A Ambiente Magazine esteve à conversa com Pedro Faria Gomes, Diretor de Risco e Sustentabilidade da E-REDES. A Transição Energética é um dos temas abordados pela necessidade urgente de a acelerar. Mas o entrevistado garante que o compromisso da sustentabilidade deve ser abordado de forma pragmática, e adianta que a E-REDES firma diariamente um forte compromisso com o desenvolvimento de uma rede resiliente, renovada, digital e com capacidade para garantir a massificação da descarbonização da geração de eletricidade. Leia aqui a 1ª parte desta Grande Entrevista, publicada na edição 112 da Ambiente Magazine.

Qual o papel da sustentabilidade para a E-REDES?
A missão da área de Sustentabilidade e Ambiente da E-REDES é inspirar o compromisso da empresa com objetivos de desenvolvimento sustentável, como os definidos pela ONU na Agenda 2030, que declara também 2020-2030 como a “Década de Ação” na qual é preciso um sentido de urgência para acelerar a Transição Energética.
No entanto, é fundamental que este compromisso seja abordado de forma pragmática. Uma área de sustentabilidade que não adota uma abordagem prática corre o risco de não ser integrada nos processos de negócio, ficando “a falar sozinha”, mais voltada para o exterior do que para o interior da empresa.
O nosso objetivo é, portanto, promover uma área de sustentabilidade que esteja próxima do negócio, apoiando na resolução de problemas concretos enquanto promove valores ambientais e de sustentabilidade.
Como é que a atividade da E-REDES se alinha com a transição energética?
O grande objetivo desta transição é satisfazer as necessidades energéticas da humanidade de forma sustentável, o que na prática tem significado reduzir as emissões de gases de efeito estufa, um processo frequentemente referido como “descarbonização”.
Podemos estruturar a transição energética em duas grandes eras: a primeira é a Eletrificação e Eficiência do Consumo, e a segunda é a Descarbonização do Consumo não Eletrificável.
A primeira era envolve a descarbonização da geração de eletricidade, que começou há alguns anos com o advento da geração eólica e solar, agora tecnologias maduras. Inclui também a busca pela eficiência energética, como a utilização de iluminação LED, a redução do consumo e a deslocação do consumo para horas de geração mais “limpa”, e, sobretudo, a conversão de diferentes formas de consumo para elétrico, como os transportes e a climatização de edifícios.
A segunda era foca-se na procura de soluções inovadoras para descarbonizar setores que dificilmente podem ser abastecidos pela eletricidade, como a indústria pesada, a indústria química, a aviação e o transporte marítimo. Para estes setores, soluções como o hidrogénio renovável poderão ter um papel relevante.
Atualmente, estamos na fase de massificação da primeira era, enquanto damos os primeiros passos na segunda. Para que a eletrificação e a descarbonização do consumo elétrico sejam massificadas, a rede elétrica desempenha um papel central e crítico. Sem uma rede resiliente e com capacidade adequada, não será possível aproveitar a geração renovável quando esta ocorre, para satisfazer um crescente consumo elétrico. Como consequência, ficaremos aquém de todo o potencial da primeira era da transição energética, criando a necessidade de um maior esforço na segunda, que é mais difícil (não é por acaso que vem depois da primeira). Na Europa, existe um largo consenso quanto à necessidade de incentivar adequadamente os investimentos na rede para que possam ser executados atempadamente e de forma eficiente.
A E-REDES firma diariamente um forte compromisso com o desenvolvimento de uma rede resiliente, renovada, digital e com capacidade para permitir a massificação deste primeiro momento da transição energética. É disso exemplo o valor de 1,5 mil milhões de euros de investimento entre 2026 e 2030, apresentado no Plano de Desenvolvimento e Investimento da Rede de Distribuição (PDIRD) da E-REDES.

Como é que se faz esta transição energética, com menor impacto ambiental?
A transição energética, por si só, já visa minimizar o impacto ambiental do consumo energético da sociedade, uma vez que seu objetivo é satisfazer essa necessidade de forma descarbonizada. A rede elétrica, ao facilitar essa transição, desempenha um papel crucial nesse processo. No entanto, é importante reconhecer que a construção e operação de uma rede elétrica também têm um impacto ambiental, e essa é uma preocupação que a E-REDES aborda com seriedade.
O processo de licenciamento dos ativos da rede é bastante completo e envolve, dependendo do tipo de projeto, interações com a APA, o ICNF e outras entidades dedicadas à proteção ambiental. Isso garante que sejam encontradas soluções ótimas, equilibrando a necessidade de expandir a rede com a da proteção adequada dos valores ambientais. Essas interações podem resultar em ajustes nos nossos projetos, como o desvio de traçados de linha para mitigar o impacto em zonas sensíveis.
