RESIALENTEJO: “Nem tudo depende só dos SGRU: é essencial que o Estado também contribua para a estabilidade no setor”

Em 2021, os municípios da RESIALENTEJO conseguiram ultrapassar de forma significativa a meta dos 43kg/habitante por ano na recolha seletiva, atingindo os 54,1 kg. Este crescimento resulta de um esforço conjunto e da aposta na recolha porta a porta no setor doméstico e não doméstico, no reforço da rede de ecopontos e na sensibilização ambiental, num investimento a rondar os 3 milhões de euros. Quem o diz é Marcelo Guerreiro, presidente da RESIALENTEJO, que numa entrevista à Ambiente Magazine fala do papel da Entidade na promoção e sensibilização para aumentar a taxa de reciclabilidade na região.

Questionado pelos desafios que o Alentejo enfrenta, Marcelo Guerreiro considera que são os mesmos do país: “Temos de reforçar de forma significativa a recolha seletiva dos resíduos urbanos, alargando para outros fluxos como os biorresíduos, têxteis e volumosos, e reduzir significativamente a deposição de resíduos em aterro”. As “especificidades” do Alentejo, como a “dispersão territorial e baixa densidade populacional”, amplificam o desafio, mas caberá ao país enquanto um todo e ao Estado um “papel muito relevante” na superação destes desafios: “Não cabe apenas aos SGRUS, municípios e cidadãos a responsabilidade por atingir estas metas, é essencial que o Estado seja promotor da estabilidade e previsibilidade no setor e que incentive a existência de soluções de valorização para a fração resto dos resíduos indiferenciados e para alguns fluxos emergentes como os têxteis e volumosos. É complexo ter EVEF fiáveis quando existem dúvidas sobre os valores de contrapartida a receber e sobre quais as embalagens que são efetivamente abrangidas por esses valores de contrapartida, com um impacto relevante no equilíbrio financeiro dos SGRU”. Apesar do “investimento significativo já efetuado, tendo em conta as “novas metas do PERSU2030”, o presidente da RESIALENTEJO defende a necessidade de ser manter o investimento na “recolha seletiva”, recorrendo preferencialmente a comparticipação comunitária: “No nosso caso, vai obrigar a, entre outros investimentos, ampliar a atual triagem de resíduos de plástico/metal, projeto que já estamos a trabalhar”. Já ao nível de oportunidades, o responsável assegura que a Entidade tem aproveitado todos os financiamentos disponíveis, bem como parcerias que surgem ou são identificadas: “Agora nem tudo depende só dos SGRU, é essencial que o Estado também contribua para as soluções e para a estabilidade no setor”. Paralelamente, “é muito importante que os fundos comunitários e o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) apoiem os novos investimentos no setor”, sustenta.

A trabalhar a estreita articulação com os municípios, a RESIALENTEJO, no âmbito do PERSU2030, foi o único SGRU em que todos os municípios servidos aprovaram um Plano de Ação municipal: “Nestes planos de ação foram definidas ações a desenvolver pela RESIALENTEJO e pelos municípios, tendo tido um elevado grau de concretização”. Marcelo Guerreiro refere que esta é uma “fórmula” que será novamente aplicada, sofrendo “algumas melhorias, para a elaboração dos planos de ação municipais e intermunicipais previstos no regime geral de gestão de resíduos e PERSU2030”.

Ao nível de iniciativas, o responsável destaca as 13 candidaturas apresentadas a fundos nacionais e comunitários, num total de investimento a rondar os 7,7 milhões de euros: “A implementação da recolha porta a porta em 6 concelhos, o inicio da recolha de biorresíduos, a ampliação da atual Central de Tratamento Mecânico e Biológico de forma a que possa ter capacidade para tratar biorresíduos recolhidos seletivamente, são alguns dos projetos que desenvolvemos em parceria com as câmaras municipais”, exemplifica.

Apesar de se registarem “melhorias significativas nas quantidades enviadas para reciclagem e na diminuição da deposição em aterro”, o presidente da RESIALENTEJO acredita ainda existe um “grande caminho a percorrer”, nomeadamente, quando “temos de consolidar a recolha seletiva de embalagens e iniciar a recolha seletiva de outros fluxos, como os biorresíduos ou têxteis”.

É precisamente nos biorresíduos que a região tem dado os primeiros passos, registando-se “resultados muito animadores”, como por exemplo, “aumentos significativos na quantidade de biorresíduos” que recebem e tratam: “Em 2021 recebemos e valorizamos cerca de 750 toneladas de biorresíduos, e perspetivamos que em 2022 atinjamos as 1290”. Estes números também têm reflexo na “quantidade de composto escoado”, onde acreditam que “em 2022 iremos atingir as 2000 toneladas. O nosso objetivo é produzir 4000 toneladas de composto por ano”, sublinha. Em matéria de biorresíduos, a RESIALENTEJO tem sensibilizado os municípios para a “importância de se implementar circuitos de recolha seletiva” destes resíduos, com particular enfoque nos “resíduos verdes”. E no sentido de “rentabilizar os transportes destes resíduos”, a entidade tem promovido investimentos em “biotrituradores móveis”, indica, acrescentando que, este ano, está previsto avançar com “ações de sensibilização para a compostagem doméstica e comunitária: este é um trabalho conjunto em que os municípios e as freguesias têm um papel muito importante”.

[blockquote style=”1″]Como mudar o “mindset” da população para a causa da reciclagem?[/blockquote]

A mudança de paradigma, para Marcelo Guerreiro, faz-se através da “implementação de ações de sensibilização de forma continuada”, alargando a “novos públicos”, como os “centros de dia”, tentando “abordagens inovadores” capazes de cativar a atenção dos cidadãos. Outra abordagem é a “introdução do sistema de pagamento consoante a produção, de forma a discriminar positivamente quem separa”, e nesse aspeto já existem municípios que estão a fazer esse caminho, como “Mértola, Ourique e Serpa”, afirma. O desafio da reciclagem é algo transversal: “A reciclagem beneficia todos e é fundamental para as nossas terras”, afinca. Sobre o papel dos decisores políticos, o presidente da RESIALENTEJO reconhece e valoriza aquilo que tem sido feito, mas considera que se pode e deve fazer muito mais: “Não apenas para cumprir as metas a que o país está obrigado, mas para gerar melhores condições de sustentabilidade, que se traduzem em melhor ambiente, qualidade de vida e resiliência para enfrentar os imprevistos e as novas realidades. Somos todos parte de um todo e os decisores políticos têm a obrigação de mobilizar as comunidades”.

Apesar de ser difícil perspetivar os próximos 10 anos, Marcelo Guerreiro acredita que manter-se-á a tendência de crescimento da taxa de reciclagem e da diminuição significativa da deposição em aterro: “Há muitos fatores que não controlamos, mas o que depende da nossa vontade individual e comunitária está ao nosso alcance. É este o nosso foco presente e futuro”.

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