A Ambiente Magazine esteve à conversa com Pedro Faria Gomes, Diretor de Risco e Sustentabilidade da E-REDES. A Transição Energética é um dos temas abordados pela necessidade urgente de a acelerar. Mas o entrevistado garante que o compromisso da sustentabilidade deve ser abordado de forma pragmática, e adianta que a E-REDES firma diariamente um forte compromisso com o desenvolvimento de uma rede resiliente, renovada, digital e com capacidade para garantir a massificação da descarbonização da geração de eletricidade. Leia hoje a 2ª e última parte desta Grande Entrevista, publicada na edição 112 da Ambiente Magazine.

Qual é o papel do cidadão para uma gestão mais sustentável da rede elétrica?
Todos os cidadãos podem ter um papel fundamental numa gestão mais sustentável da rede elétrica. Um consumidor mais informado, consciencializado, proativo e digital tende a ser mais sustentável. Ao ter acesso a mais informações sobre o seu consumo, pode conhecer e adaptar os seus hábitos a um comportamento mais responsável.
E é possível ir mais além, tornando-se autoconsumidor ou participando em comunidades de energia. Atualmente, em Portugal, existem cerca de 260 mil clientes com autoconsumo individual e 2 mil clientes com autoconsumo coletivo ou em comunidades de energia.
No que diz respeito à interação com a E-REDES, também é possível ter um papel numa gestão mais sustentável da rede. Existem canais digitais para os principais serviços requisitados pelos consumidores de energia e, ao utilizar estas ferramentas, os cidadãos asseguram que os processos operacionais de que necessitam são despoletados da forma mais eficiente. Atualmente, mais de 60% das interações dos clientes com a E-REDES são realizadas por via digital.
Como funciona o sistema de gestão certificado para a componente ambiental?
O sistema de gestão ambiental da E-REDES, certificado de acordo com os requisitos da norma ISO 14001, é um compromisso sólido e uma evidência da responsabilidade ambiental da empresa. A atividade da E-REDES tem uma forte presença no terreno, sendo inevitável que a construção e operação dos seus ativos impactem diretamente o ambiente. Embora o cumprimento da legislação em vigor já preveja um conjunto de medidas para mitigar este impacto, a E-REDES vai além das obrigações legais para garantir uma gestão ambiental exemplar.
Entre as obrigações legais da E-REDES estão a correta gestão de resíduos, a adequação do ruído ambiental das suas operações e a responsabilidade pelo tratamento de incidentes ambientais, como os derrames de óleo. Estas atividades devem ser realizadas segundo procedimentos cuidadosamente definidos e registadas de modo a serem auditáveis.
A implementação de um sistema de gestão ambiental implica o desenho e controlo de todos os processos ambientais, desde o planeamento até ao reporte das operações. Este sistema permite à E-REDES ter um processo para controlar o cumprimento das suas obrigações legais, mas inclui ainda uma supervisão de outras iniciativas. Exemplos destas são a deslocação de ninhos de cegonhas para habitats afastados das linhas elétricas e as ações de proteção de avifauna acordadas no âmbito do Protocolo Avifauna, celebrado há 22 anos.
Este sistema, auditável a cada ano, demonstra o compromisso contínuo e a dedicação da E-REDES em promover práticas ambientais sustentáveis e responsáveis.

Que outras medidas tem assumido a E-Redes para apoiar a biodiversidade e o ambiente?
A E-REDES tem uma preocupação histórica com a proteção do capital natural dos locais onde opera. Como já referido, o sistema de gestão ambiental que temos implementado engloba todas as nossas iniciativas de sustentabilidade e proteção ambiental.
Quando pensamos especificamente em biodiversidade, podemos dizer que há duas frentes principais: a avifauna, onde a E-REDES tem trabalho desenvolvido há largos anos, e as ocupações compatíveis, onde estamos a dar os primeiros passos.
