Por Ana Calhôa, Secretária-Geral da Associação de Bioenergia Avançada
Assumir a liderança na descarbonização implica uma visão ampla e uma responsabilidade partilhada, e Portugal tem dado passos firmes em prol desta urgência. A última revisão do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) reafirma este compromisso com um futuro mais sustentável, justo e competitivo, deixando claro que, se quisermos construir uma sociedade mais resiliente e preparado para responder à emergência climática, será indispensável um esforço conjunto entre empresas, cidadãos e governo.
No entanto, se nos parece necessário existir essa maior dedicação e compromisso com metas cada vez mais exigentes e ambiciosas, não é menos evidente que o PNEC continua a carecer de uma definição mais estruturada de prioridades e de instrumentos de apoio proporcionais à escala do desafio que se propõe enfrentar. Estabelecer objetivos como a redução em 55% das emissões de gases com efeito de estufa até 2030 (face a 1990) ou alcançar 47% de energias renováveis no consumo final bruto é, sem dúvida, essencial. Mas a cinco anos desse ponto de viragem, é legítimo perguntar: estaremos a mobilizar os recursos certos, nas áreas certas, com a velocidade certa?
O PNEC é, inegavelmente, um instrumento fulcral para alinhar esforços em torno de objetivos comuns. Porém, a sua eficácia dependerá sempre da nossa capacidade de transformar ambição política em ações concretas e mensuráveis, criando condições que acelerem o desenvolvimento tecnológico e a adoção de soluções energéticas mais limpas, sustentáveis e economicamente viáveis. Para que o plano saia do papel e se traduza em resultados, importa não relegarmos para segundo plano tecnologias que já hoje se afirmam como aliados decisivos da descarbonização. E aqui, soluções como os biocombustíveis produzidos a partir de resíduos, nomeadamente o biometano e os biocombustíveis líquidos, podem (e devem) ser priorizadas.
A bioenergia avançada tem demonstrado ser um dos motores essenciais para reduzir o consumo de combustíveis fósseis, sobretudo em setores de difícil eletrificação, como a mobilidade terrestre, marítima e a aviação. Não só é uma solução com maturidade e impacto direto na redução de emissões (com potencial de mitigar entre 85% a 97% das emissões de gases com efeito de estufa na mobilidade), como permite também dinamizar cadeias locais e valorizar resíduos que, de outra forma, seriam incorretamente descartáveis, como é o caso dos agrícolas, florestais e industriais.
Se temos a tecnologia, as soluções e o conhecimento ao nosso alcance, é fundamental que continuemos a investir na transformação da descarbonização num verdadeiro motor de inovação e progresso. Para isso, é necessário criar mecanismos de apoio que ofereçam aos principais agentes do setor condições seguras para escalar soluções, investir com confiança e contribuir de forma decisiva para o cumprimento das metas climáticas nacionais.
Do lado dos consumidores, é importante criar incentivos à adoção, investir em educação e sensibilizar para a relevância das soluções verdes na construção de um futuro mais justo e equilibrado. Às empresas, devemos proporcionar apoio efetivo ao desenvolvimento de soluções que, à semelhança da bioenergia, possam posicionar Portugal como uma referência europeia nesta área. Isolar responsabilidades não é o caminho. Precisamos do envolvimento de todos para, coletivamente, conseguirmos alinhar os nossos esforços com as metas traçadas pelo PNEC.
Sem esta aposta, corremos o risco de desperdiçar tempo e recursos estratégicos que poderiam, não só acelerar a transição energética, como também reforçar a nossa autonomia e capacidade de produção nacional. É essencial olharmos com sentido crítico para as metas já estabelecidas e, com visão e otimismo, refletirmos sobre o futuro que queremos construir e o contributo que cada um de nós pode dar. Cada decisão, investimento e esforço de inovação são fundamentais para reescrever o nosso futuro energético e demonstrar que, através de uma ação coordenada, a ambição pode traduzir-se em resultados concretos.









































