Dia Internacional da Reciclagem: “Falhanço total” de Portugal nas metas definidas

Para assinalar o Dia Internacional da Reciclagem, instituído pela UNESCO, a Associação ZERO apresenta o desempenho de Portugal relativamente aos níveis de reciclagem atingidos em diversos fluxos de resíduos. A organização fala num “falhanço total” ao atingir as metas definidas.

No Barómetro da Reciclagem de 2021, mostra-se que, naquele ano, Portugal continental registou uma taxa de reciclagem de resíduos urbanos de 21%. Para este valor contribuíram 14% com origem na reciclagem multimaterial (plástico, papel, vidro e metais) e 7% com origem na reciclagem de biorresíduos (compostagem/digestão anaeróbia).

Esta taxa de reciclagem, revela a ZERO, em comunicado, é equivalente à registada em 2019. “Ou seja, Portugal voltou aos níveis anteriores à pandemia, o que equivale a dizer que não houve qualquer progressão neste setor e que o país não vai seguramente atingir a meta de 55% de reciclagem estabelecida para 2025”, pode ler-se no documento.

No comunicado, a ZERO aponta “várias razões objetivas” para a estagnação da taxa de reciclagem apresentada, sendo uma delas o investimento na recolha porta-a-porta, ao invés da “insistência na recolha seletiva efetuada através de ecopontos”.

Quanto ao tratamento de biorresíduos, a associação ambientalista diz que é fraco. Estes “representam cerca de 40% do total dos resíduos produzidos nas nossas casas e no comércio e serviços (cerca de 1,9 milhões de toneladas), o que significa que o tratamento dos biorresíduos foi efetuado apenas para 19% do potencial (cerca de 353 mil toneladas)”, escreve a ZERO.

Ainda relativamente aos biorresíduos, a associação nota uma “quase inexistência de recolha seletiva”, ao verificar que a recolha é de apenas 8%, ou, de outro modo, cerca de 147 mil toneladas.

“Centenas de milhões de euros do último quadro comunitário de apoio” estão a ser desperdiçadas”

O subfinanciamento do sistema de recolha seletiva pelas entidades gestoras de embalagens é, para a ZERO, outro problema que resulta na baixa taxa de reciclagem. A associação refere que os prejuízos para as autarquias, neste âmbito, anda na ordem dos 35 milhões de euros anuais.

Os produtores estão a colocar mais embalagens no mercado, e prova disso é a diferença que a ZERO apresenta entre as embalagens de facto declaradas (16%) e aquelas que são identificadas nas caracterizações de resíduos urbanos (27%). A associação fala numa “subdeclaração fraudulenta”.

Já a taxa de gestão de resíduos é “muito reduzida”, o que, segundo a ZERO, provoca um desincentivo à reciclagem, ficando a população mais propensa a enviar materiais recicláveis para aterro ou para incineração.

A associação ambientalista considera ainda que as “centenas de milhões de euros do último quadro comunitário de apoio” estão a ser desperdiçadas, “muitas vezes favorecendo investimentos que só vão agravar as dificuldades de cumprimento das metas”.

No comunicado, a ZERO apresenta também os dados referentes à gestão de resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos (REEE) que, em 2021, apenas foram recolhidos em 14,5%, sendo que as licenças emitidas pelo Estado obrigavam a recolher 65%.

As razões deste “colapso”, para a ZERO, devem-se, nomeadamente a um “subfinanciamento pelos produtores de Equipamentos Elétricos e Eletrónicos do sistema de gestão dos REEE, num défice anual da ordem dos 50 milhões de euros”.

A penalização através da taxa de gestão de resíduos, no incumprimento das metas de recolha estabelecidas às entidades gestoras dos REEE, é insuficiente, de acordo com a associação ambientalista, permitindo o seu baixo valor incentivar as entidades gestoras ao “imobilismo”.

“Falta de fiscalização pelas autoridades ambientalistas da gestão ilegal de REEE”

A ZERO sugere ainda que o setor do comércio/distribuição não está a cumprir a obrigação de recolher equipamentos velhos na venda de novos, “o que tem como principal resultado o desvio dos frigoríficos para destinos ilegais”, diz a associação.

Por outro lado, existe uma “falta de fiscalização pelas autoridades ambientalistas da gestão ilegal de REEE”.

A ZERO faz também nota, no comunicado, dos resíduos de embalagens de produtos fitofarmacêuticos, sementes e biocidas. Considera que existem deficiências que se perpetuam ao longo dos anos”, que colocam em risco a saúde e o ambiente.

A recolha deste tipo de resíduos era, em 2021, de 45,9%, quando a meta da entidade gestora era de 60%. “Mais de 50% destas embalagens, cuja maior parte contém substâncias perigosas, cerca de 604 toneladas, não foram recolhidas e nem devidamente tratadas, gerando riscos para a saúde e o ambiente”, alerta a ZERO.

“Esta situação é agravada pelo facto desta entidade gestora, desde o início de 2022, ter ficado também responsável pela recolha das embalagens de biocidas (produtos tóxicos utilizados no controlo de animais prejudiciais e na proteção da madeira), cuja retoma de embalagens foi somente de 2%”, acrescenta a associação.

A ZERO defende que o setor precisa “há muito” da introdução de um sistema de depósito/retorno, para que, afirma a associação, os consumidores destes produtos tóxicos tenham um incentivo económico para devolverem as embalagens, “sob pena de marcarmos passo no cumprimento das metas”.

Os dados disponíveis no Barómetro da Reciclagem de 2021, no que toca às pilhas e acumuladores portáteis, reportam a 2020, ano em que se atingiu uma taxa de recolha de apenas 15,6%, “apesar de este sistema já existir há vários anos e quando a meta para esse ano era de 45%”, nota a ZERO.

Neste contexto, a associação ambientalista considera que a aplicação de um sistema de depósito/retorno se afigura como “a forma mais expedita” para aumentar as quantidades recolhidas.

De resto, essa é a conclusão final que a Associação faz da análise dos dados no Barómetro. A ZERO afirma que as taxas de recolha apresentadas “não deixam margem para dúvidas” de que é preciso aplicar sistemas de depósito/retorno a estes fluxos de resíduos. “Tal como foi aprovado pela Assembleia da República para as embalagens em plástico, metal e vidro para as bebidas”, explica.

Esta é uma “ferramenta essencial para a participação dos cidadãos na reciclagem”, termina a associação.