SDR Portugal: “Os impactos de não fazer ou fazer tarde são grandes e não há razão para que continuem a agravar-se”

Pela primeira vez, a indústria e o retalho unem-se com a missão de fazer cumprir o que acreditam ser um desígnio nacional: “aumentar o número de embalagens recolhidas e recicladas, reduzindo o seu impacto no ambiente e contribuindo para o cumprimento das metas com que Portugal está comprometido, enquanto criam condições para estimular a inovação em tecnologia e a competitividade das empresas portuguesas, dinamizando a economia nacional”. Constituído pelos principais Embaladores (Produtores e Distribuidores) e com abrangência nacional, o SDR Portugal é uma das entidades candidatas à gestão do futuro Sistema de Depósito e Reembolso (SDR) de embalagens de bebidas de uso único em Portugal.

Em entrevista à Ambiente Magazine, Miguel Aranda da Silva, diretor-geral do SDR Portugal, revela que o SDR preconizado pretende ser um “sistema complementar” ao atualmente existente, o SIGRE: “Um Sistema de Depósito e Reembolso integrado e integrador, que reúna todos os agentes da cadeia de valor e que reconheça as mais-valias que cada um representa para o cumprimento do objetivo comum de aumentar a capacidade e a eficiência do sistema para melhorar os resultados obtidos. Uma solução que priorize a eficiência dos processos e dos recursos, apostando no valor que cada agente pode aportar à solução necessária e que também tem na sua génese a Responsabilidade Alargada do Produtor, ou seja, o compromisso que as associadas do SDR Portugal, assumem diariamente nas suas atividades”. Ao mesmo tempo, pretende-se um equipamento que, “assegurando todos os aspetos formais do setor”, coloque o cidadão ou consumidor – “a sua motivação, a sua sensibilização, a sua conveniência e proximidade” – no centro do processo como “agente determinante” para o sucesso que se perspetiva. Com uma abrangência nacional, espera-se, da mesma forma, um sistema capaz de “gerir um sistema único, eficiente, que diminua a complexidade do sistema de registo das embalagens abrangidas proporcionando clareza para os consumidores, e que contribua para taxas de reciclagem mais elevadas, de forma a atingir as metas europeias”.

Constituído por empresas da indústria das bebidas e dos retalhistas que operam em Portugal, como a Coca-Cola, Central de Cervejas, Sumol+Compal, Super Bock Group e Unilever (que constituem a Associação Circular Drinks e que representam 90% de quota da Indústria de Bebidas Refrescantes) e as insígnias Auchan, Intermarché, Lidl, Mercadona, Pingo Doce e MC (que constituem a Associação SDRetalhistas, representando 80% do mercado total português), o SDR Portugal tem vindo a trabalhar com os mais diversos stakeholders do setor dos resíduos nos quais se incluem o Governo e a Administração Pública, Entidades Gestoras, Municípios, Organizações Não Governamentais de Ambiente (ONGA), entre outros: “A amplitude, abrangência e conhecimento da visão gerada por estas sessões de trabalho são, também, o garante da robustez da solução que preconizamos”, afirma.

Apesar de constituído formalmente em setembro de 2021, o SDR Portugal trabalha desde 2019 no “estudo, investigação, desenvolvimento e avaliação” da solução que “hoje analisamos e que acreditamos” ser o modelo mais eficaz e sustentável para o futuro SDR em Portugal. No que diz respeito à implementação de deste sistema, Miguel Aranda da Silva lembra que, nos últimos quase três anos o conjunto de entidades associados do SDR Portugal já “investiram mais de um milhão de euros no desenvolvimento técnico da arquitetura do Sistema que defendemos”, e para o qual “contámos com o contributo de consultores especialistas e de renome internacional com vasta experiência nesta matéria e que nos apoiaram também no estudo de outros sistemas já em funcionamento”.

Assim sendo, na origem desta candidatura está o facto de o SDR Portugal reunir nos seus acionistas “90% de quota da Indústria de Bebidas Refrescantes e 80% do mercado total do retalho português: uma expressão muito significativa dos agentes económicos que produzem, distribuem e vendem embalagens de bebidas de uso único até 3 litros em Portugal”. Estas são empresas responsáveis que assumiram como compromisso no âmbito das suas estratégias de sustentabilidade e no âmbito da Responsabilidade Alargada do Produtor (RAP), criar um “sistema eficiente e eficaz”, garante da responsabilidade ambiental que todas preconizam: “Estes são os agentes que melhores condições reúnem para desenvolver a solução que trará os resultados que o país precisa. Possuem o conhecimento, os recursos técnicos e a capacidade para a desenvolver, acrescendo o facto de estarem próximos do consumidor-cidadão e, com isso, terem a possibilidade de usar os seus recursos próprios para sensibilizar, informar e formar no sentido de promover a mudança de comportamentos que é necessária”. Além disso, existe o “princípio de responsabilidade” sobre o qual estas entidades – “os embaladores” – sentem que devem agira na medida em que “são quem assume os custos de gestão dos resíduos de embalagem” ao abrigo do princípio da responsabilidade alargada produtor (RAP): “São os principais interessados na eficácia e eficiência da operação do SDR, uma vez que terão de enfrentar o impacto sobre as vendas dos produtos sujeitos a depósito, terão de garantir o equilíbrio financeiro do sistema através das prestações financeiras; estão obrigados ao cumprimento das metas definidas para as embalagens de bebidas em plástico; e vão suportar, direta ou indiretamente, os encargos dos novos recursos próprios da UE (Plastic Tax) indexado ao atingimento das metas europeias”.

