Portugal vota esta semana o destino do herbicida glifosato

É esta quinta, 9 de novembro, a votação em Bruxelas onde deverá ficar decidido o futuro do glifosato – o herbicida mais usado em Portugal. A Comissão Europeia pretende a renovação da licença, que expira já a 15 de dezembro, mas não tem conseguido apoio suficiente por parte dos Estados Membros. O Ministério da Agricultura português (que se absteve na reunião anterior) é chamado a defender os interesses do país e juntar-se aos que exigem o fim do glifosato – a única opção defensável, considerando as evidências já acumuladas a nível nacional e não só, refere em comunicado a Plataforma Transgénicos Fora.

De acordo com os dados disponíveis, Portugal é o território europeu mais poluído por glifosato. Um estudo científico publicado há menos de um mês avaliou os resíduos de glifosato (que persiste no solo, ao contrário do que a publicidade afirma) em terrenos agrícolas de 11 Estados Membros representativos e verificou que 53% das amostras de solo portuguesas continham este herbicida – colocando o nosso país no topo destacado da tabela (a França, o 2º país mais contaminado, ficou-se por 30% de amostras positivas). Além disso, Portugal tem também a maior quantidade de glifosato no solo: 11.4 vezes mais do que a pior amostra da Itália, por exemplo.

Estes dados estão alinhados com os valores conhecidos de contaminação humana. Em 2016 o levantamento realizado pela Plataforma Transgénicos Fora evidenciou níveis inesperadamente elevados deste herbicida na urina de todos os voluntários testados. Os portugueses apresentaram, em média, 20 vezes mais glifosato do que os seus homólogos alemães. Comparando com o valor mais elevado obtido em 182 análises de diversos países europeus, a pior amostra portuguesa está 18 vezes mais contaminada – e, se estivesse em água de consumo, contaminaria essa água 320 vezes acima do limite legal.

“Enquanto o Ministério da Agricultura não souber explicar como é que Portugal ficou tão contaminado por glifosato, e não implementar medidas que reduzam drasticamente este problema, é impensável permitir que a utilização generalizada na agricultura, nas ruas e até para fins domésticos possa continuar. Não aceitamos que se subestime a toxicidade do glifosato pois, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o glifosato causa cancro nos animais de laboratório em que foi testado”, refere a plataforma, na mesma nota.

A bióloga Margarida Silva, da Plataforma Transgénicos Fora, lembra que “o glifosato é tão incontornável como antigamente o DDT, que era usado por tudo e por nada. Aprendemos a viver sem o DDT (exceto em casos muito pontuais) quando se percebeu quais os seus efeitos na saúde, e podemos fazer o mesmo com o glifosato. A indústria quer convencer-nos que a agricultura sem glifosato está condenada, mas a verdade é que com glifosato o que está condenado é a nossa saúde.”

Note-se que o glifosato não serve sequer para a conservação do solo, como propõem os defensores da “mobilização mínima” e “não mobilização”, indica o comunicado, que adianta que é já sabido que o glifosato é tóxico para múltiplos organismos do solo, contribuindo assim para a redução da sua fertilidade. “Infelizmente práticas destas, que envolvem vastas aplicações de glifosato (incluindo na chamada “produção integrada”), são em Portugal consideradas medidas agro-ambientais e recebem os respetivos subsídios nacionais e comunitários”, acusa a Plataforma.

Já há países, e até empresas, a fazer a transição para a época pós-glifosato. O governo francês, por exemplo, já anunciou uma linha de financiamento de cinco mil milhões de euros em cinco anos para apoiar o período de mudança.

A coordenadora da campanha Autarquias Sem Glifosato/ Herbicidas, Alexandra Azevedo, conclui que “ao contrário do propagandeado o glifosato é perigoso e o alerta público para os seus riscos está a aumentar no nosso país. A sondagem do passado mês de outubro mostra que 77% dos portugueses pretendem a proibição imediata deste herbicida e apenas 8% preferem manter o seu uso. A nível comunitário mais de um milhão de pessoas aderiu a uma Iniciativa de Cidadania Europeia para acabar com o glifosato. Seja qual for a decisão europeia, o nosso governo não tem legitimidade política para manter o glifosato em circulação.”