Além disso, a E-REDES incluiu no PDIRD um programa de promoção ambiental de cerca de 50 milhões de euros. Este programa abrange investimentos em dispositivos de proteção de avifauna, barreiras acústicas, bacias de retenção de óleos, entre outros.
Quais os atuais desafios que enfrenta a rede elétrica no nosso país?
Entre os diferentes desafios que a rede elétrica no nosso país enfrenta, destacaria três principais: o aumento do investimento, os incentivos a este investimento e a digitalização e agilização dos processos.
Vivemos um momento de crescimento do consumo e da geração distribuída, o que coloca grandes desafios à rede elétrica. É essencial expandir a rede para acomodar todo este crescimento. No entanto, a base da qual partimos para esta expansão não é a mais confortável, pois a última grande vaga de eletrificação do nosso país ocorreu nos anos 1980. Como resultado, grande parte dos ativos da rede tem agora 40, 50 ou mais anos, tornando-a bastante envelhecida, sendo necessário investir não só na expansão, mas também na renovação da rede. O PDIRD 2026-2030 apresentado pela E-REDES representa um aumento de 50% em relação ao anterior.
Executar este plano implica um aumento de volume em diferentes atividades, como estudos de rede, desenho de projetos, compra de materiais e execução no terreno (mão-de-obra), num momento em que todo o setor elétrico europeu enfrenta esta necessidade. Este é possivelmente o principal conjunto de desafios operacionais que a empresa enfrenta.
Aos desafios operacionais relacionados com o aumento do investimento junta-se um também bastante relevante: a definição do conjunto de incentivos à sua realização. O sucesso da execução do investimento necessário à transição energética depende largamente do incentivo implícito para o realizar. Por isso, é fundamental adequar a remuneração da atividade de distribuição à fase de massificação da eletrificação do consumo que vivemos, alinhando com os padrões europeus de modo a garantir a captação de capital, para poder entregar ao consumidor os benefícios exigidos pela sociedade.
Por fim, com o aumento do volume de atividade, teremos mais clientes, todos com contadores inteligentes e, portanto, com mais informação para gerir. Haverá mais elementos de rede, incluindo mais pontos de geração de maior dimensão e mais dispersos, o que traz uma maior complexidade na gestão dos fluxos de energia, que estará assente num maior número de sensores, aumentando ainda mais a quantidade de informação a ser gerida.
Enfrentar estas tendências só é possível com um aumento da digitalização, aproveitando a diáspora da Inteligência Artificial. A E-REDES tem feito uma forte aposta em ferramentas digitais para agilizar processos, incluindo as de uso individual para o dia-a-dia dos colaboradores, com uma expansão progressiva de ferramentas de Inteligência Artificial. Também tem sido dado um grande foco às soluções de apoio à operação, de que são exemplo: ferramentas de cloud, Big Data e analítica avançada para tratar e disponibilizar ao mercado um maior volume de dados de clientes, resultante da massificação dos contadores inteligentes; aplicações com a mais recente tecnologia para a gestão da rede e dos trabalhos de campo; soluções de digitalização da relação com os clientes, como o Balcão Digital e a APP da E-REDES, a Área Reservada das Autarquias e o Assistente de Respostas para o Cliente; o portal Open Data, que torna acessíveis de forma pública várias informações sobre os consumos e a rede elétrica; o reforço da infraestrutura digital da E-REDES, com a adesão ao 5G, bem como o aumento de soluções de cibersegurança; e a participação em projetos europeus focados em interoperabilidade, flexibilidade, partilha de dados, blockchain, inteligência artificial e integração de energias renováveis. A E-REDES está consciente que a digitalização tem um papel fundamental na rede do futuro, sendo um dos seus principais programas de investimento – entre 2021 e 2025, a E-REDES investiu cerca de 600 M€ em soluções para tornar a rede mais digital e eficiente.

A E-REDES concluiu em 2024 a instalação de smartmeters em Portugal Continental. Como correu esta operação?
A operação de instalação de smartmeters em Portugal Continental, concluída pela E-REDES em 2024, foi uma das mais desafiantes operações logísticas realizadas no nosso país. Instalar contadores inteligentes em mais de 6,5 milhões de clientes exigiu um esforço notável, especialmente na fase final, onde estavam a ser instalados 25 mil contadores por semana. Esta operação foi concluída em novembro de 2024, um mês antes do prazo estabelecido para a E-REDES.
