Zero: gestão colaborativa no minifúndio não é prioridade nos investimentos públicos

A Zero considera haver desorientação na atribuição de verbas para gestão florestal. A associação ambientalista afirma, num comunicado divulgado através do site, que teve acesso a dados dos apoios públicos à floresta, designadamente ao nível da execução de 2.865 candidaturas do Programa de Desenvolvimento Rural para o Continente 2014-2020 (PDR2020) e também das 28 candidaturas aprovadas pelo Fundo Florestal Permanente (FFP) para financiar a constituição de unidades de gestão florestal, os quais “comprovam que continua a existir uma fraca sensibilidade dos poderes públicos em relação à urgência de se atribuir prioridade a investimentos que promovam a gestão colaborativa dos espaços florestais do norte e centro do país, onde a pequena propriedade é dominante”.

Alentejo concentra investimentos na floresta
Para a Zero, não só continuam a prevalecer os investimentos direcionados para a região do Alentejo, onde o latifúndio com agricultura e pecuária são dominantes, com 46% do investimento contratualizado com os proprietários, sendo que se somarmos apenas as medidas dirigidas à beneficiação e produção, a região do Alentejo fica com 65% do investimento.

Ainda que tenha havido em 2018 um incremento de investimento na região Centro em relação a 2017, fruto do apoio a ações de estabilização de emergência relacionadas com os fogos rurais, trata-se de uma situação “indesejável”, frisa a associação, considerando que o país necessita de dirigir rapidamente os seus investimentos florestais para as regiões Norte e Centro, onde existem problemas ligados à ausência de gestão colaborativa dos espaços dominados pelo minifúndio e que, por sua vez, são os territórios mais suscetíveis aos fogos rurais onde existe maior necessidade de promover as espécies florestais autóctones.

Um dos exemplos dados pela Zero é o escasso investimento em projetos relacionados com o aproveitamento da regeneração natural, nomeadamente, de pinheiro-bravo, espécie autóctone com futuro sombrio, mas indutora de uma economia rural que mantém 80% do emprego no setor industrial da floresta, tendo apenas sido identificados 62 projetos apoiados, representando 4,1 milhões de euros. No caso das outras espécies autóctones mais resistentes aos fogos, como os carvalhos, não foi possível conhecer o volume dos apoios atribuídos para as regiões Centro e Norte, mas será certamente diminuto.

Apoio às Unidades de Gestão Florestal é insignificante
Tendo em conta que é necessário promover e facilitar a gestão conjunta dos espaços florestais contínuos no minifúndio pelos próprios proprietários agregados em cooperativas ou associações – uma das medidas mais importantes da Reforma da Floresta – a Zero tentou conhecer o impacto dos apoios do FFP à criação de Unidades de Gestão Florestal (UGF).

E os resultados são “desastrosos”, sublinha: dos 500 mil euros disponibilizados, um valor que à partida já pareceria insuficiente, apenas 128 mil euros, isto é, apenas 25% do valor total foram utilizados.

Porém, quando se analisa o procedimento concursal verifica-se que os valores máximos a atribuir se situavam apenas nos cinco euros por hectare, algo que revela uma total insensibilidade e alheamento por parte da entidade que gere o FFP, o ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, para os problemas do minifúndio e para as dificuldades inerentes ao trabalho de extensão rural.

Ainda assim, num contexto em que as políticas públicas de apoios se encontram desajustadas face à realidade existente e acabam por condicionar negativamente a existência de apoios, houve uma Associação Florestal que se destacou pela positiva – a Associação Florestal do Lima – propondo a criação de 20 UGF que totalizam 11 923 hectares geridos de forma coletiva, destaca o comunicado.

Face a este cenário nada favorável, a Zero espera apenas que durante o corrente ano surjam novos apoios, desta vez já com uma dotação orçamental que não só sinalize o empenho do Governo na promoção da gestão conjunta do minifúndio, mas também conceda valores que suportem adequadamente os esforços de quem promove a (nem sempre fácil) colaboração entre os proprietários rurais.

Apoios à floresta têm que ser repensados na PAC pós-2020
Numa altura em que estão prestes a ser definidas as medidas destinadas a apoiar uma gestão florestal que tenha em conta os riscos das alterações climáticas no âmbito das verbas da Política de Desenvolvimento Rural da União Europeia para o pós-2020, há que repensar todo o modelo de apoio ao investimento na floresta, já que o mesmo fracassou.

“Advoga-se, pois, que Portugal concentre os financiamentos em projetos de gestão conjunta, onde o investimento na promoção de espécies autóctones e a remuneração anual dos serviços de ecossistema prestados pelas florestas autóctones e pela existência de descontinuidades de biomassa e compartimentação dos espaços florestais nas paisagens rurais tenha prioridade. Não é possível manter apenas uma lógica de mercado na gestão florestal, dependente apenas do crescimento da espécie escolhida, uma situação que tem favorecido apenas exploração do eucalipto ou a indiferença dos proprietários, sob pena de continuarmos a assistir ao incremento da área ardida, do desemprego nas áreas rurais e da perda de valor do património florestal”, resume a associação.