[blockquote style=”1″]Os compromissos e as metas …  [/blockquote]

Implementar um SDR de “elevada conveniência” para o consumidor, “operacionalmente eficaz e eficiente”, que assegure “material de qualidade, robustez financeira” com vista ao “atingimento das metas de reciclagem num desafiante contexto de circularidade das embalagens de bebidas”, é o grande compromisso da SDR Portugal: “Defendemos um sistema gerido por uma entidade gestora que tenha como atividades nucleares a definição de padrões e normas operacionais e de prevenção de fraude, a implementação de sistemas e protocolos de comunicação e interação entre todos os agentes da cadeia de valor e de um processo de compensação robusto e ágil. Igualmente uma entidade gestora que garanta a fiabilidade, segurança e rastreabilidade das bases de dados e da informação nelas constantes, assim como responsável pela elaboração de cadernos de encargos para todas as fases da cadeia de valor do sistema, nomeadamente, Produção, Comercialização, Retoma, Consolidação, Contagem, Triagem e Reciclagem”.

No entender do diretor geral do SDR Portugal, o sucesso deste equipamento vai contribuir para o cumprimento das metas acima dos 90% a partir de 2029 e a taxa de incorporação de material reciclado na produção de garrafas de bebidas superior a 30% a partir de 2030: “A solução que defendemos, quando em implementação, permitirá duplicar a reciclagem de embalagens de bebidas não reutilizáveis em Portugal, o que é muito significativo para o cumprimento destas metas”. Tão importante é que este SDR vai “possibilitar uma maior qualidade do plástico reciclado o que contribuirá para uma maior reciclabilidade e, consequentemente, uma maior circularidade das matérias-primas”, provocando “maiores eficiências na produção”, mas, também, um “impacto muito mais positivo no ambiente”, acrescenta.

A implementação do SDR, de acordo com o responsável,  vai implicar um “investimento superior a 100 milhões de euros”, dos quais “70 milhões deverão ser realizados nos primeiros dois anos (prazo mínimo de implementação do sistema após a atribuição da licença ou  concessão)”, e a “criação de mais de 1.500 postos de trabalho diretos e indiretos”. Em todo o território nacional, o sistema proposto prevê implementar “3.600 máquinas de recolha, equipamento de retoma com tecnologia integrada” que permite a “aceitação de embalagens usadas”. Do universo de “90 mil pontos existentes no comércio tradicional e no canal HORECA”, o sistema proposto pretende “assegurar a recolha de embalagens em mais de um terço da totalidade”, sustenta.

[blockquote style=”1″]“… é necessário definir as regras em que o futuro sistema de depósito e reembolso funcionar”[/blockquote]

Questionado sobre os desafios de Portugal em conseguir um SDR eficiente, Miguel Aranda da Silva considera que “falta a definição sobre que SDR Portugal vai implementar”, sendo essa definição que todo o setor aguarda: “O normativo europeu está definido, assim como as metas que temos de atingir em relação às várias tipologias de resíduos, no nosso caso, as embalagens de bebidas de uso único. Agora é necessário definir as regras em que o futuro sistema de depósito e reembolso funcionará para que todos no setor possamos trabalhar no sentido de dar um melhor, mais eficaz e mais eficiente tratamento a estas embalagens e, com isso, cumprirmos os compromissos estabelecidos e melhorarmos o ambiente do país e a nível global”. No entender do SDR Portugal, a eficiência do sistema depende da sua “agilidade” e da sua “transparência”, sendo que o modelo proposto está preparado para assegurar ambos: “Temos todas as condições para criar ganhos de eficiência em toda a cadeia de valor e para sistemas de controlo de dados que permitam, de forma transparente, segura e rigorosa, conhecer o total desempenho do sistema”, sustenta.

