ZERO reprova projetos para exportação de hidrogénio e pede reavaliação do projeto em Sines

A Associação ZERO reprovou os projetos de investimento em hidrogénio renovável que o Governo português quer candidatar a financiamento de fundos europeus. No dia 16 de março, a Comissão Europeia encerrou a consulta pública para projetos de interesse comunitário que ampliem o uso de hidrogénio de origem renovável no contexto de transição energética.

Num comunicado enviado à imprensa, a associação ambientalista considera que “existe um enorme equívoco em quase todos os projetos apresentados”, já que as quatro candidaturas “partem do princípio de que o hidrogénio deve ser usado como os combustíveis fósseis”.

Mas, ao contrário dos combustíveis poluentes, a associação explica que o hidrogénio verde pode ser produzido em qualquer lugar onde exista água e energia renovável, e que o seu transporte em estado puro ou liquefeito pode incorrer em elevadas perdas de energia no processo.

Para além disso, a produção de hidrogénio verde por eletrólise obriga a elevados consumos de eletricidade renovável, pois implica um grande desperdício dessa energia, que ronda os 50% ou mais.

A ZERO defende, por isso, o “uso racional” do hidrogénio de origem renovável e a sua produção com recurso a eletricidade produzida o mais próximo possível dos locais de consumo, nomeadamente parques onde existam indústrias mais intensivas em termos energéticos.

Segundo a associação, “uma rede de distribuição de hidrogénio pode ser altamente ineficiente e contribuir para agravar os preços ou os impostos a pagar pela energia a consumir, para além dos riscos não avaliados de fuga de hidrogénio que podem ter implicações de segurança e mesmo no clima, além de reduzirem ainda mais a eficiência energética do sistema e contribuírem para aumentar os seus custos”.

A ZERO analisou os principais problemas associados aos quatro projetos submetidos por Portugal à Comissão Europeia e procedeu à sua justificação.

Sobre o projeto da rede Portuguesa de distribuição de Hidrogénio, a associação ambientalista defende que a aplicação do princípio da eficiência energética está por avaliar.

“Existem instalações industriais difíceis de eletrificar e de descarbonizar próximas da área onde será injetada a eletricidade produzida, sendo que o hidrogénio não deverá ser transportado a longas distâncias se puder ser utilizado de forma eficiente nestas indústrias”, afirma a associação ambientalista.

Para a ZERO, é também necessário demonstrar que “o potencial de produção de eletricidade renovável com recurso à energia eólica ao largo da Figueira da Foz é suficiente para produzir quantidades de hidrogénio que excedem as necessidades dos setores da indústria e do setor dos transportes na região centro de Portugal”.

A associação considera que este aspeto é duvidoso, “dada a quantidade de indústrias cerâmicas e do vidro, cimenteiras, de produção de pasta de papel e de produção de fertilizantes, para além da existência de cavernas de sal com eventual capacidade de armazenamento de hidrogénio para fazer face a situações extremas de stress do sistema electroprodutor causadas por invernos secos”.

Também a proveniência do hidrogénio para injetar em Monforte, a partir do ano de 2029, fica por entender, para a associação, “sendo que a transformação do gasoduto entre Monforte e Celorico da Beira deverá ter um enorme custo sem que se encontre justificação técnica e económica para tal”.

Acerca da candidatura do Gasoduto entre Celorico da Beira e Zamora, a associação considera que é preciso provar que o transporte de hidrogénio até à instalação que o usará é mais eficiente do que o transporte de eletricidade de origem renovável.

A ZERO defende ainda que esta instalação “dedicada ao transporte de hidrogénio” só se justificaria se a construção de uma rede de transporte de hidrogénio em Portugal tivesse justificação técnica e económica, “o que não foi demonstrado até ao momento”.

Sobre o terminal de liquefação e exportação de hidrogénio em Sines, para a associação é preciso também demonstrar que o hidrogénio produzido não tem um uso mais eficiente nas indústrias que já existem instaladas na região ou fazem intenção disso.

Adicionalmente, a ZERO explica que, em Sines, existe uma grande capacidade instalada de transporte de eletricidade, e que pode ser aí instalada capacidade de produção de eletricidade a partir de sistemas de pilhas de combustível que possam permitir ao país fazer face à escassez hídrica que reduz a produção elétrica em invernos secos.

“Em Sines, poderá também instalar-se um grande centro de produção de combustíveis sintéticos para o transporte aéreo e marítimo, já que ali se inicia o principal oleoduto do país e cerca de 50% da carga portuária do país é movimentada neste porto de águas profundas”, acrescenta a associação.

Mais uma vez, a ZERO considera que existem usos locais para o hidrogénio a produzir em Sines, sendo difícil de justificar a exportação de hidrogénio líquido. Do ponto de vista energético e ambiental, mas também estratégico do desenvolvimento industrial do país, o que faz sentido para a ZERO é que “a fileira e cadeia de valor de indústrias com base em hidrogénio português se concentrem em Portugal”.

Sobre o Eletrolisador de 400 MW em Sines, a Associação ZERO afirma que “instalar capacidade de eletrolisação é positivo”, mas apenas “numa evolução modular e escalável que possa adaptar-se à quantidade de energia renovável adicional disponível”.

Nesse sentido, desaprova alguns dos usos planeados para o hidrogénio produzido por meio dos eletrolisadores, “nomeadamente a sua liquefação e injeção em tubulações, ou o seu uso em edifícios, veículos leves e logística urbana”.

A ZERO destaca que a liquefação do hidrogénio é muito menos eficiente em termos energéticos do que o seu uso no estado gasoso para aplicações industriais na vizinhança ou na produção de amoníaco, metanol ou combustíveis sintéticos.

Como a eletrificação direta de edifícios é mais eficiente do que o uso de hidrogénio, a associação não vê, por isso, vantagem em fornecer edifícios com hidrogénio puro ou misturado com gás fóssil, a menos que seja numa fase de transição curta neste último caso.

Já eletrificação por baterias de automóveis é mais eficiente do que os veículos a pilha de combustível de hidrogénio. No setor dos transportes, a ZERO explica que o uso de hidrogénio é vantajoso apenas para a aviação, o transporte marítimo e o transporte rodoviário de pesados.