Para a avifauna, a E-REDES celebrou há 22 anos um Protocolo com o ICNF, a Quercus e a SPEA, que tem sido renovado a cada três anos e, desde 2013, conta também com a LPN. Neste período, conseguimos proteger 1.500 km de linha com dispositivos avifauna, reduzindo a mortalidade por colisão e eletrocussão de espécies selvagens, que incluem cerca de 64 mil dispositivos dissuasores de nidificação da cegonha branca. Esta parceria também nos permitiu participar em projetos europeus como os LIFE, ampliando nossa capacidade de atuação e promovendo um maior conhecimento sobre o tema. Ao abrigo destes projetos, foram realizados estudos de prospeção, ações de monitorização de linhas elétricas aéreas, cartas de risco de colisão e eletrocussão, e testadas soluções avifauna inovadoras ou de tecnologia mais eficiente. Além disso, a E-REDES participa em fóruns nacionais e internacionais sobre a avifauna, para troca de experiências e promoção das melhores práticas.
Já o tema das ocupações compatíveis visa repensar a forma como realizamos a gestão de vegetação, uma atividade à qual estamos legalmente obrigados. Desde as alterações legislativas iniciadas em 2018, a E-REDES assegura anualmente o corte de cerca de 18.000 ha de vegetação na Rede Secundária de Faixas de Gestão de Combustível (RSFGC) afeta às linhas de distribuição. Esta exigência visa salvaguardar pessoas e bens, mitigando o risco de incêndio ao limitar focos de potencial ignição. No entanto, estas intervenções nem sempre asseguram o grau de mitigação pretendido, uma vez que o despovoamento e a ausência de gestão em áreas rurais levam ao crescimento descontrolado da vegetação, aumentando sua carga combustível.
A solução não passa por aumentar a frequência de corte, que aumenta a presença de combustíveis finos secos, potencia o aparecimento de espécies invasoras, e é uma abordagem invasiva para a biodiversidade. Procurando uma resposta para este problema – proteger a biodiversidade, sem deixar de mitigar o risco de incêndio – a E-REDES, em parceria com o CoLAB Forestwise, tem estudado qual o tipo de vegetação e modelo de gestão que poderia coexistir com a rede elétrica. Um corredor ecológico com vegetação gerida de forma ativa, pelos seus proprietários ou entidades responsáveis, pode criar uma paisagem mais resiliente a incêndios, especialmente em áreas classificadas. É esta a nossa convicção.
A classificação das espécies como compatíveis com a rede (daí o termo Ocupações Compatíveis) considera sua classe de altura, o risco potencial de incêndio e a possibilidade de proporcionarem atividades económicas ou serviços de ecossistema para os proprietários ou para as localidades. Assim, devem ser espécies de pequeno porte e de crescimento lento, que se enquadrem na atividade económica local, e cuja gestão ativa implique a limpeza de combustíveis finos, reduzindo sua disponibilidade para a ignição e progressão do fogo.
A E-REDES tem procurado modelos para implementar esta ideia, conciliando vários benefícios: evitar o corte de toda a vegetação, protegendo a biodiversidade, e desenvolver uma atividade económica com a espécie compatível que incentiva uma gestão ativa pelo proprietário, resultando numa limpeza mais frequente de combustível fino e tornando o corredor mais resiliente a incêndios. É um tema no qual esperamos conseguir avançar em breve.

Como é que a rede elétrica se adapta às alterações climáticas?
Ao ler relatórios de sustentabilidade de diferentes empresas, é frequente encontrar um foco na mitigação climática, ou seja, nas ações para reduzir emissões. Por sua vez, a adaptação climática, que envolve a preparação para enfrentar as mudanças climáticas e eventos extremos, passa muitas vezes despercebida. Para um operador de rede, a lógica deve ser oposta. Num relatório de julho de 2025, a Eurelectric, associação europeia do setor elétrico, defendeu a importância de os operadores de rede integrarem a adaptação climática nos seus planos de desenvolvimento, incentivando a Comissão a dar ênfase à resiliência física da rede nos Planos de Adaptação, e aos Estados Membros nos Planos Nacionais de Clima.
Em 2023, a E-REDES fez uma primeira quantificação do seu risco climático através da matriz de reporte conhecida como Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD). Mais recentemente, aprovou o seu Plano de Adaptação Climática, mapeando todas as iniciativas já implementadas e em desenvolvimento para tornar a rede mais resiliente a eventos climáticos extremos. Este plano divide-se em duas frentes de atuação: uma de planeamento e outra de reação.
