Sistema de Depósito e Reembolso a meses de arrancar: “uma mudança estrutural, que vai trazer uma nova cultura de responsabilidade partilhada”

O SDR (Sistema de Depósito e Reembolso) no nosso país entra em vigor em abril de 2026 e João Cordeiro, Administrador Executivo da SDR Portugal, esclarece alguns pontos à Ambiente Magazine.

 

Que impacto ambiental e social espera que este sistema tenha nos primeiros anos de implementação?

Nos primeiros anos, o SDR deverá gerar um impacto ambiental muito significativo, ao reduzir de forma expressiva o número de embalagens de bebidas que hoje acabam em aterro, na incineração ou dispersas no ambiente.

Em 2026, o sistema terá o seu primeiro grande marco, ao entrar em vigor a dia 10 de Abril, para iniciar a recuperação das embalagens de bebidas de uso único de plástico até 3 litros e latas de metal. A partir desse ponto, o objetivo é evoluir de forma consistente e sustentada, até atingir os 90% de recolha em 2029, em linha com as metas europeias definidas para Portugal.

Do ponto de vista social, o SDR representa uma mudança cultural: introduz um hábito simples e acessível, baseado na lógica de que cada garrafa e cada lata têm valor, e ao devolvê-las, estamos a dar-lhes uma nova vida. Esta dinâmica valoriza o comportamento individual, reforça a literacia ambiental e aproxima os consumidores do conceito de economia circular. Além disso, terá impacto positivo na criação de emprego qualificado, na modernização do setor e no surgimento de novos modelos de serviço ligados à reciclagem, logística e inovação tecnológica.

Quais têm sido os principais desafios na criação da infraestrutura nacional?

O maior desafio tem sido construir uma infraestrutura nacional totalmente nova, capaz de assegurar a recolha, o transporte, a triagem e a preparação para reciclagem de milhões de embalagens por ano. Este processo exige compatibilizar tecnologias, garantir a interoperabilidade das máquinas de retoma, estruturar uma rede logística eficiente e assegurar que operadores, retalhistas e fornecedores trabalham em articulação sob um novo enquadramento regulatório. É uma transformação complexa, que requer elevada coordenação técnica e um esforço conjunto de múltiplos setores para garantir que o sistema entra em funcionamento com fiabilidade, escala e qualidade.

Como será garantida a adesão ao sistema? 

A adesão ao SDR será garantida através de uma combinação entre a estrutura legal do sistema, que enquadra a participação dos agentes económicos, e a conveniência da experiência do utilizador, que permitirá que devolver uma embalagem seja tão intuitivo quanto comprá-la. A existência de um incentivo financeiro direto reforça esse comportamento, tornando o depósito recuperável num gesto valorizado pelo consumidor. Paralelamente, será desenvolvida uma estratégia de comunicação contínua, com campanhas nacionais, ações educativas e iniciativas locais, para que todos compreendam o funcionamento do sistema e se sintam parte desta mudança.

Que estratégias de comunicação ou incentivos estão a ser preparados para promover hábitos mais sustentáveis?

A comunicação do SDR tem como objetivo esclarecer os consumidores sobre o funcionamento do sistema, mobilizar a participação através de mensagens simples e acessíveis e reforçar, ao longo do tempo, a incorporação deste novo hábito no quotidiano dos portugueses. Este esforço será complementado pela devolução do valor do depósito, que devolve valor ao consumidor sempre que uma embalagem é retomada. Serão ainda desenvolvidas iniciativas para ampliar o alcance educativo e promover uma cultura de responsabilidade ambiental nas comunidades.

O SDR Portugal terá um papel decisivo no cumprimento das metas europeias de recolha seletiva e incorporação de material reciclado. Que medidas estão a ser planeadas para assegurar que estas metas sejam atingidas dentro dos prazos 

A SDR Portugal foi criada para garantir que Portugal cumpre as metas europeias de recolha seletiva e de incorporação de material reciclado. O plano operacional estabelece metas anuais progressivas, evoluindo de forma consistente até atingir os 90% exigidos em 2029. Para isso, a SDR Portugal está a implementar uma infraestrutura nacional robusta, com mais de 2.500 máquinas automáticas e pontos manuais complementares, centros de contagem e triagem de alta precisão e um sistema digital de rastreabilidade que assegura controlo total desde o produtor até final aos recicladores. A integração obrigatória de todas as embalagens com o símbolo e o código EAN da SDR Portugal garante qualidade na recolha e elimina margens para desvio ou fraude, reforçando a fiabilidade dos dados reportados ao Estado e à União Europeia.

Paralelamente, o sistema contribuirá para reduzir até 40% do littering e diminuir de forma expressiva o lixo marinho, um impacto ambiental essencial para a credibilidade do país e para o cumprimento dos compromissos assumidos nas agendas europeias e internacionais. A médio prazo, este modelo permitirá aumentar a disponibilidade de plástico reciclado de alta qualidade, crucial para alcançar a meta dos 65% de material reciclado nas garrafas até 2040.

De que forma o SDR poderá evoluir após 2026? Há planos para alargar o sistema a outros tipos de embalagens ou para integrar novas tecnologias de gestão e rastreabilidade?

O SDR foi concebido como um sistema evolutivo. Após 2026, poderá expandir-se a outros tipos de embalagens, desde que exista fundamentação, capacidade técnica e enquadramento legislativo para tal, garantindo sempre a mesma eficiência e qualidade de serviço.

A prioridade inicial é garantir um arranque sólido com as embalagens de bebidas de uso único de plástico (PET) e metal, até 3 litros, que representam maior impacto ambiental e menores taxas de recolha. No entanto, o sistema será continuamente atualizado do ponto de vista tecnológico: a rastreabilidade digital evoluirá com novas soluções, integração em tempo real de dados, inteligência logística, monitorização contínua das máquinas e conexão entre operadores. O SDR não é um sistema estático, mas um projeto em constante evolução, que acompanhará tanto a inovação tecnológica como as exigências ambientais europeias. Mais do que um mecanismo de recolha, a SDR Portugal representa uma mudança estrutural, que vai trazer uma nova cultura de responsabilidade partilhada entre consumidores, empresas e Estado, promovendo valor económico através da reciclagem e consolidando Portugal como um caso de sucesso em economia circular.