A ZERO manifestou a sua forte oposição ao projeto de Valorização dos Recursos Hídricos para a Agricultura no Vale do Tejo e Oeste, cuja consulta pública terminou na passada sexta-feira, 28 de fevereiro.
Após uma análise detalhada ao estudo em consulta pública, a ZERO considera que a construção de um novo açude entre Vila Nova da Barquinha e Constância representa um grave erro estratégico. De acordo com a associação, o projeto promove um modelo agrícola insustentável, favorecendo a agricultura intensiva com alto consumo de água e apresenta impactos ambientais, sociais e económicos inaceitáveis. Para além disso, não explora alternativas verdadeiramente sustentáveis para a região.
Investimento milionário é aposta de alto risco para o futuro da água
A viabilidade económica de um investimento de 1,3 mil milhões de euros, o que equivale a um custo de 30.305€/ha beneficiado, é, como refere a ZERO, altamente questionável. A associação reforça que o projeto assenta em pressupostos frágeis, sem um plano de financiamento claro e com riscos elevados associados:
- Disponibilidade hídrica futura: O projeto assume que os caudais do rio Tejo serão suficientes para abastecer as novas áreas de regadio. No entanto, as previsões climáticas apontam para uma redução progressiva da disponibilidade de água na bacia hidrográfica do Tejo, que poderá variar entre 7% e 21% até ao final do século, tornando a captação insustentável em períodos de seca.
- Modelo económico dependente de culturas permanentes em regime intensivo: O incentivo ao investimento num modelo agrícola assente em culturas permanentes, em regime intensivo e com alto consumo hídrico associado aumenta a vulnerabilidade do setor agrícola às oscilações do mercado e às restrições hídricas futuras decorrentes de secas prolongadas e períodos de escassez hídrica;
- Custos indiretos e impactes não contabilizados: o estudo ignora os custos ambientais e sociais do projeto, tais como a perda de biodiversidade, a degradação da qualidade da água e os impactes no turismo local. Uma análise de custo-benefício mais abrangente poderia revelar que o projeto não é economicamente viável a longo prazo.
Projeto promove um modelo agrícola insustentável e predatório
Este projeto segue a lógica do modelo adotado em Alqueva, baseado na monocultura intensiva, sem atender às necessidades nacionais de autoaprovisionamento e promovendo a sobre-exploração dos recursos hídricos, com consequências ambientais e sociais gravíssimas. A intensificação agrícola promovida pelo projeto aumentará a dependência de culturas de elevado consumo de água, agravando os riscos de escassez de água nas regiões abrangidas e comprometendo a qualidade dos recursos hídricos, dos solos e a biodiversidade.
Em comunicado, a ZERO reforça que o incentivo a este modelo agrícola desconsidera a necessidade de adaptar a agricultura às realidades climáticas e aos desafios ambientais do futuro. A associação ainda afirma que o estudo falha em considerar alternativas viáveis e mais sustentáveis, como sistemas agrícolas regenerativos e sistemas de regadio mais eficientes e adaptáveis.
Ameaça à biodiversidade e incumprimento de compromissos ambientais
A ZERO alerta ainda para o facto de que a construção do açude prejudicará a conectividade fluvial, colocando em risco espécies piscícolas migradoras como a lampreia-do-mar (Petromyzon marinus) e o sável (Alosa alosa), além de favorecer a proliferação de espécies invasoras.
Os Planos de Gestão de Região Hidrográfica (PGRH) indicam que grande parte das massas de água existentes na Região Hidrográfica do Tejo e Oeste já apresenta um estado ecológico “medíocre” ou “razoável”. A ZERO alerta que qualquer agravamento da poluição difusa ou da escassez hídrica dificultará ainda mais o cumprimento dos compromissos assumidos no âmbito da Diretiva Quadro da Água (DQA), que exige a recuperação e proteção das massas de água para alcançar um bom estado ecológico. A agricultura já é uma das principais fontes de poluição difusa na região, e a expansão da área de regadio, associada ao aumento da carga de nutrientes como azoto e fósforo, favorecerá e intensificará episódios de eutrofização, prejudicando a biodiversidade aquática e comprometendo a qualidade da água para outros usos, como indica a ZERO no comunicado enviado à imprensa.
ZERO exige alternativas sustentáveis para a gestão dos recursos hídricos e da agricultura
A ZERO tem vindo a defender um conjunto de soluções alternativas para a gestão dos recursos hídricos e para a exploração agrícola com vista a garantir a sustentabilidade hídrica, como i) a promoção de regimes de caudais ecológicos ii) agricultura urbana e periurbana abastecida por águas residuais tratadas e águas pluviais captadas; iii) agricultura regenerativa através de paisagens de retenção de água, valorizando das funções da Reserva Ecológica Nacional (REN) e iii) práticas agrícolas de sequeiro apoiadas por regadio eficiente.
Perante os riscos e impactes identificados, a ZERO considera que este projeto representa um grave retrocesso na gestão sustentável dos recursos hídricos e apela às autoridades competentes para que repensem a estratégia de desenvolvimento agrícola para o Vale do Tejo e Oeste, optando por soluções alinhadas com a preservação ambiental e a resiliência climática.