A componente de reação é a que historicamente tem sido mais desenvolvida, através dos planos de continuidade de negócio, em particular do Plano Operacional de Atuação em Crise (POAC), que define os diversos procedimentos para assegurar a atuação em situações como eventos climáticos extremos, a cadeia de coordenação, os recursos humanos e materiais a envolver na resposta, até à recuperação total dos nossos serviços. A atenção constante que damos a este tema valeu-nos, em 2014, o Prémio Europeu “Most Effective Recovery of the Year” atribuído pelo Business Continuity Institute, considerando a resposta da empresa à tempestade Gong, em 2013.
Com a componente de reação bem sistematizada há vários anos e revista regularmente pelo ciclo de melhoria contínua no Sistema de Gestão de Continuidade do Negócio, certificado pela norma ISO 22301 desde 2015, o nosso principal foco está atualmente na componente de planeamento. O procedimento que estamos a preparar começa com o conhecimento dos perigos climáticos futuros. Para tal, a E-REDES concluiu, em 2024, um estudo com o Instituto Dom Luiz e a Universidade Nova de Lisboa, que resultou na criação de mapas de risco climático até 2100, para o risco de incêndio, vento extremo e cheias. Estamos agora a sistematizar internamente a forma como estes mapas serão usados em dois importantes tipos de decisão: na priorização de investimentos e no desenho de projetos. Em suma, projetos em zonas de maior risco climático terão maior grau de prioridade (ponderada com todos os outros fatores de priorização, como o aumento de consumo e a capacidade local da rede) e serão adaptados com soluções técnicas específicas no respetivo desenho.
O aumento da resiliência da rede ao clima não será um efeito imediato destas medidas, levando tempo desde o momento em que estas práticas são adotadas pela organização. No entanto, é um tema que consideramos fundamental e urgente avançar.

E como é que a atividade da E-Redes integra a economia circular?
A atividade da E-REDES integra historicamente práticas de economia circular de forma empírica. Cada vez que reparamos, recondicionamos ou reutilizamos (o nosso equivalente interno aos 3 Rs) um material, estamos a promover a economia circular. Sendo uma empresa com um expressivo investimento em ativos físicos, a E-REDES encontra naturalmente muitas Comissionamento individual e massivo de horários de funcionamento.
No entanto, para além do que tem um racional operacional óbvio, a E-REDES procura continuamente encontrar oportunidades de promover a economia circular nas suas atividades.
Em 2023, a E-REDES iniciou um programa de circularidade chamado E-REDONDO. Este programa sistematiza diversas frentes de atuação para uma economia mais circular e desafia as áreas de negócio a aderir sempre que encontramos racional para tal. É importante lembrar que todas as boas ideias, se não forem implementáveis no negócio, perdem o pragmatismo e o ângulo de resolução de problemas que queremos ter nesta área. As iniciativas deste programa podem ser agrupadas em três principais frentes: fornecimentos circulares, gestão de ativos e fim de vida.
A União Europeia tem promovido regras para aumentar a circularidade dos produtos nela vendidos. À semelhança do que está a ser solicitado nos leilões de energias renováveis, espera-se que os requisitos mínimos em matéria de sustentabilidade ambiental para os procedimentos de contratação pública, aos quais a E-REDES está sujeita, incluam informação sobre a pegada de carbono ao longo do ciclo de vida de novos produtos. A E-REDES tem estado em contacto com os fornecedores dos seus principais produtos para preparar este caminho, de modo a estar pronta quando estas regras entrarem em vigor, garantindo uma transição suave.
Na frente de gestão de ativos, queremos procurar continuamente, juntamente com as áreas de negócio, novos ativos para os quais faça sentido montar os ciclos 3 Rs, bem como ajudar a tornar mais eficientes os que atualmente temos. Esta é a frente mais operacional e palpável do programa E-REDONDO, com maior potencial de impacto positivo a curto prazo.
Quando chegam ao fim de vida e são substituídos, alguns ativos podem ainda ter uma segunda utilização. De modo a encontrar soluções adequadas, temos explorado diferentes possibilidades em mercados de second life.
Com este programa, tem sido possível desafiar uma cultura de circularidade na empresa, sem deixar de ter adesão à realidade operacional de um distribuidor de energia elétrica.








































