Neste último sábado, 1 de fevereiro, assinalaram-se três anos desde a entrada em vigor da Lei de Bases do Clima em Portugal, a qual estabelece princípios, objetivos e diretrizes fundamentais para mitigar a crise climática e adaptar o país aos riscos associados ao aquecimento global e a uma maior frequência e intensidade de fenómenos extremos meteorológicos.
Esta legislação trouxe consigo há três anos uma onda de esperança, sinalizando um compromisso do país com a ação para um futuro mais sustentável e socialmente justo. Após a aprovação da lei, deveria ter havido regulamentação específica célere para detalhar sua aplicação prática, como seja o estabelecimento de normas complementares e a criação de órgãos responsáveis pela sua execução, fiscalização e monitorização.
“Mas estes passos têm sido frouxos ou inexistentes, quer da parte dos governos, quer da parte da Assembleia da República nas várias legislaturas, na opinião da ZERO, por falta de empenho e vontade política. Por isso, o potencial transformador da lei permanece por concretizar, com atrasos inaceitáveis no cumprimento das suas disposições e a maioria das medidas-chave a não terem saído do papel”, diz a ONGA.
“Este marasmo compromete a credibilidade do país ao nível internacional, principalmente no contexto da União Europeia, onde Portugal tem sido frequentemente apontado como um exemplo de ambição climática. Para mais, a falta de progresso na implementação da lei coloca-a em risco de se tornar numa mera declaração simbólica, desacreditando os compromissos nela assumidos e enfraquecendo a confiança pública. O efeito cumulativo desta paralisia é muito nefasto, não apenas para a reputação do Governo e Assembleia da República, mas também, e sobretudo, para a capacidade de o país enfrentar os desafios climáticos de forma eficaz”, acrescenta ainda a ZERO.
Deste modo, a associação destacou alguns pontos em atraso, tais como os planos setoriais de mitigação e de adaptação às alterações climáticas para os setores considerados prioritários, “indispensáveis para definir estratégias claras e específicas para setores prioritários, como transportes, energia, indústria e agricultura, já que orientam a redução de emissões e a adaptação às alterações climáticas, assegurando que cada setor contribui de forma equilibrada para as metas nacionais e está preparado para enfrentar os impactos climáticos”.
Outro ponto é o relatório de avaliação inicial de impacte climático legislativo, fundamental para avaliar o efeito das políticas e legislação no clima e a estratégia Industrial Verde, essencial para alinhar o desenvolvimento industrial e económico com as metas climáticas e outros valores ambientais e sociais promovendo a inovação, a redução de emissões e a transição justa, no contexto nacional e das políticas europeias.
De especial relevo, há ainda o Conselho de Ação Climática, um órgão consultivo e independente, responsável pela supervisão da aplicação da lei. O atraso na sua constituição “compromete importantes dispositivos previstos na lei, que também enfrentam atrasos por essa e outras razões”, revela a ZERO, explicando que “neste momento, a sua operacionalização encontra-se bloqueada devido a um impasse relacionado com a garantia de paridade de género na sua composição”.
Por fim, a associação mostra-se preocupada com a revisão da Lei de Enquadramento Orçamental, essencial para garantir uma visão integrada entre a política orçamental, económica e climática, através da incorporação de cenários climáticos nas previsões económicas, nomeadamente nos Orçamentos do Estado, garantindo que estes se alinham e contribuem para a redução da emissão de gases com efeito de estufa e o cumprimento das metas climáticas.
Pequenos passos na Assembleia da República com projetos de lei em matérias relevantes
Contudo, a ZERO também regista que, na véspera deste aniversário, no dia 31 de janeiro, foram dados pequenos passos na Assembleia da República com projetos de lei em matérias relevantes a descerem à respetiva especialidade para uma análise mais aprofundada e articulada. Destacam-se os relacionados com a compatibilização da Lei de Enquadramento Orçamental com a Lei de Bases do Clima; a criação do estatuto de refugiado climático e a moratória da mineração em mar profundo.
A associação apela a que estas propostas sigam um “percurso rápido até à sua aprovação final, sendo de particular urgência a relativa à Lei de Enquadramento Orçamental”.
Por fim, “a ZERO tem esperança de que a recém-criada Agência para o Clima entre em atividade rapidamente e traga uma gestão mais eficiente e coordenada das políticas climáticas do país, impulsionando a Lei de Bases do Clima, e guiando políticas públicas eficazes e conducentes à neutralidade climática em 2045 ou antes”.
Com intuito de refletir conjuntamente sobre as necessidades inerentes à revisão da Lei de Enquadramento Orçamental e a sua adequação à Lei de Bases do Clima, a ONGA irá organizar em breve, na Assembleia da República, uma sessão com a presença de deputados, entidades e atores relevantes.