Portugal tem uma oportunidade única de aproveitar o PRR para reduzir a sua pegada ecológica

Se cada pessoa no Planeta vivesse como uma pessoa média portuguesa, a humanidade exigiria mais de dois planetas para sustentar as suas necessidades de recursos. Tal implicaria que a área produtiva disponível para regenerar recursos e absorver resíduos a nível mundial esgotar-se-ia no dia 13 de maio, treze dias mais cedo do que em 2020, cuja data foi a 25 de maio. A partir daí seria necessário começar a usar recursos naturais que só deveriam ser utilizados a partir de 1 de janeiro de 2022. Esta conclusão é da ZERO (Associação Sistema Terrestre Sustentável) que, em parceria com a Global Footprint Network, partilhou, em comunicado, os dados mias atuais relativos à pegada ecológica de Portugal.

Segundo a associação ambiental, os cálculos têm em conta dados de vários anos, pelo que não espelham de forma clara as implicações da pandemia na pegada ecológica de Portugal. Ainda assim, “na ausência de alterações estruturais, não é expectável que a pandemia venha a ter um reflexo duradouro na pegada ecológica do nosso país”, lê-se no comunicado.

A ZERO acredita que Portugal tem uma oportunidade única de aproveitar o Programa de Recuperação e Resiliência (PRR), a par com fundos de apoio europeus, para implementar transformações que possam contribuir para o bem-estar, respeitando os limites do planeta. Tal é possível com a “adoção de novas políticas públicas, e novas práticas por parte de cada um de nós”, no sentido de “reduzir o impacto da forma como produzimos e consumimos”, lê-se no mesmo comunicado.

Como reduzir a dívida ambiental Portuguesa (e de todos nós)

O consumo de alimentos (32% da pegada global do país) e a mobilidade (18%) encontram-se entre as atividades humanas diárias que mais contribuem para a Pegada Ecológica de Portugal e constituem assim pontos críticos para intervenções de mitigação da Pegada.

Neste contexto, a ZERO sugere em termos de políticas:

  • Apostar numa agricultura de múltiplos outputs e promotora da soberania alimentar (produção de alimentos de qualidade; preservação dos solos, redução da poluição e do uso de água; valorização de serviços de ecossistema) reduzindo progressivamente até à completa eliminação dos apoios a práticas agrícolas assentes num único output – produção.
  • Aproveitar o potencial de redução de deslocações e viagens (em particular as feitos por avião) através do teletrabalho e da realização de eventos habitualmente presenciais, em formato virtual. Para muitas empresas, entidades, trabalhadores o as reuniões virtuais e do teletrabalho são já uma realidade, o que pode ter reflexos positivos no futuro, em termos de ganhos ambientais, sociais e económicos.
  • Investir de forma decisiva na criação de infraestrutura que permita uma muito mais significativa utilização de modos suaves de transporte, em particular incentivando o uso da bicicleta e eventualmente combinados com o transporte público, no sentido de evitar a degradação da qualidade do ar nas cidades para os níveis antes da crise.
  • Regulamentar para que os produtos colocados no mercado sejam sustentáveis. Por exemplo, implementar normas de durabilidade, garantias do direito a reparar e atualizar, de reutilização e reciclabilidade. Estas medidas permitirão criar novas áreas de trabalho qualificado e promover uma redução da pegada dos produtos.

Neste contexto, a ZERO sugere em termos de práticas individuais:

  • Reduzir a presença de proteína animal na alimentação: os dados para Portugal indicam que cada português consome cerca de três vezes a proteína animal que é preconizado na roda dos alimentos, metade dos vegetais, um quarto das leguminosas e dois terços das frutas. Aproximar a nossa dieta à roda dos alimentos reduz, de forma significativa, o impacto ambiental associado à alimentação e é mais saudável.
  • Movimentarmo-nos de forma sustentável: privilegiar os transportes coletivos, andar de bicicleta, a pé, e claro, reduzir ou eliminar mesmo as viagens de avião substituindo nomeadamente as reuniões por videoconferência.
  • Consumir de forma mais circular: é fundamental mudar o paradigma de “usar e deitar fora”, muito assente na reciclagem, incineração e deposição em aterro, para um paradigma de “ter menos, mas de melhor qualidade”, com um forte enfoque na redução, reutilização, troca, compra em segunda mão e reparação.