Para o responsável, o Governo tem o papel de  “promover as condições legais e regulamentares para a adequada implementação do sistema, agindo em tempo para que a solução seja implementada em tempo útil e de forma a gerar os resultados que o país precisa, não só do ponto de vista do cumprimento das metas mas, acima de tudo, ao nível do impacto gerado no ambiente e na qualidade de vida de todos: “Os impactos de não fazer ou fazer tarde são grandes e não há razão para que continuem a agravar-se. Existe uma solução estruturada, estudada e testada que pode resolver os desafios que existem atualmente e essa solução é a do SDR Portugal”. Os consumidores nacionais estão cada vez mais atentos e despertos para a sua responsabilidade no contexto da valorização dos resíduos. “É evidente para cada um de nós que é necessária ação”. A grande questão é: “como envolver o cidadão consumidor, como fazer com que faça parte da solução e aja, colabore, para a sua realização?”. É precisamente na resposta a estas questões que a proposta do SDR Portugal se “distingue”, na medida em que possui a “proximidade, a conveniência, os recursos e a capacidade para “falar diretamente” ao cidadão-consumidor e ajudá-lo na sua jornada de mudança de comportamento”, criando condições para que, à semelhança do que já acontece noutros países, seja “seguro, acessível e apelativo” fazer parte do processo: “fazer parte do que é correto fazer”, afinca.

[blockquote style=”1″]”… o tempo não para e os prazos para que o país não entre em incumprimento estão cada vez mais curtos; 2025 é já `amanhã´”[/blockquote]

Em relação à data prevista de se conhecer a entidade que vai gerir o futuro SDR, o responsável refere que o processo já deveria estar em implementação, lembrando que, segundo a legislação vigente, o sistema de devolução e reembolso já deveria estar a operar desde o dia 1 de janeiro de 2022: “Circunstâncias várias levaram a que assim não seja, mas estamos convictos que o Governo está a trabalhar para que aconteça o mais rápido possível”. Até porque “o tempo não para e os prazos para que o país não entre em incumprimento estão cada vez mais curtos; 2025 é já ´amanhã` e, até lá, Portugal deverá conseguir incorporar, no mínimo, 25% de plástico reciclado nas garrafas de plástico PET de utilização única para bebidas com menos de 3 litros, incluindo as suas cápsulas e tampas”. A partir de 1 janeiro de 2030, este valor sobe para os “30%, aplicável a todas as garrafas de plástico de utilização única para bebidas com menos de 3 litros: “O modelo que propomos tem condições para garantir taxas de recuperação de embalagens na ordem dos 90%, a partir do quinto ano de operação, o que irá contribuir de forma muito significativa para o cumprimento destas metas”.

Finalmente, o SDR Portugal deve ser a entidade eleita porque “tem todas as condições” para apresentar a “solução mais eficiente” para o futuro sistema de depósito e reembolso em Portugal. A título de exemplo, o estudo – apresentado pela 3drivers –demonstra que o modelo proposto pelo SDR Portugal poderá “duplicar reciclagem de embalagens de bebidas não reutilizáveis em Portugal e gerar benefícios para os Municípios e para os Sistemas de Gestão de Resíduos Urbanos (SGRU) e, consequentemente, para os cidadãos”. Para ser mais preciso, Miguel Aranda da Silva atenta nos ganhos que o estudo concluiu, nomeadamente, “potenciais ganhos dos SGRU e dos Municípios, entre 9 e os 20 M€, com a redução de custos de recolha e triagem pelos resíduos de embalagens de bebidas que transitam para o SDR”; “aumentos de receitas dos SGRU (global Valores de Contrapartida) na ordem de 14,5 M€, caso o SIGRE cumpra as Metas em 2030 no que respeita aos resíduos que permanecerão no SIGRE (extra embalagens de bebidas que transitam para o SDR)”; “perdas de receitas dos SGRU na ordem dos 8,0 M€, o que representa cerca de 3% das receitas obtidas com a gestão desta tipologia de resíduos”; “redução significativa das quantidades totais de littering (30 a 40%) e redução de 70 a 90% da quantidade de embalagens de bebidas no littering”; e “redução dos custos associados à limpeza urbana que deverá ser entre 20 e 40 milhões de euros por ano”.

Além destes indicadores que evidenciam os “benefícios globais para o SIGRE”, o estudo demonstra também a “existência de benefícios” indiretos do SDR ao nível da “economia circular”, nomeadamente na “melhoria da qualidade do material recolhido, que ao ser utilizado na produção de novos produtos permite evitar a emissão anual de 109 mil toneladas CO2eq”; na “possibilidade de redução do lixo marinho em até 90%”; e na “possibilidade de obter fluxos menos contaminados de resíduos de embalagens, reduzindo a taxa de contaminantes de 18 a 26% (em Portugal verificam se valores mais baixos) para 1 a 4%”.

Em jeito de conclusão, o diretor geral do SDR Portugal parece não ter dúvidas que a implementação de sistemas de recolha inteligentes permite “aumentar a rastreabilidade dos fluxos de resíduos”, garantindo um “maior controlo de qualidade, melhor fiscalização e redução dos riscos de fraude e uma avaliação contínua”, e ao momento, “o sucesso do sistema de depósito, permitindo a antecipação e rápida correção de potenciais desvios”.