Neste Dia Mundial da Energia, somos desafiados a olhar para além das soluções convencionais e a reconhecer o potencial dos recursos que já estão ao nosso alcance.
É tempo de tratar o sol e o armazenamento como parte da nossa infraestrutura estratégica, e de olhar para os telhados como ativos essenciais na transição energética. Porque a melhor forma de evitar o próximo apagão pode, afinal, estar mesmo por cima das nossas cabeças.