O investimento, de 330 milhões de euros, trouxe inúmeros benefícios aos consumidores, sendo o mais visível o fim das faturas com consumos estimados. Além disso, a E-REDES está a aproveitar estes novos sensores para melhorar a exploração da rede, o que resulta numa melhoria da qualidade de serviço e, consequentemente, num benefício direto para o cliente. Os contadores inteligentes são, sem dúvida, uma peça-chave na Transição Energética, permitindo uma gestão mais eficiente e sustentável do consumo energético.
De que forma esta operação torna o consumo elétrico mais sustentável?
A instalação de contadores inteligentes em todos os clientes da E-REDES trouxe várias alterações nas operações da empresa, resultando em impactos ambientais positivos. Com 100% dos clientes equipados com smartmeters, eliminou-se a necessidade de leituras manuais, evitando milhões de deslocações dos leitores às instalações dos clientes, que anteriormente ocorriam a cada três meses para os mais de 6,5 milhões de clientes. Além disso, outras operações, como alterações de potência, cortes e religações, passaram a ser realizadas de forma remota, evitando a necessidade de deslocação de técnicos.
Para os clientes, esta mudança também promove a sustentabilidade. Com os contadores inteligentes, os consumidores podem ter um maior conhecimento do seu consumo e ajustar o seu perfil aos sinais de preço. Além disso, podem participar em comunidades de energia, seja como consumidores ou produtores de eletricidade, entre outros exemplos.
Como é que a digitalização apoia a sustentabilidade para a E-REDES?
A digitalização desempenha um papel crucial no apoio à sustentabilidade para a E-REDES. No contexto da Transição Energética, a digitalização é essencial para lidar com o aumento expressivo da quantidade de informação a processar, resultante de uma rede mais complexa, com mais clientes e mais elementos de geração renovável distribuída.
Além disso, na atividade de ambiente, a digitalização tem um impacto significativo. Permite uma melhor gestão das comunicações e dos relatórios que fazemos às autoridades ambientais, melhora o controlo interno da documentação e das evidências que precisamos de guardar, e agiliza os processos. Ter os processos de gestão ambiental digitalizados torna-nos mais eficientes e reduz expressivamente o potencial de falhas e de incumprimentos.

E como é que a gestão da rede de iluminação pública se pode tornar mais inteligente?
A E-REDES tem feito um investimento na modernização e digitalização da rede de Iluminação Pública, permitindo aos municípios obter benefícios significativos em termos de eficiência energética e maior autonomia.
A modernização da iluminação pública, substituindo a tecnologia tradicional por LED, tem gerado uma poupança energética expressiva nas faturas de eletricidade dos municípios. A meta é que todo o parque de iluminação pública em Portugal seja LED até 2027, com um potencial de poupança de cerca de 100 milhões de euros por ano para os municípios. Em 2025, foram instaladas mais 230 mil luminárias LED, num investimento de cerca de 25 milhões de euros.
Quanto à autonomia dos municípios, a digitalização permite que os municípios possam gerir a iluminação pública de forma mais eficiente, tomando decisões como os horários de funcionamento. Há não muitos anos, ainda era necessário um técnico deslocar-se ao local para ajustar o relógio que controlava o horário de funcionamento dos circuitos de iluminação pública em todo o país. A progressiva desburocratização desta relação entre a E-REDES e os 278 municípios não só permite um maior controlo local, ajustado às necessidades de cada comunidade, como também promove uma maior sustentabilidade deste tipo de operações.
No que consiste o portal Open Data da E-Redes?
O Portal Open Data da E-REDES disponibiliza acesso público a dados locais sobre consumo energético e infraestrutura elétrica. Foi criado com o objetivo de fornecer informações valiosas para promotores de energias renováveis e postos de carregamento de veículos elétricos, bem como para investigadores, start-ups e entidades públicas que buscam desenvolver soluções para a transição energética. Atualmente, o portal conta com 20 mil utilizadores únicos e já teve cerca de 10 milhões de consultas.
A informação disponibilizada no Portal Open Data permite otimizar o planeamento da mobilidade elétrica, através dos dados sobre a localização e capacidade dos postos de transformação, acompanhar a evolução das unidades de autoconsumo, apoiar decisões locais com base em dados de consumo e rede, e identificar áreas com potencial para comunidades de energia renovável, acelerando assim a transição energética em Portugal.
Este portal é uma evidência da transparência e do compromisso da E-REDES em ser um motor da Transição Energética, firmando um compromisso com a sociedade.
Fotos @Raquel Wise.








































