Portugal dispõe de um sistema que ajuda a aumentar o conhecimento científico sobre espécies em mar profundo

Chama-se HiperSea: é um projeto 100% nacional, tecnológico e que representa um forte contributo para a investigação dos oceanos. Aumentar o conhecimento científico sobre as espécies de profundidade e, ao mesmo tempo, colocar Portugal na vanguarda de estudos a nível mundial, é o grande obejtivo deste projeto. A Ambiente Magazine foi ao encontro de Cláudia Matos Pinheiro, presidente do Conselho de Administração da A. Silva Matos Metalomecânica, e de Antonina dos Santos, Bióloga Marinha no IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera, que nos falam dos contributos deste projeto para a comunidade científica.

“O projeto desenvolveu uma infraestrutura móvel hiperbárica que permite a recolha de animais vivos, habitantes do mar profundo, a sua transferência para uma outra câmara hiperbárica, à superfície, que permite a sua sobrevivência, em condições idênticas às do seu habitat natural, manutenção e reprodução em cativeiro”, explicam as investigadoras, acrescentando que o conceito surgiu, assim, da necessidade de “estudar melhor os seres vivos de profundidade, para uma maior conservação dos ecossistemas”, mas também para que “o eventual uso dos recursos vivos do mar profundo se faça de uma forma sustentável”. O objetivo prendeu-se, portanto, em criar um sistema que permitisse “recolher animais vivos do mar profundo”, mantendo todas as “condições ambientais vitais”, como “pressão, temperatura e luminosidade”, transportá-los para a superfície e transferi-los para uma câmara hiperbárica, que funciona como um “aquário”, de modo a aprofundar o conhecimento sobre a biologia destas espécies de profundidade. Para além de criar o sistema, o objetivo centrou-se em “testá-lo em ambiente real, ao largo da costa portuguesa”, destacam.

Do ponto de vista do conhecimento científico, o projeto HiperSea é muito importante, especialmente tendo em conta os “testes de mar realizados” que permitiram validar ou corrigir o trabalho realizado e o equipamento tecnológico desenvolvido: “Estamos agora em condições de recolher espécies de profundidade e mantê-las em cativeiro, com todas as condições”, indicam as investigadoras. Esta situação permite “aprofundar bastante o conhecimento sobre as condições de manutenção das espécies”, mas também sobre “a sua reprodução em cativeiro e sobre as suas taxas vitais em relação aos fatores ambientais”, que são essenciais para o “desenvolvimento de modelos de conservação e exploração sustentável dos ecossistemas marinhos”, acrescentam.

Questionadas sobre o tipo de espécies que são recolhidas, Cláudia Matos Pinheiro e Antonina dos Santos explicam que o equipamento foi desenvolvido para recolher “camarões e espécies mesopelágicas”, sendo que, estas últimas, são as que vivem imediatamente “abaixo da zona eufótica” dos oceanos, “entre cerca dos 200 e os 1000m de profundidade, sendo considerada a zona mais rica dos oceanos em termos de biomassa”. De acordo com as responsáveis, as espécies de profundidade têm vindo a ser “objeto de um interesse acentuado”, seja por “questões de alimentação (exploração de novos recursos de pesca)”, como também pelo “potencial de utilização para a indústria farmacêutica”. O aumento do conhecimento sobre a biologia das espécies que o HiperSea pode promover vai permitir uma “exploração sustentável dos recursos biológicos de profundidade”, afincam.

Cláudia Matos Pinheiro e Antonina dos Santos

No que concerne a riscos associados, as investigadoras garantem que o HiperSea cumpriu todos os objetivos a que se propunha: “A investigação científica realiza-se de acordo com o método científico, cujas regras asseguram que todo o trabalho e desenvolvimento científico seja fidedigno. E as regras de trabalho em segurança foram seguidas por todas as instituições, de acordo com o trabalho que foi sendo realizado”.

Depois de testado o projeto, nos canhões de Lisboa e Setúbal, em profundidades que variaram entre os 40 e os cerca de mil metros, sendo os crustáceos de profundidade, as espécies analisadas, o balanço é extremamente positivo: “Todo o sistema funcionou na perfeição, mantendo a pressão e outros parâmetros ambientais dentro das câmaras hiperbáricas. Também conseguimos, com sucesso, fazer a transferência destes animais, crustáceos, entre as câmaras hiperbáricas – a móvel e a aquário”. Esta campanha de testes permitiu, assim, “avaliar o trabalho e o desenvolvimento tecnológico realizado”, com resultados bastante positivos, e “planear os próximos desenvolvimentos que se podem realizar”. A expectativa é de que “neste segundo semestre possamos avançar com um novo desenvolvimento deste projeto, que possibilite maior conhecimento”, afirmam as investigadoras.

Estando, neste momento, na sua “fase final”, com alcance de todos os objetivos e cujos testes de mar realizados também foram um sucesso, o desejo, de toda a equipa envolvente no HiperSea, é que novos desenvolvimentos sejam equacionados no futuro próximo.

Com um investimento de 2,7 milhões de euros, o projeto é liderado pela A. Silva Matos Metalomecânica, que conta com os parceiros ISEP – Instituto Superior de Engenharia do Porto, INESC TEC – Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência, CIIMAR – Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental e IPMA.