Plano Estratégico da PAC: “Atrasos seriam altamente gravosos”

“Será a nova PAC (Política Agrícola Comum) capaz de assegurar um rendimento justo aos agricultores? Como é que poderá aumentar a competitividade? Que caminho há na luta contra as alterações climáticas e a proteção ambiental? Estas foram algumas das questões levantadas no webinar da série “Ajudar a não parar”, promovido, recentemente, pela Abreu Advogados.

José Diogo Albuquerque, CEO do Agroportal, começou por enfatizar o facto da PAC ser uma “almofada de apoio” para a agricultura e uma “caixa de ferramentas” importante: “Às vezes, as pessoas não têm noção disso; tudo o que façamos de decisões nacionais de PAC serão determinantes para o desenvolvimento económico das explorações agrícolas”. O também ex-secretário de Estado da Agricultura não deixou de salientar os desafios que esta nova reforma vai trazer, nomeadamente uma “margem maior” para os países delinearem o que querem. A isto, acresce um desafio temporal: “Uma coisa é a forma como os apoios vêm, outra coisa é ter os apoios a tempo e horas”.

Mas o que é que os agricultores e empresas portuguesas podem esperar da nova PAC? De acordo com José Diogo Albuquerque, a PAC assenta em pagamentos diretos aos agricultores e numa política de desenvolvimento rural. E nesta nova reforma, os agricultores vão contar com a mesma parte comunitária: “O próximo quadro vai ter mais ou menos o mesmo montante, o que é positivo em termos de estabilidade: por ano, são 1,2 mil milhões de euros”. No que diz respeito à componente nacional, o ex-secretário de Estado da Agricultura diz que depende de ano para ano: “Não há um orçamento definido como é o orçamento comunitário. E houve um decréscimo nos últimos cinco anos da componente nacional”. Nesta nova PAC, há uma maior flexibilidade para os Estados-membros decidirem: “Têm de apresentar à Comissão Europeia um plano que, antigamente, só se fazia para o desenvolvimento rural”. Neste momento, há a certeza acerca do “montante de apoios que vêm por parte dos apoios comunitários”, mas existe a “incerteza em relação ao que vai ser decidido a nível nacional”.

Na sua intervenção, José Diogo Albuquerque chamou a atenção para a importância de se separar o que está a ser aprovado neste momento, onde Portugal preside ao Conselho da União Europeia, e aquilo que vai ser a decisão nacional. Relativamente ao que vem de Bruxelas, o CEO do Agroportal destacou a certeza de que se vai manter o “regime de pagamento base”: “Pode haver a decisão, em Portugal, de fazer com que o pagamento seja por hectare igual em todos os agricultores”. Uma outra alteração prende-se com o facto de, neste momento, os agricultores que receberam o apoio terem de respeitar certas regras de condicionalidade. A partir de agora, “os países vão ter que criar ajudas aos agricultores em função de critérios ambientais”, isto é, as práticas sustentáveis levadas a cabo na atividade: “Isto pode, ou não, dar azo a uma grande criatividade. Tudo vai depender de quem desenha o programa”.

Já sobre a Política de desenvolvimento rural, há menos alterações: “O programa de desenvolvimento rural pode ser feito de forma parecida àquela que existe atualmente”. Ainda assim, José Diogo Albuquerque atenta na “transferência de dinheiros” dos pagamentos diretos para a política de desenvolvimento rural. Nesta matéria, o ex-secretário de Estado da Agricultura chama a atenção para a necessidade de Portugal “investir na modernização das suas explorações, sendo essa uma ferramenta para maior competitividade”. Uma preocupação está também na “burocracia” envolvida: “Seria desejável que já se soubesse que tipo de medidas é que o Governo português está a pensar aplicar para os agricultores e, assim, lançar uma discussão nacional que ainda não existe”, atenta.

[blockquote style=”2″]Tudo tem de ter um critério para que as ajudas sejam simples e transversais[/blockquote]

No estabelecimento do Plano Estratégico para a PAC (PEPAC), José Diogo Albuquerque defende, primeiramente, a necessidade de se ter um “objetivo económico”, constatando que “não há noção de que que o setor agrícola tem um défice da balança comercial”, onde “importa mais em valor” do que aquilo que exporta. “O setor agrícola tem que conseguir converter para cada vez mais expirar riqueza, algo que se procura sempre numa atividade económica”, destaca, atentando que toda a atividade agrícola tem um “impacto muito importante para a natureza e país”. Assim, se houver um “objetivo económico de melhorar a balança comercial” e de se encarar a agricultura como “atividade produtiva”, o CEO do Agroportal não tem dúvidas de que haverá o “próprio interesse dos agricultores” para que a atividade seja feita com maior respeito ambiental: “Temos que conseguir que a nossa agricultura consiga criar e gerar mais riqueza e valor”, vinca.

Um segundo ponto assenta na componente de apoio ao investimento nas explorações fortes e robustas, salvaguardando que há um “apoio à modernização das explorações”. E aqui, no PEPAC, esse apoio vai ter que estar ligado à inovação: “Nos apoios que os agricultores recebem, é importante serem premiados se fizerem investimentos na inovação”. Para o ex-secretário de Estado da Agricultura, a inovação vai ser mesmo a “resposta para as necessidades de se ter mais alimentos no futuro” e, ao mesmo tempo, “tentar ir no caminho dos objetivos do Green Deal”.  Também o apoio ao investimento do regadio deve ser central: “Ainda temos muito para fazer e temos que aproveitar os fundos quer da agricultura, quer dos fundos estruturais”, defende.

O que não pode faltar no PEPAC é ainda o “pagamento base aos agricultores” que, segundo o responsável, é já alvo de uma convergência: “Não deve levar a distúrbios. O nível de convergência deve ter uma razoabilidade em termos dos impactos que isso possa vir a causar”. A isto, acresce também a importância da “razoabilidade” no tipo de medidas que forem criadas para o ambiente: “Tudo tem de ter um critério para que as ajudas sejam simples e transversais”, determina.

Voltando ao “desafio temporal”, José Diogo Albuquerque reforçou a importância das medidas serem conhecidas a tempo e horas, até porque, em fevereiro de 2023, a agricultura tem que ter o sistema pronto: “Os agricultores adaptam-se! Estão silenciosos porque estão à espera do que aí vem para depois saber o que vai acontecer. Atrasos seriam altamente gravosos”.

Já no que diz respeito à modernização da atividade agrícola, o ex-secretário de Estado da Agricultura não tem dúvidas de que há um “desconhecimento perigoso e muito grande” daquilo que se faz no setor e das suas práticas competitivas: “O setor modernizou-se muito mais do que aquilo que as pessoas pensam e consegue produzir, respeitando o ambiente”. Aquilo que o setor deve fazer é transmitir, através dos meios de comunicação, aquilo que faz, inclusive uma “imagem” e um “posicionamento” mais positivos.

Por fim, quanto à melhoria nas zonas rurais, há uma oportunidade que são os “fundos estruturais” e o “Plano de Recuperação e Resiliência”, diz, defendendo a necessidade de ser um “plano ambicioso” para que se consiga ter “fundos fora da agricultura” e, assim, investir nas zonas rurais: “Este quadro teve um mérito que foi conseguir que se investisse muito no que fosse agricultura através do Portugal 2020 e não do programa de desenvolvimento rural”, remata.